Governo, STF e Congresso agem para punir responsáveis por ataques aos 3 Poderes

Ministro Alexandre de Moraes, do STF, determina a destituição por 90 dias do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, enquanto apura sua responsabilidade

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Bloomberg — A capital do Brasil e os 3 Poderes começam a semana nesta segunda-feira (9) tomando medidas para reagir ao motim que reuniu milhares de apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro, que invadiram e atacaram as principais instituições da democracia do país, deixaram um rastro de destruição e testaram a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva apenas uma semana após sua posse.

Os agitadores saquearam o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF) em Brasília no domingo em cenas inéditas na história do país. Foram necessárias horas para que as forças de segurança recuperassem o controle dos principais prédios do governo. Centenas de prisões foram realizadas durante a noite, mas milhares de manifestantes permaneceram na área.

Eles protestam contra a derrota de Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de outubro, contra a eleição do agora presidente Lula (PT) e contra instituições como o STF, a Justiça e o Congresso.

Lula, que visitava no domingo uma cidade destruída pelas chuvas no interior do estado de São Paulo, voltou à capital para fazer um balanço da situação. Ele decretou intervenção federal na segurança do Distrito Federal, o que deve ser confirmado pelo Congresso em sessão extraordinária na manhã desta segunda. Em uma demonstração de força, ele deve se reunir com os chefes do Congresso e do Supremo Tribunal Federal, bem como com governadores de Estado que devem voar para Brasília.

“Não há precedente para isso na história do nosso país”, disse Lula em comentários televisionados, prometendo processar os manifestantes. “Vamos descobrir quem são os financiadores.”

Na madrugada desta segunda-feira, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, determinou a destituição do governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, por 90 dias, enquanto apura sua responsabilidade na quebra de segurança dos 3 Poderes.

Moraes também deu à polícia 24 horas para dispersar os partidários de Bolsonaro que estão acampados em frente a quartéis militares em todo o país desde que o líder conservador perdeu para Lula por uma margem estreita no segundo turno da eleição em 30 de outubro.

Os manifestantes estavam envoltos em bandeiras brasileiras e vestindo a camisa nacional amarela, que ficou associada à política ultraconservadora, quando invadiram os principais prédios do governo do país na tarde de domingo, em evento semelhante à invasão do Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021.

Atos de Vandalismo

Muitos manifestantes quebraram janelas, móveis e o que encontraram pela frente e cometeram atos de vandalismo na sede do governo, enquanto outros gravaram vídeos e tiraram selfies. O ministro das Comunicações, Paulo Pimenta, disse que várias obras de arte foram danificadas.

O presidente Joe Biden chamou o ataque de “ultrajante”, enquanto líderes da América Latina e da Europa, de partidos de direita e de esquerda, rapidamente se solidarizaram com Lula.

No Twitter, o presidente do Chile, Gabriel Boric, caracterizou os ataques como “sem precedentes”, enquanto o colombiano Gustavo Petro convocou os membros da Organização dos Estados Americanos a se reunirem para aplicar a carta democrática. A primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, de extrema-direita, disse que ataques à democracia devem ser condenados e pediu respeito ao resultado das eleições.

O que a Bloomberg Economics diz

É improvável que os mercados e a economia saiam ilesos. O modelo da Bloomberg Economics sugere que um aumento na incerteza política em torno dos níveis de um pico de abril de 2017 poderia enfraquecer o real em 1,8%, empurrar os preços das ações para baixo em 3% e cortar cerca de 0,7 pontos percentual da atividade econômica de janeiro”, disse Adriana Dupita, economista para a América Latina.

A agitação no domingo ocorre após dois meses de protestos em frente a instalações militares de apoiadores de Bolsonaro, que exigiam uma intervenção para impedir que Lula voltasse ao poder após o segundo turno. No final de dezembro houve uma ameaça de bomba perto do aeroporto de Brasília. Mais de cem ônibus de apoiadores de Bolsonaro chegaram a Brasília antes dos protestos de domingo.

O ex-presidente Bolsonaro, que viajou aos Estados Unidos em 30 de dezembro para evitar a cerimônia de transição de poder, emitiu seis horas um breve comentário sobre os acontecimentos.

“Manifestações pacíficas, dentro da lei, fazem parte da democracia. Mas depredações e invasões de prédios públicos como vimos hoje, à semelhança dos atos praticados pela esquerda em 2013 e 2017, não estão dentro das regras”, disse Bolsonaro no Twitter.

Os eventos no Brasil também ocorrem em um momento de intensa volatilidade política na América Latina, uma região conhecida por sua recorrente instabilidade e turbulência social.

No Peru, Pedro Castillo foi deposto como presidente e rapidamente preso depois de tentar dissolver o Congresso no mês passado. Na Argentina, o presidente Alberto Fernandez busca o impeachment do líder da Suprema Corte após uma série de confrontos entre o governo e a justiça.

Estado de Alerta

Governos locais de todo o Brasil e grandes empresas têm implementado medidas para evitar novos episódios de violência. A Petrobras está monitorando a segurança em suas refinarias para garantir que não se torne um novo alvo, disse Jean Paul Prates, o próximo diretor-presidente, no domingo.

Gleisi Hoffmann, presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), criticou as autoridades da capital federal por não terem evitado o distúrbio civil. Lula disse que os policiais que não enfrentaram os manifestantes serão processados - há vídeos que viralizaram que mostram muitos deles conversando com manifestantes enquanto a invasão aos prédios públicos acontecia.

Robert Muggah, co-fundador do Instituto Igarapé, um think tank no Rio de Janeiro, disse que os distúrbios são a ameaça mais significativa à democracia brasileira desde o golpe de 1964 e que será comemorado por muitos membros da extrema direita brasileira.

“Eles vão tratar isso como uma convocação para futuras interrupções”, disse Muggah. “A insurreição violenta de hoje é um lembrete de que a democracia nunca pode ser dada como garantida.”

Outros especialistas disseram que os distúrbios provavelmente prejudicarão o apoio à extrema direita, já que a maioria dos brasileiros condena a violência.

Christian Lynch, cientista político da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, disse que os eventos de domingo causarão danos irreversíveis ao movimento de Bolsonaro e que a resposta de todos os ramos do governo será rápida e implacável.

“Isso esmagará a legitimidade da extrema direita”, disse ele. “O sistema acabará com qualquer tolerância para com essas pessoas.”