Bloomberg Línea — A popularização da fritadeira de ar (air fryer, em inglês) entre as famílias brasileiras impulsionou, nos últimos anos, a demanda por alimentos pré-fritos congelados, como batata. Quem sempre reinou globalmente nesse segmento foi a canadense McCain, considerada a maior fabricante mundial de batata pré-frita congelada. De Minas Gerais, surgiu sua maior concorrente: a Bem Brasil, que consolidou sua liderança nacional dominando o mercado paulista, o maior do país, e planeja reforçar as exportações na América Latina.
As duas empresas apostam na continuidade da tendência de aumento no consumo médio de batata pré-frita por brasileiro, que saltou de 0,5 quilo por ano em 2006 para 3,5 quilos por ano em 2022, segundo a Bem Brasil. No ano passado, a McCain abriu sua primeira fábrica no país, localizada em Araxá (MG), um investimento de US$ 150 milhões, com o objetivo de ampliar a capacidade de produção de batatas pré-fritas congeladas e a distribuição no varejo e no food service.
Já a concorrente da multinacional, fornecedora das redes Bob’s, Madero, Montana e Giraffas, mantém duas unidades, uma também em Araxá e outra em Perdizes, cidade mineira onde a Bem Brasil inaugurou sua quarta linha de produção em 2021, após investimento superior a R$ 1 bilhão, incluindo câmaras de armazenagem refrigeradas. As duas fábricas operam o ano inteiro, mesmo após o fim da safra, pois os silos refrigerados possuem capacidade de armazenamento de 400 toneladas de batata in natura, o que conserva a matéria-prima e garante a produção.
“Já temos 47% do market share no Brasil. Lideramos o mercado nacional em vendas e market share. A batata ainda tem um longo caminho a percorrer. Nos EUA, o consumo per capita é de 12 quilos por ano. Na Europa, chega a 20 quilos”, diz o CEO da Bem Brasil, Dênio Oliveira, em entrevista à Bloomberg Línea.
Fundada em 2006, a empresa, de capital fechado, foi fundada pela família Rocheto, que desde 1940 faz o cultivo das batatas em Perdizes. Para os próximos quatro anos, o executivo projeta um aumento de vendas de 92% no período, o que pode representar um salto no faturamento de 126%.
“Dobramos a empresa em quatro anos. Hoje temos capacidade para processar 500 mil toneladas de batatas pré-fritas por ano. Estamos expandindo para a América do Sul. Já exportamos para a Bolívia, Peru, Paraguai e Uruguai”, afirma o CEO, acrescentando que os embarques começaram em 2020 após estruturar a área de comércio exterior e que está mirando outros países.
Concorrência
Ele reconhece que a pandemia da covid-19 contribuiu para uma mudança de hábito nas famílias devido à maior permanência das pessoas em suas residências. “A air fryer trouxe essa praticidade e ajudou a nacionalizar a batata pré-frita como mostram os dados de consumo per capita”, diz.
A concorrente McCain também aposta no crescimento do consumo. Mesmo com a abertura de sua primeira fábrica no Brasil, a empresa continuará abastecendo o mercado brasileiro a partir de outras plantas da empresa na Europa e na Argentina.
“O Brasil é um dos principais mercados para a McCain. Com a nova fábrica, vamos conseguir potencializar a produção e a distribuição de nossos produtos, com mais eficiência no abastecimento, além de melhorar nosso nível de serviço no mercado local”, disse Aluízio Periquito Neto, diretor-geral da McCain no Brasil, em nota. A multinacional não quis conceder entrevista sobre a disputa com a Bem Brasil.
A produção da Bem Brasil vem das fazendas dos dois acionistas, que respondem por 70% do consumo da empresa, enquanto produtores rurais da região fornecem o restante. Oliveira afirma que, em 2022, a empresa conseguiu crescer 30% em volume e 50% em faturamento, com uma margem Ebitda em torno de 24%. A previsão dele é buscar um crescimento de volume de 20% neste ano.
Além da batata, a Bem Brasil aposta na diversificação do seu portfólio. No mês passado, começou a produzir anéis de cebola pré-frita, embora em volumes ainda bem pequenos (cerca de 100 toneladas por mês). Também pretende colocar no mercado hash browns (bolinhos crocantes de batata, típicos do café da manhã nos EUA) e dadinhos de batata com queijo.
Exportações
A proximidade da fábrica com as áreas de cultivo (a cerca de 200 quilômetros da unidade fabril) ajuda a reduzir os custos, segundo o CEO da Brasil. As condições climáticas são monitoradas. A colheita do tubérculo começa em junho e vai até novembro, período menos chuvoso. Os silos refrigerados da empresa têm capacidade de armazenar 400 mil toneladas de batata in natura, que vão para o processamento industrial no semestre seguinte.
Atualmente, as exportações representam 3% do faturamento da Bem Brasil, mas o executivo diz que a ambição é chegar aos 10% até 2025. Ele tem viajado para os EUA, a fim de negociar o aumento das exportações. No segundo semestre deste ano, a empresa deve iniciar as vendas para o México, segundo Oliveira. Na Ásia, Taiwan já consome as batatas pré-fritas mineiras.
Com o aumento da produção nacional, a tendência é a redução das importações do tubérculo. “Bélgica e Holanda são os países europeus que mais exportam batatas para o Brasil”, cita o CEO da Bem Brasil.
O executivo levantou recursos para financiar a expansão da capacidade fabril, de armazenagem e a implantação de ETE (Estação de Tratamento de Efluentes) com a emissão de CRAs (Certificados de Recebíveis do Agronegócio) no valor de R$ 260 milhões, além de tomar empréstimo de R$ 200 milhões com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
“Nossa alavancagem está em cerca de 2 vezes dívida/Ebitda. Não é pequena, mas é bem tranquila. Com a previsão de aumentar a geração de caixa neste ano, esse nível de alavancagem deve voltar para 1,5 vezes”, diz o executivo, acrescentando que, em suas captações, a empresa trabalha com instituições financeiras como Itaú Unibanco, Bradesco, BTG Pactual, XP, Citibank e outros bancos.
Na guerra da batata pré-fritada, os investimentos em marketing também cumprem seu papel. A Bem Brasil fechou patrocínio com a Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro) para marcar presença de sua marca nos desfiles da Marquês de Sapucaí, no carnaval do Rio de Janeiro, com direito a pontos de vendas e degustações.
“Pela Nielsen [empresa global de medição de market share], conquistamos a liderança na capital paulista, no ano passado. Queremos continuar esse trabalho de ampliar nossa participação em todo o Brasil”, disse o CEO.
Já a última grande ação da McCain foi na Copa do Mundo de Futebol, no final do ano passado, quando fechou parceria com a Forno de Minas, líder tradicional no mercado de pães de queijo, na distribuição de prêmios como air fyers, camisas da Seleção Brasileira, além de R$ 100 mil para os consumidores que comprassem os dois produtos congelados.
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