Americanas pede recuperação judicial com dívida de R$ 43 bilhões

Grupo varejista, que reportou ter 16.300 credores, comunicou ao mercado rombo de R$ 20 bilhões há uma semana; empresa diz ter R$ 800 milhões em caixa

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Bloomberg Línea — O grupo Americanas (AME3) ajuizou, nesta quinta-feira (19), o pedido de recuperação judicial na 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, sede de sua administração.

Com um total de 16.300 credores, a companhia admite agora ter uma dívida de R$ 43 bilhões (antes declarava R$ 40 bilhões) e R$ 800 milhões em caixa, enquanto bancos credores cobram a execução dos débitos, pedindo na Justiça até a venda de ativos.

Os advogados da companhia solicitaram prazo de 48 horas para apresentação da lista de credores completa, a discriminação do passivo e eventuais documentos faltantes, para que “reflita da forma mais fidedigna possível a realidade do endividamento do grupo”, escreveram.

A busca de proteção judicial ocorre oito dias após o anúncio de renúncia do CEO da varejista, Sergio Rial, que apontou “inconsistências contábeis” de R$ 20 bilhões nas contas da empresa. No fim da manhã, as ações da empresa desabavam mais de 20% no pregão da B3, cotadas a R$ 1,37 (-21,26%).

Fundado em 1929, o grupo é um dos mais tradicionais do varejo com cerca de 1.800 lojas espalhadas pelo país e marketplace, conhecido nas últimas décadas por atuar desde o comércio de utensílios domésticos, papelaria, bombonière a vestuário, eletroeletrônicos, informática, alimentos e bebidas.

Os problemas colocam em evidência o trio de investidores de referência das Americanas, os bilionários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, que aparecem na lista dos homens mais ricos do Brasil. Eles comandam a empresa de aquisições 3G Capital e são conhecidos por terem investido em gigantes do setor de bebidas e alimentos como AB InBev, Kraft-Heinz e Burger King.

A CVM (Comissão de Valores Mobiliários) já abriu cinco processos para investigar suspeitas de uso de informação privilegiada (insider trading), maquiagem de balanços e manipulação do mercado. Credores apontam indícios de fraude contábil. Fornecedores temem levar calote e monitoram o caso.

Já a B3 avalia retirar o papel da Americanas da composição de 14 índices de referência do mercado de renda variável, incluindo o ISE (Índice de Sustentabilidade Empresarial), que calcula os compromissos das companhias com a agenda ESG (Ambiental, Social e Governança).

O pedido de RJ não chega a ser uma surpresa para o mercado. Desde que a crise estourou na semana passada e derrubou a ação da companhia, que acumula desvalorização de 95% em 12 meses, analistas já trabalhavam com essa expectativa, principalmente diante do impasse sobre o tamanho da injeção de capital que os principais acionistas indicavam para os bancos credores, considerado insuficiente.

O primeiro banco a acusar publicamente a gestão da Americanas de má-fé e de ter cometido a “maior fraude do mercado acionário brasileiro” foi o BTG Pactual (BPAC11), conforme revelou Bloomberg Línea em reportagem publicada no último dia 15. Bradesco, Itaú Unibanco, BofA (Bank of America) e Goldman Sachs acionaram a justiça devido às dívidas com a Americanas.

‘Medidas precipitadas’

O pedido da RJ foi protocolado às 13h32 desta quinta-feira na 4ª Vara Empresarial da Comarca da capital fluminense. Os escritórios Basilio Advogados e Salomão Kaiuca Abrahão Raposo Cotta apresentam as razões do pedido. O valor da causa é de R$ 500 mil.

“Alguns poucos credores, sem pensar nos impactos para a coletividade, tomaram medidas precipitadas que culminaram no perigoso esvaziamento de caixa da companhia e, consequentemente, inviabilizaram a sua operação a curto prazo e uma solução negocial coletiva sem o remédio recuperacional”, citam os advogados.

A empresa reconhece que enfrenta “uma gravíssima crise de liquidez” e reclama dos bancos.

“Todo o caixa da emrpesa vem sendo dragado por instituições financeiras detentoras de créditos contra o Grupo Americanas”, afirmam os advogados, acrescentando que a “sangria poderá ser estancada” com a concessão do benefício da recuperação judicial.

Os advogados reforçam o pedido da RJ para que possa ser apresentado um plano de recuperação “factível e favorável para todos, permitindo, até mesmo, que a companhia obtenha um DIP Financing no curso do processo”, em referência a uma modalidade de financiamento para empresas em recuperação judicial.

A defesa da companhia cita que a varejista gera mais de 100 mil empregos diretos e indiretos e tem arrecadação de impostos de mais de R$ 2 bilhões em tributos por ano.

“Eventual quebra do Grupo Americanas resultaria no colapso da já tradicional e consolidada cadeia de produção no Brasil, gerando graves prejuízos para relevantes setores da economia brasileira e para os mais de 50 milhões de consumidores que se valem dos serviços prestados pelo grupo”, escrevem os advogados.

Em nota à imprensa, a Americanas disse que o grupo de acionistas de referência disse ao conselho de administração que “pretende manter a liquidez da companhia em patamares que permitam o bom funcionamento da operação”.

(Atualiza às 14h15 com trechos do pedido e nota da companhia)

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