Bloomberg — A safra de balanços dos principais bancos de varejo no terceiro trimestre apontou que os atrasos de pagamento estão entre os principais fatores que estão impactando os resultados.
Uma análise dos números consolidados revela que as dívidas em atraso se concentram principalmente em pessoas físicas e donos de pequenos negócios, em faturas de cartão de crédito e crédito pessoal. São dois produtos apontados como os principais responsáveis da onda de inadimplência no setor financeiro.
A falta de pagamentos em dia obrigou as instituições financeiras a aumentarem suas provisões para o pagamento devedores duvidosos, além de tomarem medidas como maior seletividade na emissão de cartões e cortes de limites de crédito.
Cerca de 6,3 milhões de empresas estavam com o nome no vermelho em setembro, segundo a Serasa Experian. O país de cerca de 215 milhões de habitantes tinha 68,4 milhões de pessoas com nome restrito na praça em setembro, segundo levantamento dessa consultoria.
Houve ainda esforços na recuperação de crédito no setor financeiro, venda de carteiras com perfomance afetadas pelos atrasos no pagamento. Esse peso da inadimplência serviu para limitar os lucros dos bancos mais expostos principalmente a clientes de baixa renda, como o Bradesco (BBDC4).
Dados mais recentes do Indicador Serasa Experian de Recuperação de Crédito das Empresas apontam que o índice de dívidas recuperadas pelas empresas em até 60 dias de negativação foi de 45,9%, em julho. Em relação aos valores da dívida, aquelas de mais de R$ 10 mil foram a mais ressarcidas (51,5%).
“As contas mais caras geralmente envolvem dívidas de financiamentos de bens materiais, como imóveis e veículos de trabalho, que são essenciais para o funcionamento da empresa”, disse o economista da Serasa Experian, Luiz Rabi.
“Além disso, a priorização do pagamento de parceiros e fornecedores é uma forma dos empreendedores garantirem um bom relacionamento para que não faltem insumos em seus negócios e, consequentemente, seja possível manter o fluxo de caixa ou renegociar dívidas quando necessário.”
Em relação aos setores, aqueles que englobam compromissos financeiros com fornecedores e parceiros foram os receberam mais pagamentos (53,2%). Em contrapartida, o de telefonia contou com a menor taxa de quitações (13,4%), segundo a Serasa.
A visão do Bradesco BBI
Para os analistas Gustavo Schroden (Bradesco BBI) e José Cataldo (Ágora Investimentos), o número recorde de clientes com empréstimos em atraso no Brasil em setembro (68,4 milhões) indica um impacto para o setor financeiro.
“Os bancos brasileiros podem continuar respondendo à deterioração da qualidade dos ativos entrando em renegociações, vendendo algumas carteiras de empréstimos em dificuldades ou realizando uma expansão mais lenta de carteiras não garantidas devido a originações mais seletivas, especialmente porque as famílias estão enfrentando mais pressão sobresua capacidade de pagar dado o alto endividamento”, indicou a dupla de analistas, em nota enviada aos clientes.
Outras fontes confirmam o patamar elevado dos atrasos de conta no Brasil. Na inadimplência de outubro, a proporção de famílias brasileiras com contas atrasadas cresceu de 30% para 30,3%, quarta alta mensal seguida, apontou pesquisa da CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo). Em um ano, o avanço de 4,6 pontos percentuais no indicador foi o maior desde março de 2016.
No total, 79,2% das famílias pesquisadas relataram ter dívidas a vencer (cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa).
Raio-x do inadimplente
A parcela de inadimplentes que acreditam ou têm certeza que conseguirão pagar as dívidas caiu de 73% para 59% entre 2021 e 2022. Já o percentual daqueles que afirmam que acha ou têm certeza que não quitarão os débitos subiu de 5% para 17%, apontou a pesquisa “Raio-X dos Brasileiros em Situação de Inadimplência”, realizada anualmente pelo Instituto Locomotiva e pela MFM Tecnologia, empresa de tecnologia, especializada nas áreas de crédito e cobrança.
O levantamento, que ouviu 1.020 pessoas entre 19 e 28 de setembro, apurou que a grande maioria do endividados declaram que o fato de estar nessa situação impacta negativamente em diversas áreas da vida. Para 84%, as dívidas afetam o seu estado emocional, sendo que 42% afirmaram terem um impacto muito forte. Autoestima e felicidade são também outras esferas da vida atingidas de forma negativa pelo endividamento, com taxas 82% e 81%, respectivamente.
Rodízio de contas
Segundo a pesquisa, o “rodízio de contas” também se tornou prática para a maior parte entre endividados, com 60% deles afirmando ter atrasado alguma conta para pagar outra mais urgente nos últimos 12 meses. Em caso de priorização de contas para pagar, itens básicos -como luz, água e gás (58%), cartão de crédito 42%, supermercado (40%) e aluguel (30%)- aparecem como as mais citadas.
Perda de emprego e falta de planejamento das finanças são os principais motivos para os brasileiros terem dívidas em atraso, com 31% e 29% das citações, respectivamente. Além disso, 18% dos inadimplentes afirmaram ter perdido o prazo de pagamento e acumulado dívidas por ficar doente, segundo a pesquisa.
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