Empresa da família Maluf, Eucatex paga US$ 7,2 milhões para encerrar processos

Acordo foi firmado com o Ministério Público de SP e prevê ainda que o BTG Pactual, sem relação com a investigação, vai pagar US$ 53 milhões para assumir 33% da empresa

O ex-deputado federal e ex-prefeito de São Paulo Paulo Maluf: acordo com MP-SP e Prefeitura de São Paulo encerra investigações envolvendo a Eucatex, empresa de sua família (Rovena Rosa/Agência Brasil)
24 de Janeiro, 2023 | 09:09 PM

Bloomberg Lìnea — A Eucatex (EUCA3, EUCA4), empresa de materiais de construção da família Maluf, anunciou nesta terça-feira (24) a assinatura de acordo com o Ministério Público de São Paulo e com a prefeitura da capital paulista para encerrar ações em que a empresa era acusada de envolvimento no esquema de corrupção pelo qual o ex-deputado Paulo Maluf (PP-SP) foi condenado em 2017.

O acordo prevê o pagamento de US$ 67 milhões (cerca de R$ 344 milhões ao câmbio de hoje) para encerrar as ações e excluir a empresa de todos os processos ligados ao episódio. O MP-SP também se compromete a não adotar novas medidas judiciais referentes a esse caso.

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A Eucatex pagará US$ 7,2 milhões à Prefeitura de São Paulo, enquanto o BTG Pactual (BPAC11) comprará 33% das ações da companhia por US$ 53 milhões - o dinheiro será depois revertido à Prefeitura. Segundo comunicado divulgado pelo MP-SP à imprensa nesta terça, o banco “é apenas adquirente e não tem nenhuma relação com os fatos investigados” (mais informações abaixo).

Outros cerca de US$ 7 milhões já estão depositados em contas judiciais em meio aos processos e também serão revertidos à Prefeitura da capital paulista.

Do total a ser pago, US$ 44 milhões serão destinados à Prefeitura de São Paulo, e US$ 23 milhões serão destinados às custas da Justiça de Jersey e das Ilhas Virgens Britânicas, no Reino Unido, que eram detentoras de ações da Eucatex por causa dos processos.

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O acordo não significa confissão de culpa nem de envolvimento no caso pela Eucatex. “A opção técnica pela autocomposição, além de afastar qualquer hipótese de culpa, demonstra a disposição colaborativa da empresa e resolve a controvérsia jurídica de maneira mais rápida e previsível”, disse o advogado Eduardo Diamantino, que representou a Eucatex nas negociações.

Em comunicado ao mercado, a Eucatex informou que o BTG Pactual ficará com 33% das ações preferenciais da empresa e uma ação ordinária.

O banco também terá o direito de indicar um membro para o conselho de administração da empresa e terá que dar aval a “determinadas matérias relativas à proteção patrimonial da investidora [o BTG]”.

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Entenda o caso

Nas ações, ajuizadas em 2009, o MP-SP cobrava da Eucatex, de Maluf e de seus filhos a devolução do dinheiro desviado.

Na época do ajuizamento da ação, a cobrança era de US$ 165 milhões. No comunicado enviado nesta terça, o MP de São Paulo disse que foram desviados “mais de US$ 300 milhões de verbas municipais”.

Maluf foi condenado por lavagem de dinheiro em 2017 pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Segundo STF, o ex-deputado e ex-prefeito de São Paulo enviou parte do dinheiro que recebeu por meio de um esquema de corrupção para fora do Brasil, por meio de empresas constituídas em nome de outros beneficiários nas Ilhas Virgens.

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De acordo com a condenação, Maluf movimentou o equivalente a US$ 172 milhões entre 1993 e 2006 em contas no exterior. Maluf foi prefeito da capital entre 1993 e 1996. O envolvimento da Eucatex no caso nunca havia sido atestado pela Justiça em quase 15 anos de tramitação das ações.

Lavagem de dinheiro

O MP-SP dizia que a Eucatex foi usada como veículo de lavagem de dinheiro. Ações da empresa foram vendidas a fundos de investimento constituídos na ilha de Jersey, uma das Ilhas Virgens Britânicas.

Segundo o MP de São Paulo, essas empresas foram criadas apenas para receber o dinheiro que Maluf desviou da prefeitura da capital paulista entre 1993 e 1998 por meio do superfaturamento das obras da construção da Avenida Água Espraiada (hoje Avenida Jornalista Roberto Marinho) e do Túnel Ayrton Senna.

“Portanto, o dinheiro desviado do município de São Paulo foi usado para investimento na Eucatex, que é controlada pela família Maluf”, resumem os promotores do caso, no comunicado nesta terça.

Falência no exterior e compra de ações

Em fevereiro de 2020, o MP-SP anunciou ter chegado a um acordo com a Justiça do Reino Unido para receber de volta o equivalente a US$ 8,4 milhões, referentes ao “montante [que] havia sido desviado por Paulo Maluf”. Na ocasião, o MP de São Paulo disse ter conseguido “recuperar” o equivalente a US$ 120 milhões, por meio de acordos.

Mas as empresas das Ilhas Virgens declararam não ter caixa nem patrimônio para enviar ao Brasil e decretaram falência. O dinheiro ficou parado desde então, em meio aos processos de falência. E esse será o papel do BTG.

No comunicado ao mercado desta terça, a Eucatex informou que o BTG Pactual assinou um acordo com a empresa e com o MP-SP para destravar o negócio na qualidade de investidor.

Os US$ 53 milhões do banco foram usados para comprar cerca de 13% do capital em ações ordinárias da Eucatex e cerca 38% do capital em ações preferenciais. No acordo, os controladores - os filhos de Paulo Maluf - tiveram a opção de recompra, que foi exercida e então adquiriram 13% do capital em ações ordinárias (menos uma) e 5% do capital em ações preferenciais.

Isso significa que o BTG ficou com 33% do capital da Eucatex em ações preferenciais, mais uma ordinária.

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Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.