‘Mau humor’ de investidor local com bolsa é exagerado, diz Guide

Time de analistas liderado por Fernando Siqueira diz que lucros estão resistindo à desaceleração, mas alerta que volta do Congresso pode mudar apetite estrangeiro

No acumulado de 2023 até o último dia 27, o fluxo de recursos estrangeiros na B3 supera os R$ 11 bilhões
01 de Fevereiro, 2023 | 07:48 AM

Bloomberg Línea — Diante de projeções de lucro em baixa no exterior e um cenário doméstico atrativo, com baixo valuation das ações na bolsa, menor risco de recessão e alguma expectativa de queda dos juros até o fim do ano, o Brasil tem atraído o olhar - e muito capital - do investidor estrangeiro.

Mas, enquanto o estrangeiro tem inundado a bolsa brasileira de recursos, o investidor local tem usado o momento atual para liquidar suas posições, de ações a fundos multimercados e até de renda fixa.

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Nessa “queda de braço”, o estrangeiro por ora tem prevalecido, o que explica o dólar se aproximando do patamar de R$ 5,00 e o Ibovespa aos 113 mil pontos, com alta de 10% desde meados de dezembro.

Em relatório que analisa os dados de entrada de investidores na B3 e divulgado na terça-feira (31), a Guide Investimentos destaca que o elevado fluxo de estrangeiros para o Brasil impressiona, ainda que a onda de resgates de fundos brasileiros também seja relevante.

“Acreditamos que o mau humor do investidor local com o Brasil é exagerado”, avaliam os analistas liderados por Fernando Siqueira.

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Em 2022, os estrangeiros adicionaram à B3 R$ 119,8 bilhões, o maior valor desde o início da coleta dos dados em 2008. No acumulado de 2023 até o último dia 27, o fluxo de recursos estrangeiros na B3 é positivo em R$ 10,899 bilhões.

Já a indústria brasileira de fundos de investimento sofreu resgates de R$ 162,9 bilhões no ano passadoa maior desde o início da série histórica, iniciada em 2002. Em 2021, a captação havia sido positiva em R$ 412,5 bilhões.

Depois dos multimercados, que tiveram saídas líquidas (aportes menos resgates) de R$ 87,6 bilhões, os fundos de ações tiveram o segundo pior desempenho, com resgates totalizando R$ 70,5 bilhões. Os fundos de renda fixa, por sua vez, sofreram resgates de quase R$ 50 bilhões em 2022.

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Além da retirada de recursos na indústria de fundos, a alocação dos fundos multimercado parece baixa, segundo o time da Guide, em especial nas classes de ações, renda fixa e moedas.

“Isso pode ser visto pela volatilidade dos multimercados, por exemplo, que está baixa em comparação com a de ativos locais (sinal de alocação baixa) e também pela performance destes fundos: apesar da alta do Ibovespa, do S&P 500 e da apreciação do real, a maioria dos fundos multimercados está abaixo do CDI em 2023.”

Commodities puxam desempenho

Além de um cenário macro atrativo no Brasil, outro ponto que chama a atenção do estrangeiro, segundo o time de análise, é que os lucros das empresas por ora estão resistindo à desaceleração da economia e, em alguns casos, estão crescendo, favorecidos pela alta das cotações das commodities.

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Isso evitaria até aqui, na análise da Guide, que o quadro atual se enquadrasse no que é conhecido como value trap (armadilha do valuation): empresas cujos múltiplos as fazem parecer baratas, mas que não estão, dado que os lucros não devem corresponder a essa expectativa de crescimento.

“O lucro das empresas tem resistido bem à desaceleração econômica. Além disso, com a recente valorização do preço das commodities, é provável que as projeções de lucro continuem em alta nos próximos meses”, escreve a Guide.

Os analistas da corretora destacam, contudo, que a perda com operações de crédito da Americanas (AMER3) é um risco para a materialização deste cenário positivo.

Congresso e volatilidade

Um dos principais pontos a serem monitorados daqui para a frente, segundo a Guide, é o retorno das atividades do Congresso a partir desta quarta (1º), algo que deve trazer mais volatilidade.

“Até agora, os investidores locais parecem ter sido mais abalados pelos discursos do presidente e de seus ministros, enquanto investidores estrangeiros parecem acreditar que o atual governo será parecido com o primeiro mandato do presidente Lula, independentemente de seus discursos”, aponta o time de análise da casa no relatório.

Com a posse do Congresso, contudo, as medidas serão efetivamente apresentadas e posteriormente votadas, o pode fazer preço no mercado.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.