Light avalia renovação com Aneel ante risco crescente de recuperação judicial

Empresa de energia que opera no Rio de Janeiro tenta renegociar dívida de R$ 8,7 bilhões com a proximidade do vencimento da concessão

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Bloomberg Línea — A posição da Light (LIGT3) para negociar sua dívida de R$ 8,7 bilhões está cada vez mais difícil, o que pode levá-la a uma recuperação judicial em breve. Ao mesmo tempo, a companhia de energia se prepara para negociar com a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) a renovação do contrato de distribuição no Rio de Janeiro, segundo executivos ligados à empresa ouvidos pela Bloomberg Línea.

De acordo com um executivo, que falou sob condição de anonimato porque as discussões são privadas, a Light tem a intenção de renovar a concessão em municípios do Rio de Janeiro, sua maior fonte de receita, e deve começar a negociar com a Aneel. A conclusão dessas negociações só deve acontecer próximo ao fim do contrato, em 2026.

Uma outra fonte ligada à companhia confirma a tentativa de negociação com a agência reguladora antes de um eventual pedido de recuperação judicial. A renovação antecipada da concessão criaria em tese melhores condições para a empresa renegociar a dívida com credores.

Paralelamente, entretanto, a Light já teria documentação preparada para um pedido em caso de necessidade de proteção contra credores, segundo um executivo de banco ligado à empresa.

As ações da Light caíram 14,19% nesta terça-feira (7), diante do risco de a empresa entrar em recuperação judicial.

Procurada, a Light afirmou que, conforme definido no atual contrato, a companhia tem até o início de junho para solicitar a renovação da concessão.

“Como é de praxe em momento de renovação das concessões, a Light, como as demais concessões vincendas, está em discussão com o Ministério de Minas e Energia e a Aneel a respeito das diretrizes que nortearão os futuros contratos”, disse em nota à Bloomberg Línea.

As incertezas acerca do futuro da Light cresceram após a companhia ter anunciado na semana passada a contratação de uma consultoria de estruturação financeira, a Laplace, especializada em intermediar negociações de dívidas de empresas em dificuldades com os bancos. A consultoria tem experiência no setor de energia, tendo como um de seus cases a modelagem do processo de privatização da Eletrobras.

No mercado financeiro, cresce a avaliação de que a Light estaria em vias de anunciar um pedido de recuperação judicial. No entanto, de acordo com a lei 12.767, “não se aplicam às concessionárias de serviços públicos de energia elétrica os regimes de recuperação judicial e extrajudicial, salvo posteriormente à extinção da concessão”.

Nesse caso, apontam especialistas, o “remédio” para a Light seria uma espécie de intervenção da Aneel para garantir a continuidade dos serviços.

A Light acrescentou em nota à Bloomberg Línea que a contratação da Laplace para assessorá-la na avaliação de estratégias financeiras visa a melhoria de sua estrutura de capital e de alternativas para tanto. “Portanto, não procede a informação de que a companhia estaria na iminência de pedir recuperação judicial.”

Reestruturação

A Light contratou a Laplace, que cuidou da reestruturação financeira da Oi, “com o objetivo de assessorar a companhia na análise de estratégias financeiras, visando, principalmente, apresentar melhorias em sua estrutura de capital”, disse a empresa. A confirmação foi feita após notícia publicada pela coluna de Lauro Jardim, do jornal O Globo.

Em caso de desistência da renovação da concessão, o governo teria que pagar uma indenização à Light pelos investimentos realizados e não amortizados, calculada em cerca de R$ 10 bilhões.

O analista de research da Ativa Investimentos, Ilan Arbetman, explicou que o montante principal da dívida da Light precisa ser pago em cerca de três anos, coincidindo com o fim da concessão de distribuição da companhia no Rio de Janeiro. Ao final do terceiro trimestre de 2022, a dívida líquida consolidada da empresa somava R$ 8,7 bilhões.

“Sem dúvida, a Laplace foi contratada para renegociar dívidas com credores. Mas o ambiente, hoje, é desfavorável para negociações com bancos, que ainda estão impactados pelo caso da Americanas”, disse Arbertman.

Outro desafio de Sicupira

Para agravar a situação, Carlos Alberto Sicupira, um dos três principais sócios da Americanas, possui 10% das ações da Light. O bilionário é acionista de referência da Americanas.

“O fato de o Beto Sicupira ter 10% da Light não é o centro da questão aqui, mas o caso Americanas é muito recente. Isso faz com que os credores fiquem menos pacientes, podendo levar a companhia a ter mais dificuldades para renegociar seus passivos”, disse Arbetman.

Ainda na semana passada, a agência de classificação de risco Fitch Ratings rebaixou a nota de crédito da Light e suas subsidiárias de “BB-” para “CCC+”. Também rebaixou os ratings em escala nacional de “AA-(bra)” para “CCC(bra)”.

Segundo comunicado da Fitch, o rebaixamento “reflete um risco de crédito substancial” para a Light, após o anúncio de contratação da Laplace em um mercado de crédito mais restritivo devido ao caso da Americanas.

“A Fitch acredita que a contratação da Laplace reduz significativamente a disposição dos credores de fornecer novos financiamentos ao grupo para cobrir suas necessidades de financiamento de 2023 e 2024″, afirmou no comunicado.

Queda-de-braço

Na visão do presidente da consultoria Thymos Energia, João Carlos Mello, a concessão de distribuição da Light enfrenta uma situação particular, que precisa ser tratada de maneira especial pelo poder público e pela Aneel.

“A renovação do contrato da Light precisa ser diferenciada, diante de inúmeras particularidades dessa concessão, principalmente em relação a ligações clandestinas – o chamado ‘gato’ – e problemas de segurança pública”, apontou.

Ao final do terceiro trimestre, as perdas totais da Light somaram 25% em 12 meses. “As perdas são um grande problema para algumas distribuidoras, é preciso uma certa leniência do poder público para uma eventual renovação dos contratos”, disse Mello.

Para uma fonte ligada às elétricas, o mercado está preocupado. Segundo essa pessoa, os bancos estão reticentes pois terão de enfrentar a negociação da Americanas com os credores à frente, e a avaliação é a de que este não é o melhor momento para negociar. Ao mesmo tempo, é um tema que não há como escapar, pois esse problema precisa ser resolvido.

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