Nova CFO da Americanas pagou R$ 1,38 milhão para encerrar processos na CVM

Camille Loyo Faria deixou de prestar informações ao mercado em duas ocasiões quando foi diretora financeira e relações de investidores da Oi e da TIM Brasil

Empresa segue tentando negociar um acordo de alongamento das dívidas com os principais credores
17 de Janeiro, 2023 | 08:17 PM

Leia esta notícia em

Inglês

Bloomberg Línea — A executiva Camille Loyo Faria, anunciada pela Americanas (AMER3) para a posição de diretora financeira (CFO) e de relações com investidores da empresa, já foi investigada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) por ter deixado de prestar informações ao mercado enquanto CFO da operadora TIM Brasil (TIMS3) e diretora de relações com investidores da Oi (OIBR3). Os processos foram encerrados em dezembro de 2022, depois de acordo em que a executiva concordou em pagar R$ 1,38 milhão à autarquia.

A Americanas anunciou nesta tarde de terça-feira (17) a contratação da executiva. Ela era CFO da operadora TIM Brasil e foi diretora de relações com investidores da Oi entre 2019 e 2021, durante o processo de recuperação judicial (RJ) da empresa de telecomunicações.

Segundo especialistas no mercado, a experiência da executiva em comandar a área financeira de uma grande empresa durante uma RJ poderá ser valiosa para a Americanas, que já sinalizou à Justiça que vai buscar esse caminho caso não consiga alcançar um acordo com os principais credores para a dívida declarada de cerca de R$ 40 bilhões.

A Bloomberg Línea procurou a Americanas e a TIM Brasil sobre o assunto: a primeira não respondeu até a publicação desta reportagem, e a segunda explicou que a executiva havia renunciado e que, portanto, não poderia comentar. Camille Faria assumirá o cargo na Americanas no próximo dia 1º de fevereiro, segundo comunicado da empresa varejista.

PUBLICIDADE

Para o advogado Lucas Akel Filgueiras, sócio do Akel Advogados e especialista em casos envolvendo o mercado de capitais, esse tipo de acordo com a CVM é considerado “normal”. “O que acontece é que o diretor de RI é o responsável perante a CVM pelas eventuais falhas na divulgação ao mercado, e a legislação sobre esse assunto é bem densa”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.

Segundo Filgueiras, o que chama atenção no caso é o valor pago pela executiva no acordo com a CVM. “Não é incomum que se responda a esse tipo de processo, mas, se o acordo envolveu mais de R$ 1 milhão, é por causa da natureza da informação - embora, de fato, os valores envolvidos nesses casos venham aumentando nos últimos anos.”

A Americanas já é alvo de procedimento preliminar do Ministério Público Federal, que apura se há indícios de práticas de insider trading (uso de informações privilegiadas para obter vantagens no mercado). Além disso, acionistas minoritários já se articulam para ir à Justiça e tentar garantir que serão ressarcidos dos prejuízos que tiveram com a queda dos preços dos ativos da companhia.

Já a CVM abriu pelo menos três processos administrativos para investigar a conduta de investidores da Americanas e possíveis infrações à legislação em vigor, como inside trading, movimentação atípica de negócios e irregularidades em balanços financeiros.

O que a CVM apontou

No caso da Oi, Camille Faria foi responsabilizada na esfera administrativa, na CVM, porque a empresa deixou de divulgar fato relevante informando que havia recebido uma proposta de R$ 16,5 bilhões da TIM, da Vivo e da Claro por suas operações móveis.

Segundo o relatório do acordo, as empresas autoras da oferta divulgaram o fato relevante no dia 27 de agosto de 2020, mas a Oi só divulgou o seu fato relevante no dia seguinte, às 12h16.

O processo na CVM foi aberto no mesmo dia. A Superintendência de Relações com Empresas da CVM (SEP) enviou um ofício à Oi questionando por que a empresa divulgou o fato relevante no dia seguinte às autoras da oferta, e durante o pregão.

PUBLICIDADE

A Oi disse no processo na CVM que demorou para divulgar o fato relevante porque só recebeu a confirmação da oferta de compra de seus ativos depois do fechamento do mercado em 27 de agosto.

A empresa disse que “não teria sido possível à Companhia finalizar as análises e determinações cabíveis a respeito do conteúdo do FR até a abertura do pregão do dia 28.07.2020, devido ao curto tempo decorrido entre o recebimento da proposta e esse momento.”

No caso da TIM Brasil, conforme o relatório do acordo, a diretoria de relações com investidores deixou de divulgar fato relevante sobre uma proposta de compra de 51% do capital da Telecom Italia - controladora da operadora brasileira no exterior - pela empresa americana de private equity KKR.

A oferta foi divulgada em comunicado à imprensa pela companhia italiana e repercutida por veículos brasileiros. Em 21 de novembro de 2021, o site Brazil Journal noticiou o caso.

No dia seguinte, as ações da TIM Brasil na B3 abriram o pregão em alta de 9,64%, segundo o relato da CVM, o que a imprensa especializada relacionou à oferta de compra.

A autarquia, então, pediu esclarecimentos à TIM, que, no dia seguinte, às 18h55, divulgou um comunicado ao mercado sobre a oferta de compra.

A justificativa da operadora foi que a oferta não tinha nenhuma relação com a TIM Brasil, mas a CVM rejeitou a explicação. No entendimento da área técnica da agência reguladora, a demora da companhia em informar o mercado foi “fonte de assimetria informacional e prejuízo a uma ampla faixa do investidor comum”.

Leia também

Gestora com maior exposição à Americanas, Moat zera posições em ações

Sergio Rial quebra o silêncio e diz que não ‘transigiria com biografia’

Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.