Americanas diz que pode pedir recuperação judicial ‘nas próximas horas’

Com dívida de R$ 40 bilhões e R$ 800 milhões em caixa, empresa varejista informa ao mercado que está trabalhando para buscar proteção contra credores

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Bloomberg Línea — A Americanas (AMER3) está mais perto de pedir recuperação judicial devido a uma dívida de R$ 40 bilhões. A empresa varejista informou em comunicado ao mercado na manhã desta quinta-feira (19) que está trabalhando para que o pedido possa ser oficializado à Justiça nos próximos dias ou nas “nas próximas horas”, em caráter de urgência para se proteger de credores.

Em resposta a pedido de esclarecimentos feito pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários) e à B3, a empresa varejista disse que a posição de caixa disponível para suas atividades alcançou o valor de R$ 800 milhões, muito abaixo dos R$ 8 bilhões citados há uma semana, acrescentando que “parcela significativa desse valor estava injustificadamente indisponível para movimentação pela companhia ontem”.

O grupo, que informou ao mercado há uma semana ter descoberto um rombo da ordem de R$ 20 bilhões em sua contabilidade, trava uma batalha legal contra bancos credores como BTG Pactual, Bradesco e Goldman Sachs, entre outros, que buscam autorização judicial para tomar medidas para cobrir parte de suas perdas. As ações da Americanas acumulam caíram perto de 90% em uma semana.

Com 1.800 lojas espalhadas pelo país, a companhia mergulhou em crise após o anúncio, que veio acompanhado da renúncia do então novo CEO Sergio Rial.

A companhia não classificava como dívida bancária operações de financiamento que estavam na conta de fornecedores nos balanços dos últimos exercícios, incluindo 2022.

Veja como desenrola o caso Americanas:

Dia 11/01 - Fato relevante

Às 18h32 da última quarta-feira (11), a companhia postou no RAD (Recebimento Automatizado de Documentos), o sistema da CVM (Comissão de Valores Mobiliários) um fato relevante comunicando as renúncias do CEO, Sergio Rial, após 9 dias de sua posse, e de André Covre, diretor de relações com investidores, bem como a informação de descoberta de “inconsistências contábeis” da ordem de R$ 20 bilhões (posição no fim do 3º trimestre de 2022) nos balanços anteriores.

O problema é encontrado, segundo Rial, no período da gestão de Miguel Gutierrez, que acumulou quase 30 anos na companhia, que tem como acionista de referência a 3G Capital, dos bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Herrmann Telles e Carlos Alberto Sicupira, nomes que marcaram mercados de bebidas (Ambev, ABEV3) e alimentos (controladores da operação do Burger King no Brasil, ZAMP3).

Dia 12/01 - Teleconferência do BTG Pactual

No dia seguinte, relatórios de bancos e corretoras projetavam o derretimento do papel no pregão, considerando o tamanho do “rombo” de R$ 20 bilhões, quase o dobro do valor de mercado da varejista (R$ 10,8 bilhões) um dia antes do fato relevante. O papel desabou mais de 77,33%.

Às 9h, antes do início do pregão, o ex-CEO conversou com investidores em uma teleconferência promovida pelo BTG Pactual, explicando que encontrou durante nove dias como CEO as “falhas contábeis” na conta Fornecedores: operações de financiamento à cadeia de fornecedores não eram classificadas como dívida bancária, com custo financeiro.

A companhia publicou o vídeo da conversa de Rial com os investidores, em que ele explica a razão de sua renúncia: “O tamanho do que tem que ser feito não era necessariamente aquilo que eu queria em um primeiro momento, de ir para a Americanas e enveredar em um projeto muito forte de crescimento”

Dia 13/1 - Reação dos bancos credores e BBB

Bancos credores da Americanas pretendem perdoar a Americanas pelas “inconsistências contábeis” e não planejam acelerar o vencimento de sua dívida por desrespeito a cláusulas restritivas (covenants, gatilho acionado após a devedora estourar limite de endividamento), conforme antecipou reportagem da Bloomberg News.

As ações da Americanas subiram mais de 30%, enquanto operadores ouvidos pela reportagem disseram que o mercado especula sobre os ativos que podem ser vendidos, uma possibilidade citada por Rial na teleconferência do BTG Pactual, e sobre a investigação dos auditores da PwC.

Já a Fitch Rating rebaixou a nota da Americanas, depois de ter colocado o rating em perspectiva negativa em novembro do ano passado, enquanto a CVM (Comissão de Valores Mobiliários) abriu três processos para apurar o caso, que tem suspeitas de insider trading, maquiagem de balanço e manipulação do mercado.

A companhia também confirmou o cancelamento de um patrocínio milionário à nova edição do BBB (Big Brother Brasil), que começa na próxima segunda-feira (16) na TV Globo. A varejista apostava na maior audiência da televisão brasileira na temporada de férias e verão para aumentar suas vendas.

Americanas vai à Justiça, declara dívidas de R$ 40 bi e se protege de execuções. A Justiça do Rio atendeu a pedido da empresa para suspender a execução de dívidas e dá 30 dias para a companhia decidir se entra com pedido de recuperação judicial

Dia 14/1 - Recuperação judicial

Bloomberg Línea publica que Americanas diz que, sem acordo com credores, vai pedir recuperação judicial. Empresa diz que já começou a receber notificações de vencimento antecipado da dívida. Lemann e sócios propõem injeção de R$ 6 bi na Americanas, segundo fontes

Dia 15/1 - “Maior fraude do mercado”

Bloomberg Línea divulga que o BTG tenta anular na Justiça proteção da Americanas e acusa empresa de má-fé. Banco entra com agravo de instrumento, chama caso de ‘maior fraude do mercado acionário brasileiro’ e diz que empresa tentou resgatar R$ 800 milhões antes de fato relevante

Dia 16/1 - Bancos afetados

BTG, Santander, Bradesco e Itaú são os bancos mais expostos à Americanas, segundo o Citi. A Americanas contrata Rothschild para negociar com credores. A ação da varejista desaba 38% na bolsa em meio à disputa na Justiça com o BTG

Dia 17/1 - Rial fala

Executivo que renunciou a CEO da Americanas depois de nove dias no cargo publica post no LinkedIn em que diz que especulações sobre o caso são leviandades. CEO da B3 diz que papel da Americanas corre risco de exclusão de índices do mercado e que Bolsa colabora com a CVM na apuração do caos.

Dia 18/1 - Batalha jurídica

Bradesco e Goldman Sachs entram na Justiça contra decisão que suspende cobranças da Americanas, após BTG conseguir derrubar proteção da companhia que impedia tomada de R$ 1,2 bilhão.

Dia 19/1 - Pedido de Recuperação judicial

Americanas diz pode pedir recuperação judicial nas próximas horas, admitindo ter só R$ 800 milhões em caixa diante de uma dívida de R$ 40 bilhões

(Atualiza às 9h40 com cronologia do caso)