Bloomberg Opinion — É tentador considerar as demissões em massa e o colapso dos preços das ações no setor de tecnologia apenas como mais uma gota d’água no ciclo de alta e baixa da tecnologia. As empresas de tecnologia podem representar 36% do S&P 500, mas representam apenas 0,3% dos trabalhadores. Trata-se, na maioria das vezes, de pessoas altamente qualificadas que provavelmente encontrarão outros empregos rapidamente, portanto, há razões para esperar que esta seja uma correção necessária para um setor superinflado da economia e que adaptar o setor não causará danos mais amplos.
Mas o fato de que a produtividade nos Estados Unidos também está caindo é notável e sugere que o que está acontecendo no setor de tecnologia pode significar que algo muito mais profundo está errado.
A economia do setor de tecnologia ainda não cumpriu sua promessa. Os primeiros surtos de crescimento do setor mudaram vidas: ter encanamento interno é bastante surpreendente, assim como a eletricidade, a rede de energia e o telégrafo. Estes não apenas transformaram a experiência humana, aumentaram o padrão de vida e nos libertaram de trabalho árduo mas também trouxeram ganhos sem precedentes em produtividade e riqueza.
Portanto, tem sido um mistério viver em uma época com tantas inovações que mudam quase tudo em nossas vidas e trabalhos, mas os números de produtividade não são tão impressionantes como eram no início do século XX.
Mesmo assim, eu estava otimista - talvez não soubéssemos como tirar o máximo proveito dessas inovações tecnológicas. Então veio a pandemia e de repente a tecnologia pareceu revolucionar a experiência humana da mesma forma que a industrialização havia feito.
Em vez de tecidos produzidos em massa e entretenimento, podíamos escalar a interação humana de maneiras que pareciam igualmente importantes. Foi possível fazer reuniões, assistir a uma aula de ginástica e comprar praticamente qualquer item do conforto de sua casa. Parecia que a pandemia iria fazer com que nos adaptássemos de forma a trazer o tão esperado aumento de produtividade e riqueza para todos.
Por um tempo, pareceu que era exatamente o que ia acontecer. A produtividade, medida pela produção por hora trabalhada, disparou em 2020 e 2021. Mas, nos últimos dois trimestres, os números de produtividade diminuíram.
Muitas empresas de tecnologia – as que deveriam mudar o mundo – estão demitindo trabalhadores pela primeira vez em anos, e a produtividade por funcionário está caindo.
Até mesmo as aventuras tecnológicas de gigantes como a Disney (DIS) estão gerando descobertas de que suas plataformas de streaming não estão produzindo a receita esperada. As criptomoedas, que seriam as moedas da tecnologia, não parecem ser a prometida alternativa às moedas correntes. Até mesmo a Beyond Meat, uma resposta tecnológica ao nosso consumo de carne, está descumprindo suas promessas.
Em alguns aspectos, deveríamos ter previsto isso: anos de juros baixos significavam dinheiro fácil e barato, um ambiente que favorecia ações de alto risco e alto crescimento e expansão alimentada pela dívida. Muitas empresas de tecnologia foram supervalorizadas ou nunca deveriam ter existido. Um recuo no risco pode até ser saudável por separar o joio do trigo. Portanto, talvez o que está acontecendo na tecnologia não chegue à economia mais ampla.
Mas a queda na produtividade está ocorrendo em toda a economia e sugere que a tecnologia pode precisar de um ajuste de contas mais estrutural. Durante a pandemia, empresas de todos os tipos adotaram as tecnologias que deveriam nos tornar mais produtivos, como o trabalho remoto e a automação de todos os tipos de serviços, desde o delivery até as consultas médicas.
E embora alguns trabalhadores possam estar fazendo apenas o mínimo - fenômeno conhecido como the great resignation -, poderíamos até pensar que o uso da tecnologia relacionada à mão de obra compensaria isso. Pense em todo o tempo que economizamos por não termos que nos deslocar, ou por não termos que bater papo com os colegas de trabalho, ou apenas por usar o autoatendimento nos mercados.
Em vez disso, o aumento da produtividade foi apenas temporário. E as demissões são um sintoma desse problema de produtividade, não apenas de investimento excessivo. Quando as pessoas voltaram às suas vidas normais, grande parte da nova demanda acabou.
Também houve uma notável queda na qualidade do produto que pode ser devido em parte ao fato de que os produtos tecnológicos dependem de dados antigos em um mundo que mudou. Ou talvez, em vez de nos tornar mais produtivos, a tecnologia esteja nos fazendo sentir mais isolados e deprimidos.
O trabalho híbrido pode economizar tempo e nos tornar mais eficientes, mas também é tóxico para a cultura no local de trabalho. A produtividade pode aumentar inicialmente, mas menos colaboração e engajamento podem prejudicar a produtividade ao longo do tempo.
Se assim for, pode ser que tenhamos investido demais na tecnologia errada. Talvez substituir o contato humano e ficar em casa não seja o futuro, e a essa bolha será seguida de uma recessão como em 2001, quando a bolha de tecnologia se espalhou para a economia mais ampla e causou demissões generalizadas e destruição de riqueza. No longo prazo, pode significar anos de estagnação até que atualizemos nossos dados e descubramos melhores usos da tecnologia.
Eventos recentes certamente justificaram o ceticismo da promessa das big techs. Embora ainda seja muito cedo para afirmar que a revolução tecnológica deu errado, este é pelo menos um lembrete de que o progresso – muitas vezes o tipo mais importante de progresso – não segue um caminho linear.
Muitas vezes há muitos passos em frente, seguidos por um investimento excessivo nas áreas erradas, e depois alguns passos atrás. O progresso é confuso e imprevisível. O motor a vapor levou mais de 100 anos para aparecer em números de produtividade, por isso ainda tenho esperança em nossa mais nova onda de tecnologia.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Allison Schrager é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de economia. É pesquisadora sênior do Manhattan Institute e autora de “An Economist Walks Into a Brothel: And Other Unexpected Places to Understand Risk”.
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