Quem são os ministros de confiança de Lula em seu terceiro mandato

De Fernando Haddad na Fazenda a José Múcio na Defesa, cinco ministros terão missões fundamentais no novo governo depois de quatro anos de Jair Bolsonaro; entenda os motivos

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Bloomberg Línea — O presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou quem vai ocupar alguns cargos importantes de seu governo a apenas poucos dias da posse. Foi o caso de Marina Silva, ministra do Meio Ambiente, uma área que o próprio Lula disse que é uma das prioridades de seu novo mandato; ou de Jean-Paul Prates como presidente da Petrobras (PETR3, PETR4), maior empresa da economia brasileira.

Foram quase dois meses desde a vitória no segundo turno. Mas houve exceções a essa prática.

Em 9 de dezembro, Lula anunciou os titulares de cinco ministérios: Fazenda, Relações Exteriores, Casa Civil, Defesa e Justiça. São as cinco cadeiras que compõem o núcleo de seu governo a partir deste domingo (1º de janeiro). O primeiro escalão, como diz o jargão de Brasília. Não por acaso, o presidente escolheu pessoas próximas com quem tem relações de longa data para os cargos.

Na entrevista coletiva que convocou na ocasião para divulgar os nomes dos titulares, Lula disse que antecipou o anúncio “porque é preciso que algumas pessoas comecem a trabalhar para montar o governo”. “Espero que eles possam trabalhar como jamais trabalharam, porque a tarefa que lhes foi incumbida será sempre mais difícil do que todas as tarefas que eles já cumpriram”, afirmou.

Conheça a seguir quem são as cinco pessoas de maior confiança de Lula em seu terceiro mandato:

Fernando Haddad

Fernando Haddad, o novo titular da Fazenda, foi ministro da Educação de 2005, no primeiro mandato de Lula, até 2012, já sob o governo Dilma Rousseff (PT).

Em 2018, depois que Lula foi proibido de se candidatar a presidente pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), Haddad assumiu a cabeça da chapa e concorreu como candidato do PT no que Lula sempre chama de “campanha bonita” - no qual Haddad saiu derrotado para Jair Bolsonaro.

Haddad chega ao governo com a missão de assegurar a estabilidade da economia e do país e dos gastos sociais que são prioridade para Lula.

Deverá apresentar uma proposta para a criação de um novo regime fiscal que substitua o teto de gastos, desrespeitado nos últimos anos. Outra meta é uma reforma nos tributos que incidem sobre o consumo, para simplificar o sistema. Hoje, a maior carga é enfrentada pela classe média e pelos mais pobres.

O novo ministro criou uma secretaria especial para cuidar do tema, liderada pelo economista Bernard Appy. Haddad também já disse que, por determinação de Lula, o assunto deve ter “prioridade total”.

No dia em que anunciou os primeiros integrantes de seu ministério, Lula foi claro quanto às expectativas sobre Haddad. O presidente disse que, pela experiência de dois mandatos, sabia que todos os seus ministros iriam cobrá-lo por mais orçamento em suas pastas. “Se vocês querem mais dinheiro, arrecadem mais. Façam a economia crescer que vai ter mais emprego e mais salário para todo mundo”.

Haddad escolheu como chefe da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), órgão responsável, entre outras funções, pela cobrança de dívidas tributárias, a procuradora Anelize Lenzi Ruas de Almeida, que foi da Procuradoria Geral Adjunta da Dívida Ativa da União, hoje em R$ 2,7 trilhões.

A procuradora fez parte do time que criou diversas formas de estímulo ao pagamento de dívidas fiscais, como o Regimento Diferenciado de Cobrança de Crédito (RDCC); o programa de conformidade de contribuintes, que premia contribuintes que pagam impostos em dia; e o rating de dívida, que classifica os créditos tributários conforme a possibilidade de pagamento pelo devedor.

Para a Secretaria da Receita Federal, Haddad escolheu o tributarista Robinson Barreirinhas. Advogado, o novo secretário trabalhou com o ministro no governo da cidade de São Paulo quando Marta Suplicy era prefeita, época em que trabalhou na reestruturação da dívida do município.

Rui Costa

A Casa Civil, que será chefiada pelo senador eleito Rui Costa (PT-BA), não é necessariamente reconhecida como fundamental por quem não é do mundo político, mas é a pasta responsável pela coordenação política e pelo monitoramento das ações do governo, bem como pela articulação com o Congresso.

Também é a Casa Civil que coordena os trabalhos dos conselhos gestores dos programas sociais, prioritários em administrações petistas. Não por acaso, funciona dentro do Palácio do Planalto.

Para o terceiro mandato, Lula elegeu a reestruturação do Bolsa Família e a volta do programa habitacional Minha Casa, Minha Vida como prioridades nessa área. É um cargo, portanto, caro para Lula. Nos seus primeiros mandatos, a cadeira foi ocupada primeiro por José Dirceu e, depois, por Dilma Rousseff, a quem Lula escolheu como sucessora - e atuou para elegê-la presidente em 2010.

Político experiente, Rui Costa foi governador da Bahia por dois mandatos e antes chefiou a Casa Civil do governo baiano nos dois governos de Jaques Wagner (PT). Também já foi deputado.

É aliado de longa data de Lula, a quem conhece desde que era sindicalista do Polo Petroquímico da Bahia. Já no início da montagem do ministério, ganhou uma queda de braço importante: ficou sob o chapéu da Casa Civil, e não do Ministério do Planejamento de Simone Tebet (MDB-MS), o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), que cuida das concessões de serviços públicos à iniciativa privada.

Flávio Dino

O Ministério da Justiça, que costuma exercer papel institucional na relação do governo com os tribunais, especialmente os superiores, ficou com Flávio Dino (PCdoB-MA).

Senador eleito, Dino já foi juiz federal, deputado e governador do Maranhão. O ministro da Justiça é também o chefe da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal (PRF), órgãos hoje alvos de investigação em inquéritos sobre o aparelhamento de suas chefias por Jair Bolsonaro.

Quando anunciou Dino, Lula disse que o novo ministro terá a tarefa de “consertar o Ministério da Justiça”, em uma alusão especialmente aos órgãos policiais. Mesmo antes de ser anunciado, Dino já vinha trabalhando com a ideia de “desbolsonarizar” as polícias, especialmente a PRF.

No dia do segundo turno, a corporação interceptou diversos ônibus ocupados por eleitores a caminho das zonas eleitorais. A maioria das ações aconteceu no Nordeste, região onde Lula era o favorito e onde de fato recebeu mais votos que Bolsonaro - mas que mostrou abstenção maior em 2022.

Depois de confirmado o resultado, bolsonaristas ocuparam estradas para protestar contra a derrota de seu candidato. A PRF, segundo investigações, demorou para desmobilizar os movimentos, em um sinal de que não pretendia agir contra os eleitores de Jair Bolsonaro, em vez de atuar pelo estado brasileiro.

Flavio Dino já recebeu carta de apoio dos delegados da Polícia Federal - que também já apresentaram suas demandas corporativas, como autonomia constitucional, nos moldes do Ministério Público.

O novo chefe da PRF será um agente da corporação, o policial rodoviário Antônio Fernando Oliveira.

José Múcio

Depois de quatro anos do governo de Jair Bolsonaro, a relação do governo eleito com a cúpula hierárquica das Forças Armadas ganhou ainda mais importância estratégica.

Bolsonaro foi o primeiro presidente a nomear generais para o Ministério da Defesa, criado no governo Fernando Henrique Cardoso há mais de duas décadas justamente com o objetivo de garantir que as Forças Armadas respondessem ao poder civil eleito com o voto da população.

Lula decidiu nomear José Múcio para a Defesa, devolvendo a pasta a um civil.

Múcio chega ao cargo depois de uma articulação feita entre Lula, lideranças militares e o Tribunal de Contas da União (TCU), a qual compete fiscalizar as contas dos órgãos do governo federal, inclusive das Forças Armadas. Múcio foi deputado, assessor especial de Lula e ministro do TCU - foi ele o relator do processo de fiscalização de contas que deu origem ao processo de impeachment de Dilma.

Uma das missões de Múcio será articular a redução do número de militares no governo, algo que ganhou proporções inéditas da era democrática brasileira no governo Bolsonaro.

Foi justamente uma auditoria do TCU que descobriu que havia, em julho de 2020, 6.157 militares em funções civis, com aumento de 75% em relação a 2016 - 1,9 mil desses militares no governo em 2020 haviam sido convocados para zerar a fila do INSS e foram exonerados meses depois.

Em 2021, o número de militares no governo já havia caído para 1.085, segundo dados do Instituto de Política Econômica Aplicada (Ipea), ainda assim quase 200% a mais que em 2013.

Os militares também aumentaram sua presença em cargos de confiança. Entre 2013 e 2021, o percentual de militares em cargos considerados mais baixos caiu de 65% para 54,5%. Em contrapartida, a ocupação de cargos de confiança por oficiais saltou de 8,9% para 20,5%, segundo o Ipea.

Dos cinco primeiros ministros anunciados, Múcio foi o primeiro a se reunir com Lula.

Mauro Vieira

Outro cargo prioritário para o novo governo é o do Ministério das Relações Exteriores. O escolhido foi o diplomata Mauro Vieira, que havia sido chanceler do governo Dilma entre 2015 e 2016, até ser exonerado com o impeachment da presidente. Em 2018, foi nomeado embaixador na Croácia, posto considerado sem prestígio, em que estava até ser nomeado chefe do Itamaraty por Lula.

É uma posição sensível. Logo depois de ser eleito presidente, Lula foi à COP27 no Egito, convenção da ONU sobre mudanças climáticas. Deixou claro que trataria a questão climática como um assunto de Estado e que dependeria de diplomacia, já que o tema envolve negociações internacionais.

Lula é tido como um dos grandes responsáveis pelo crescimento do prestígio internacional da diplomacia brasileira em seus mandatos, um contraponto à visão de Jair Bolsonaro para o tema.

Quando anunciou Mauro Vieira na chefia do Palácio do Itamaraty, Lula não procurou atenuar a expectativa que coloca sobre os ombros do novo chanceler. “O companheiro Mauro Vieira sabe da responsabilidade [que tem]. Até porque o Brasil precisa voltar a ter política externa protagonista, uma política externa, como diz sempre o [ex-ministro das Relações Exteriores] Celso Amorim, ativa e altiva”, disse.

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