7 negócios que devem receber impulso (ou travar) no governo Lula

Nova gestão do PT enfrentará o desafio de evitar uma recessão. Estímulos a setores como petróleo, energias renováveis e construção civil devem favorecer empresas

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Bloomberg Línea — Novo ano, novo governo, novos negócios. O ambiente corporativo brasileiro inicia um novo ciclo em 2023, sob expectativas de mudanças nas regras do jogo regulatório, de uma guinada desenvolvimentista e de menor disciplina fiscal do setor público, com risco de alta de impostos e maior monitoramento das autoridades e interferência nos planos de expansão de companhias estatais.

Setores estratégicos, como petróleo, energia, mineração, construção civil, agronegócio, infraestrutura e financeiro, devem ser os mais escrutinados no governo Lula, segundo analistas ouvidos pela Bloomberg Línea.

A partir de fevereiro, com a renovação do Congresso Nacional com a posse dos novos parlamentares, grupos de lobby devem ser mobilizados para influenciar uma agenda legislativa, que deve ser dominada por discussões como as da reforma tributária.

“O pacote de expansão fiscal de R$ 170 bilhões/ano para aumentar os gastos sociais, que Lula conseguiu persuadir o Congresso a aprovar, acabou sendo maior do que o esperado, com potenciais repercussões para a sustentabilidade da dívida”, avaliou o time de estratégistas do BTG Pactual (BPAC11), em relatório sobre suas expectativas para o mês de janeiro.

“Para evitar uma maior deterioração do risco-país e uma combinação pior de crescimento/inflação, o novo governo pode ter que criar medidas compensatórias (aumento de impostos?) para financiar mais gastos”, analisaram.

O cenário macroeconômico local, caracterizado por taxas elevadas de juros e inflação ainda preocupante, deve evoluir também seguindo as tendências ditadas pelo exterior, principalmente pelo ritmo econômico das maiores economias do mundo (EUA, China e Europa), fragilizadas pelo aperto monetário para conter os preços e à espera do fim da guerra entre Rússia e Ucrânia.

Já o perfil predominantemente político do novo gabinete ministerial em Brasília gera desconfiança no mercado.

“As escolhas da equipe econômica do novo governo levantaram temores de um retorno ao intervencionismo estatal que foi a marca dos últimos anos de seus mandatos anteriores (2003-10). O Brasil precisa de uma reformulação nas regras fiscais e de uma reforma tributária para garantir o crescimento de longo prazo e a solvência fiscal”, analisou relatório da consultoria hEDGEpoint Global Markets, especializada em commodities, mercados agrícolas e de energia.

Confira o que os analistas esperam para sete áreas de negócios da economia brasileira.

1. Venda de refinarias

Negócios sob risco: venda de refinarias da Petrobras (PETR3, PETR4) no Paraná (Repar), no Rio Grande do Sul (Refap) e em Pernambuco (Rnest). O novo governo deve negociar com o órgão antitruste a revisão de um acordo assinado em 2019 com o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) e recuar do compromisso de privatizar oito plantas de refino e suas respectivas infraestruturas logísticas.

Negócios no radar: a nova Petrobras deve buscar mais oportunidades em projetos de transição energética em três áreas (hidrogênio, eólica offshore e captura de carbono). São esperados aportes em projetos para descarbonização das operações da empresa, como a eletrificação de plataformas, sistema de recuperação de gases, eficiência energética e redução de emissões em refinarias.

“Vemos bons motivos para a Petrobras se posicionar em setores ligados a energias com menor pegada de carbono”, afirma o analista do Banco do Brasil Daniel Cobucci, lembrando duas transações bilionárias recentes nesse segmento (a compra da Archaea Energy, produtora de biogás, pela British Petroleum; e o anúncio da aquisição de fatia da Casa dos Ventos pela francesa TotalEnergies).

2. Novas áreas para mineração

Negócios sob risco: licenças de exploração de granito, quartzito e mármore, concedidas durante o governo Bolsonaro, devem ser revistas. Projetos de mineração em garimpo de ouro e estanho na Amazônia também podem ser suspensos. A Galvani Fertilizantes e a INB (Indústrias Nucleares do Brasil) devem ter dificuldade para tirar do papel o Projeto Santa Quitéria, que busca explorar urânio no Ceará.

A nova ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, defende a mesma visão de ambientalistas preocupados com riscos de contaminação da população pelo elemento químico.

Negócios no radar: a supervisão e o monitoramento de barragens de rejeitos devem ficar mais rigorosos, depois do desastre ambiental da barragem da Vale (VALE3), em Brumadinho (Minas Gerais) em 2019. Empresas vão demandar mais obras para redução de riscos e cuidados com o meio ambiente. A Vale prevê não ter nenhuma barragem em estado crítico de segurança (nível 3 de emergência) até 2025.

3. Concessão do Porto de Santos

Negócios sob risco: o plano de privatização do Porto de Santos, o maior do país, deve ser engavetado. O novo governador do estado de São Paulo, Tarcísio de Freitas, indica disposição de insistir com o seu projeto negociando com o presidente Lula, mas o mercado considera que, no máximo, o governo federal apoiaria a concessão à iniciativa de algumas áreas do porto, de companhias de docas.

Conhecedor do setor portuário, o ex-governador de São Paulo Márcio França, do PSB (Partido Socialista Brasileiro), foi empossado na segunda-feira (2) ministro dos Portos e Aeroportos.

Negócios no radar: o novo governo planeja retomar o PAC (Programa de Aceleração de Crescimento), lançado por Lula em 2007. O foco agora será a finalização de obras de infraestrutura em andamento ou paralisadas, atraindo parcerias com a iniciativa privada. Obras viárias, voltadas para logística de transporte, devem dinamizar parcerias entre a nova administração e empreiteiras.

O ministro dos Transportes, Renan Filho, disse, na posse realizada na terça-feira (3), que a recuperação da malha rodoviária vai demandar cerca de R$ 100 bilhões em investimentos e que novos projetos ferroviários podem ser concretizados por meio de PPPs (parcerias público-privadas).

4. Nova Eletrobras

Negócios sob risco: a privatização da Eletrobras, em 2022, não deve ser contestada, pois aumentaria a percepção de insegurança jurídica, mas regras como a obrigação de contratação de energia de térmicas e PCHs (pequenas centras hidrelétricas) pode ser questionada, segundo analistas. A esperada privatização da Copel (Companhia Paranaense de Energia) para 2023 corre risco de ser desestimulada.

Negócios no radar: incentivos à construção de hidrelétricas de menor porte, usinas solares, eólicas e a partir da biomassa são aguardados, porque o discurso do novo governo é desenvolver fontes de energia renovável. O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) deve reforçar suas linhas de crédito, como o RenovaBio, para programas de eficiência energética do setor produtivo.

5. Mercado imobiliário

Negócios sob risco: os juros elevados (13,75% ao ano) ainda travam o aumento dos financiamentos imobiliários no país. O mercado descarta início de corte da taxa Selic antes do segundo semestre de 2023. Isso significa que construtoras em dificuldades financeiras terão que engavetar lançamentos, sem gerar caixa. Em setembro de 2022, a Rossi Residencial (RSID3) entrou em recuperação judicial.

Negócios no radar: incorporadoras que atendem o público de média-baixa renda, como a MRV (MRVE3), uma das maiores do país, e a Tenda (TEND3), podem se beneficiar de medidas de combate ao déficit habitacional prometidas pelo novo governo, como a retomada do Minha Casa, Minha Vida. O programa deve ganhar novas modalidades como lotes urbanizados, aluguel social, além de estímulos fiscais para induzir a construção ou reabilitação de prédios ociosos em centros urbanos.

“Há uma sinalização por parte do novo governo de retomada do Programa Minha Casa Minha Vida. Se por um lado as altas taxas de juros do crédito habitacional representam um cenário mais desafiador para o mercado de média renda, por outro há uma perspectiva de retomada do mercado de HIS [Habitação de Interesse Social], que pode mitigar a retração do segmento”, diz Ana Maria Castelo, coordenadora de projetos de construção da FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), sobre sinais de melhora na confiança do setor, como o indicador de demanda prevista.

6. Crédito dos bancos públicos

Negócios sob risco: em 2022, a inadimplência elevada levou os principais bancos brasileiros a aumentar provisões para devedores duvidosos, pressionando sua rentabilidade. O setor financeiro tem a previsão de desaceleração no ritmo de concessão de crédito, com maior rigor na análise de risco pelos bancos. A alta dos spreads dos empréstimos deve compensar um mercado de capitais sem dinamismo.

Negócios no radar: os bancos públicos, como Banco do Brasil (BBAS3), Caixa Econômica Federal e BNDES, devem ganhar maior relevância com os planos do novo governo de evitar uma recessão e fomentar principalmente pequenas e médias empresas por meio de taxas subsidiadas. Essas instituições financeiras podem aumentar equipes via concursos públicos e abrir novas agências.

São esperados cerca de 120 editais e até 55 mil vagas nos mais variados órgãos, segundo Agnaldo Bastos, advogado especialista em concursos públicos. “O novo governo Lula tende a focar mais na máquina pública e a investir mais na abertura de concursos públicos federais”, afirma Bastos.

7. Exportações do agronegócio

Negócios sob risco: atividades agropecuárias ligadas a ocorrências de desmatamento, queimadas e degradação ambiental devem enfrentar uma maior fiscalização pelas autoridades federais, como promete o novo governo. O controle sobre a lista de agrotóxicos também pode ser reforçado, bem como as ações de proteção a territórios de povos tradicionais, principalmente na Amazônia.

Negócios no radar: incentivos ao desenvolvimento de cooperativas de produtores rurais e à agricultura familiar e sustentável estão no programa do novo governo. O Banco do Brasil deve ser acionado para reforçar os desembolsos para financiar o Plano Safra, bem como para ampliar negócios na cadeia produtiva do agro, simplificando processos, em especial pequenos e médios produtores e pecuaristas.

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