Bloomberg Línea — Menos de seis horas depois da publicação do fato relevante em que informou sobre a existência de inconsistências contábeis da ordem de R$ 20 bilhões, a Americanas (AMER3) começou a ser alvo de medidas extrajudiciais, “com o envio de notificações informando o vencimento antecipado de obrigações financeiras e consequente exercício de pretensões em juízo ou fora dele em face do patrimônio do grupo”.
Segundo a empresa, cerca de R$ 40 bilhões em dívidas estão passíveis de execução antecipada por cláusulas contratuais, valores que excedem o que havia sido sinalizado anteriormente.
As informações constam da ação encaminhada ao juiz da 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro na quinta-feira (12) pelo escritório Basilio Advogados, que representa a Americanas, e que estava em segredo de Justiça. A cópia da petição foi obtida pela Bloomberg Línea.
O juiz Paulo Assed Estefan concedeu uma liminar na sexta-feira (13) que protege a Americanas de qualquer medida de bloqueio, sequestro ou penhora de valores pelo prazo de 30 dias, período que terá para decidir se ingressa ou não com um pedido de recuperação judicial. Essa alternativa passou a ser colocada como a mais provável por especialistas diante das condições financeiras do grupo.
E a Americanas confirma que será esse o caminho escolhido caso não consiga entrar em acordo extrajudicial com os principais credores, segundo a petição à Justiça.
“O Grupo Americanas informa também que, uma vez efetivada a tutela cautelar requerida, e caso não consigam resolver o problema extrajudicialmente com seus principais credores, ingressarão com pedido de recuperação, no prazo de 30 dias, conforme disposto no CPC, art. 308”, diz na petição.
“Os necessários ajustes contábeis a serem oportunamente feitos pela Americanas para correção das inconsistências detectadas poderão implicar no descumprimento dos ‘covenants financeiros’ previstos em vários dos contratos celebrados com seus credores financeiros, inclusive estrangeiros, permitindo que declarem o vencimento antecipado e imediato de, aproximadamente, R$ 40 bilhões em dívida (ver, por exemplo, doc. 3)”, sustenta a Americanas na petição ao juiz, anexando documento como prova.
Essa versão difere da que foi apresentada pelo ex-CEO da empresa Sergio Rial na quinta-feira, quando disse a investidores e analistas que 92% da dívida não tinha previsão de covenants, como são chamados os gatilhos contratuais que permitem o vencimento antecipado da dívida em caso de descumprimento de certos indicadores, em geral níveis de alavancagem de uma companhia.
“Praticamente todos os contratos financeiros do Grupo Americanas contêm cláusulas de vencimento cruzado (“cross-default”), o que acarreta um gravíssimo risco de insolvência imediata do Grupo Americanas (ver, por exemplo, doc. 4)”, alega a empresa, novamente anexando documentação.
A empresa diz ainda que esses valores devidos em razão de crédito direto ou via emissão de debêntures podem ser apropriados por instituições financeiras sem necessidade de autorização da Justiça, “em razão de cláusulas contratuais que permitem a compensação de créditos dos bancos contra a Americanas com os recursos por ela mantidos nestas instituições”, diz a Americanas, que cita o Santander (SANB11) como um dos bancos que se encontram nessa situação, de acordo com a ação enviada ao juiz.
A Americanas, que tenta costurar uma injeção de capital de pelo menos R$ 6 bilhões dos acionistas de referência - Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira -, conforme antecipado pela Bloomberg News nesta sexta-feira, diz ainda que a concretização desse cenário de vencimento antecipado colocaria não só a solvência como a sobrevivência da empresa em risco.
“O vencimento antecipado de obrigações financeiras acarretará, portanto, um efeito cascata, o que poderá colocar as Requerentes em situação pré-falimentar, haja vista que a dívida acumulada apenas com as instituições financeiras e com os detentores de bonds aproxima-se dos R$ 40 bilhões.”
Na exposição de motivos, a Americanas diz que gera mais de 100 mil empregos diretos e indiretos, que paga cerca de R$ 2 bilhões em impostos anualmente e que tem condições de continuar a operar desde que protegida da execução antecipada dos R$ 40 bilhões em dívida.
Leia também
Americanas vai à Justiça, declara dívidas de R$ 40 bi e se protege de execuções
Moat Capital e as gestoras mais expostas à Americanas no Brasil