Opinión - Bloomberg

Quer saber o que esperar do colapso cripto? Lembre-se da crise de 2008

Repercussões não serão tão terríveis como as da crise financeira, mas a comparação entre os períodos traz insights sobre o que virá em seguida

Foto: FreePik
Tempo de leitura: 3 minutos

Bloomberg Opinion — A história pode não se repetir, mas certamente traz semelhanças. Embora as repercussões da carnificina nos mercados de cripto não sejam tão amplas ou terríveis como as da crise financeira de 2008, os paralelos entre os dois episódios oferecem uma visão do que deu errado e do que provavelmente está por vir.

LEIA +
FTX deve US$ 3,1 bilhões a seus 50 maiores credores sem garantia

Todas as modas financeiras têm algumas características em comum. Crenças fortes se fortalecem com feedback positivo. Durante a ascensão, desempenho positivo e especulação se misturam, alimentados por dinheiro emprestado. Na queda, tudo se inverte. Os fracassos corroem a confiança e os participantes fogem até que o sistema inteiro se rompa.

Nos anos 2000, a crença era que os preços das casas não poderiam cair em todo o país. Isso apoiou um boom nos empréstimos hipotecários subprime, o que elevou os preços das casas e fez com que os proprietários parecessem mais ricos, atraindo mais investidores e incentivando mais empréstimos em termos cada vez mais precários. O aumento dos preços levou a uma maior oferta, o que fez com que os preços se estabilizassem e depois caíssem.

Quando isso aconteceu, os riscos de empréstimos subprime tornaram-se evidentes, minando a demanda e enfraquecendo ainda mais os preços. Os investidores fugiram e as contrapartes exigiram mais garantias, provocando falhas e minando ainda mais a confiança até que toda a constelação interligada de intermediários financeiros estivesse à beira do colapso.

PUBLICIDADE

No mercado de cripto, a crença era de que este novo mercado continuaria crescendo até deslocar as finanças tradicionais. Considere os tokens emitidos por exchanges de cripto (incluindo a FTX), oferecendo descontos nas taxas: seu valor dependia do crescimento persistente dos volumes de trading. O trading dependia da fé contínua no crescimento, que, por sua vez, dependia de mais trading. Mas assim que algo falhou – a chamada “stablecoin” Terra perdendo sua paridade, ou a entidade parecida com um banco Celsius rigidamente enganando seus clientes – a confiança e o entusiasmo desapareceram.

O fracasso de algumas empresas enfraqueceu outras, em uma dinâmica que agora consumiu a FTX, que, até recentemente, parecia estar entre as mais fortes. E o fracasso da FTX sem dúvida enfraquecerá ainda mais o setor de cripto.

LEIA +
Wall St repensa visão sobre criptos e Coinbase é alvo de revisão por analistas

Então, o que uma comparação com a crise de 2008 pode nos dizer sobre o que vem em seguida para cripto?

PUBLICIDADE

Primeiro, ainda não estamos no fundo do poço. Em 2008, os bancos centrais e os governos restabeleceram a confiança, fornecendo liquidez de emergência e recapitalizando as instituições financeiras. Mas o mercado de cripto não tem um banco central – nenhum credor ou formador de mercado com recursos adequados – e os governos (com razão) não veem o mercado como importante o suficiente para resgatar. Portanto, embora possa haver calmarias e até altas, como acontecia na época, nada impede que grande parte do mercado – incluindo as exchanges e outros intermediários – quebre.

Em segundo lugar, a regulamentação está a caminho. Entre outras coisas, a crise de 2008 gerou a Lei Dodd Frank, o Escritório de Proteção Financeira ao Consumidor, testes de estresse dos bancos e uma revisão completa da forma como os derivativos são negociados. Os clientes de cripto exigirão proteções semelhantes às das finanças tradicionais, e a pressão sobre os órgãos reguladores para agir aumentará à medida que o número de pessoas prejudicadas crescer.

Em terceiro lugar, alguns modelos de negócios sobreviverão e prosperarão. Os derivativos de crédito que desempenharam um grande papel na crise de 2008 continuam sendo um mercado robusto, embora reformado. Da mesma forma, a mudança da Ethereum para um novo modelo mais eficiente para o processamento de transações poderá dar-lhe poder de permanência, permitindo o aumento da produção e a redução dos custos de transação. E agora que as taxas de juros de curto prazo estão bem acima de zero, a oferta de stablecoins lastreadas por reservas de bancos centrais se torna um modelo de negócios sustentável, potencialmente proporcionando tanto lucros para os emissores quanto segurança para os usuários.

LEIA +
Como a Tiger Global investiu na FTX sem que o due dilligence apontasse problemas

A promessa das finanças descentralizadas não está na atividade especulativa associada aos tokens digitais, mas na tecnologia de blockchain. Essa inovação ainda pode ser útil em finanças comerciais, pagamentos internacionais, liquidação de títulos e identidade digital. Portanto, mesmo que a mania tenha acabado, não descarte essa parte do ecossistema cripto.

PUBLICIDADE

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Bill Dudley é colunista da Bloomberg Opinion e consultor sênior da Bloomberg Economics. É pesquisador sênior da Universidade de Princeton, atuou como presidente do Federal Reserve Bank de Nova York e como vice-presidente do Federal Open Market Committee.

Veja mais em Bloomberg.com

PUBLICIDADE

Leia também

FTX tinha saldo em caixa de US$ 1,24 bilhão, mostram documentos judiciais