Investidores se voltam a apostas em títulos de emergentes mais arriscados

Rali se deve, em parte, à valorização em relação aos níveis mais baixos do ano passado, quando traders estavam muito pessimistas sobre expectativas de recuperação

Recuperação dos chamados títulos públicos “distressed”, ou de alto risco, contribui para que a dívida em dólar de mercados emergentes tenha seu melhor início desde 2019
Por Selcuk Gokoluk e Maria Elena Vizcaino
13 de Fevereiro, 2023 | 01:13 PM

Bloomberg — A aposta em títulos mais arriscada nos mercados emergentes está de volta, oferecendo retornos de dois dígitos aos corajosos o suficiente para flertar com possíveis defaults.

A recuperação dos chamados títulos públicos “distressed”, ou de alto risco, contribui para que a dívida em dólar de mercados emergentes tenha seu melhor início desde 2019. Todos - exceto um - os 10 títulos de economias em desenvolvimento com melhor desempenho estão em terreno distressed, como El Salvador, país do bitcoin, Zâmbia, que deixou de pagar a dívida na pandemia, e Argentina, com um longo histórico de resgates.

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O rali se deve, em parte, à valorização dos preços em relação aos níveis mais baixos do ano passado, quando traders estavam muito pessimistas sobre as expectativas de recuperação. Mas também é um reflexo de como investidores se voltaram para investimentos mais arriscados no início do ano, impulsionando ativos nos mercados financeiros.

Embora a nova percepção possa ser temporária, por enquanto é uma mudança bem-vinda para o pequeno universo de compradores de títulos problemáticos – um “trade” de alto risco e elevado retorno em títulos que rendem pelo menos 10 pontos percentuais acima dos Treasuries.

“Países ‘distressed’ estão entre aqueles na classe de ativos com maior potencial de valorização”, disse Carl Ross, sócio e analista de crédito soberano da Grantham, Mayo, Van Otterloo & Co, em Boston, que conta com títulos de alto risco da Tunísia entre suas principais apostas em mercados emergentes.

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Retornos

Os pagamentos podem ser atraentes: os títulos de El Salvador – com o melhor desempenho este ano – ofereciam retorno superior a 30% no início de 2023. Os títulos em dólar da Argentina, com vencimento em 2029, atualmente são negociados em torno de 29 centavos de dólar, mais de 60% acima do nível atingido em meados do ano passado.

Era um cenário drasticamente diferente há um ano, quando quase 20 países em desenvolvimento negociavam em território distressed em meio a temores de default generalizado e recessão global. Emaranhados em sanções, o Sri Lanka, a Rússia e a Bielorrússia declararam default no ano passado, enquanto a Ucrânia recebeu apoio para adiar os pagamentos.

Reavaliação do risco

Desde então, o quadro econômico global melhorou. O Fundo Monetário Internacional elevou sua previsão de crescimento e previu a desaceleração da inflação. Os contratos de CDS (credit-default swaps) mostram que o risco de inadimplência caiu para o nível mais baixo desde antes da invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro passado, o que sacudiu os mercados em todo o mundo.

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A mudança de visão criou uma janela para os que apostam em ativos distressed, que encontraram valor à medida que os preços de alguns títulos inadimplentes caíram abaixo do que investidores esperam receber em uma reestruturação da dívida.

Gestores de ativos investiram US$ 4 bilhões em fundos de índice que acompanham mercados emergentes este ano, uma grande parte dos US$ 8,7 bilhões que fluíram para essa classe de ativos, de acordo com o JPMorgan (JPM). Na semana passada, houve retiradas de mais de US$ 540 milhões, encerrando um período de 18 semanas de entradas, que atingiu US$ 25,3 bilhões.

Até agora, títulos em dólar de mercados emergentes registraram retorno de cerca de 1,8%, no melhor início de ano desde 2019. Isso se deve em grande parte à recuperação da dívida com classificação mais baixa, com alta de quase 12%, segundo dados compilados pela Bloomberg.

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Sinais de alerta

O cenário otimista de investidores de ativos distressed vai na contramão de algumas previsões para mercados emergentes. Estrategistas do Citigroup aconselharam investidores a reduzir a exposição até que haja clareza sobre o quanto o Federal Reserve aumentará as taxas de juros, dizendo que o consenso sobre o dólar mais fraco pode estar errado.

Analistas do JPMorgan acreditam que a dívida soberana está “provavelmente sobrecomprada e cara”. E o Man Group, o maior hedge fund de capital aberto do mundo, aposta em perdas.

Na semana passada, o Equador demonstrou a rapidez com que trades arriscados podem dar errado. Seus títulos despencaram depois que mudanças constitucionais propostas pelo presidente Guillermo Lasso foram inesperadamente rejeitadas pelos eleitores. Até então, o país estava entre as nações com melhor desempenho entre mercados emergentes. Agora, é o pior.

Mas investidores que mantiveram a estratégia esperam continuidade do rali deste início de ano, o que os ajuda a superar os retornos do mercado.

-- Com a colaboração de Scott Squires, Daniel Hogan, Irene Garcia Perez e Luca Casiraghi

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