Van Hattem: direita conservadora e liberal veio para ficar e crescerá na oposição

Deputado reeleito pelo Novo com 257 mil votos diz à Bloomberg Línea que ascensão dessa ala política não depende de Bolsonaro e que Lula terá pouca margem para governar

Marcel Van Hattem foi um dos três deputados federais reeleitos pelo Novo nas eleições de outubro de 2022
19 de Novembro, 2022 | 03:56 PM

Bloomberg Línea — Não há uma extrema direita em ascensão no país, mas uma direita conservadora e liberal - esta, sim, em expansão. A análise é do deputado federal Marcel Van Hattem (Novo), reeleito para um segundo mandato consecutivo nas eleições deste ano. Ele obteve cerca de 257 mil votos e foi o segundo mais votado no seu estado, o Rio Grande do Sul, no início de outubro.

A entrevista faz parte de uma especial da Bloomberg Línea sobre os desafios do país e do próximo governo, além da análise do resultado das eleições, por parte de novas lideranças do Congresso, uma da esquerda e uma da direita, ambos com votações expressivas que os colocaram entre os mais votados do país. Leia aqui a entrevista com a deputada federal reeleita Tabata Amaral (PSB-SP).

Van Hattem é um dos três deputados federais reeleitos pelo Novo, que atualmente tem oito representantes na Câmara dos Deputados. Com o desempenho, a legenda não passou pela chamada cláusula de barreira e acabará, como consequência, sem espaço na propaganda eleitoral do próximo pleito.

Apesar da redução de tamanho na Câmara e em assembleias legislativas estaduais, Van Hattem disse em entrevista à Bloomberg Línea que o principal papel do seu partido é justamente representar essa direita liberal, além de exercer uma oposição “coerente e sensata” ao novo governo eleito.

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O deputado federal, que apoiou o presidente Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno das eleições, disse não ver uma “pacificação possível” diante de uma “oposição superforte” ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Leia a seguir os principais trechos da entrevista, editadas para fins de clareza:

Diante do atual momento de polarização política do país, ainda existe espaço para uma direita mais moderada? Ou o protagonismo nesse campo será da extrema-direita?

Não considero que a extrema-direita tenha protagonismo. Existe uma direita moderada, conservadora, muito expressiva no Brasil, que está à própria margem da imprensa e da academia. O fato de haver uma única alternativa mais forte na eleição não significa necessariamente que as pessoas apoiem Bolsonaro.

Muito pelo contrário, muita gente apoiou o Bolsonaro mais por rejeição ao PT. A movimentação da direita liberal e conversadora veio para ficar e deve ser ampliada com uma maior formação de quadros.

Dentro disso, como você enxerga o futuro da direita no pais?

Espero que a direita se expanda e acho que esse é um papel que o Novo pode desempenhar, mesmo depois de sair de uma eleição com uma redução no número de deputados, mas com um governador eleito [Romeu Zema em Minas Gerais] e com um comprometimento de retomar ou se posicionar claramente com uma direita liberal, como uma oposição sensata, da liberdade de mercado e das liberdades individuais. Acho importante que essa direita cresça, e o cenário de oposição acaba ajudando nisso.

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Você se mostrou publicamente a favor de manifestações nas ruas, desde que sejam pacíficas e não obstruam vias. Qual sua opinião sobre os atos?

Eu entendo que toda manifestação pacífica, ordeira, tem direito de acontecer. Eu vejo uma grande rejeição às manifestações de direita, mas não vejo nem de perto o mesmo critério de rejeição quando são feitas manifestações pela esquerda, inclusive algumas muito mais violentas e golpistas.

Temos um momento novo no Brasil, uma direita nascente que tem surpreendido muita gente. Entendo que, no caso dessas manifestações, o foco é equivocado. Não é diante de quarteis que a população tem que se manifestar. Aliás, um dos maiores culpados por toda essa situação é o Congresso Nacional, que, em muitos momentos, não se posicionou claramente contra arbítrios de outros poderes, contra decisões do STF, e se apequenou ao longo desse período.

Como enxerga a vitória de Lula e quais desafios enxerga para o país?

Uma pena para o Brasil nacionalmente e internacionalmente. Eu não gostaria de esperar o pior, mas a “PEC Argentina”, essa bomba fiscal de R$ 200 bilhões, somada à falta de perspectiva de continuidade de reformas, é muito ruim do país, e ainda por cima não há qualquer contrapartida para isso.

É o pior dos mundos, ele [Lula] vai terminar o primeiro ano com uma popularidade muito baixa, porque ele não tem muita gordura para queimar, porque a margem de diferença sobre o presidente Bolsonaro foi muito pouca.

Sobre os desafios, o maior vai ser se firmar diante da sociedade brasileira, tendo sido vencedor por tão estreita margem, como governo que não é aquilo que seu grande líder demonstra ser. O maior desafio vai ser governar com essa oposição superforte, representada pela própria sociedade.

Na sua visão, como vai ser para o governo eleito negociar com um Congresso mais à direita?

Uma coisa é a sociedade, e outra, o Congresso. Como sociedade, não enxergo pacificação possível, porque os discursos oficiais falam de união, mas os discursos de improviso já são outra coisa. Acho que é bem difícil de haver uma pacificação.

Já sobre a organização da coalizão governamental, vai depender muito das eleições [para a presidência] da Câmara e do Senado [no começo de 2023] e também das formas de fisiologismo utilizadas pelo presidente eleito em relação aos partidos que podem compor sua base.

Qual a prioridade do seu novo mandato?

A valorização da coerência me parece muito importante, porque vimos muita gente eleita mudando de opinião, não fazendo o que deveria. Minha vontade é continuar fazendo o que eu fiz, porém não mais na oposição de independente, porque o governo Bolsonaro tinha muitas pautas econômicas em comum, principalmente o liberalismo, com o ministro Paulo Guedes, mas agora vamos ter um governo do qual eu terei que exercer oposição.

É fazer o que eu fiz ao longo dos últimos quatro anos, porém sob uma nova perspectiva, buscando barrar o máximo possível de iniciativas que possam ser nocivas ao Brasil como já foram no passado. E esperar que em quatro anos possamos ter uma candidatura - quem sabe do Zema, que é do Novo e foi reeleito governador com uma candidatura de direita liberal.

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Melina Flynn

Melina Flynn é jornalista naturalizada brasileira, estudou Artes Cênicas e Comunicação Social, e passou por veículos como G1, RBS TV e TC, plataforma de inteligência de mercado, onde se especializou em política e economia, e hoje coordena a operação multimídia da Bloomberg Linea no Brasil.