AZ Quest: Bolsa está de graça, mas pode sair cara em caso de ‘trem fantasma fiscal’

Para Walter Maciel, CEO da gestora, investidor deve ficar posicionado, mas saber que os preços hoje são adequados ao tamanho da insegurança

'Não consigo ver um cenário hoje de vitória do Lula e perda do mercado. Eu vejo os dois ganhando ou os dois perdendo. E acho que vamos ver os dois ganhando'
17 de Novembro, 2022 | 02:12 PM

Bloomberg Línea — Com empresas saudáveis e múltiplos atrativos, a bolsa brasileira está descontada e é considerada uma das mais baratas do mundo. Mas o barato pode sair caro se o novo governo não fizer o dever na política fiscal. A avaliação é de Walter Maciel, CEO da gestora AZ Quest, que tem cerca de R$ 23 bilhões em ativos sob gestão.

“A bolsa está de graça, mas se a gente entrar em uma trajetória de trem fantasma fiscal, ela pode ficar cara”, disse em entrevista à Bloomberg Línea.

O mercado parece corroborar a avaliação. O Ibovespa (IBOV) operava em queda de 2,42% nesta quinta-feira (17) por volta das 13h40, após a o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin (PSB), apresentar no dia anterior o texto da PEC da Transição com a previsão de até R$ 200 bilhões em despesas fora do teto de gastos em 2023 e a proposta de retirar o programa Bolsa Família e gastos socioambientais da regra fiscal de forma permanente. Já o dólar subia a R$ 5,47 (alta de 1,37%).

Walter Maciel, que atua no mercado financeiro há mais de 30 anos, afirmou na conversa com a Bloomberg Línea que as ações da Petrobras (PETR3; PETR4) estão sendo negociadas “de graça”, mas que as incertezas impedem uma maior exposição por parte dos investidores.

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Segundo ele, o investidor brasileiro deve ficar posicionado hoje na Bolsa, dado que as empresas estão “extremamente saudáveis”, em especial aquelas de alta qualidade, bem geridas e com pouca exposição a políticas do governo – que são as preferidas da AZ Quest.

Mas é preciso lembrar, diz, que o nível técnico de preço do mercado hoje é adequado ao tamanho da insegurança que foi criada, “um sinal de que se os agentes forem racionais, colocando nomes ‘ok’ na Economia, a resposta do mercado vai ser muito violenta para o positivo”.

Apesar de um sentimento ainda de cautela em busca de melhores sinalizações sobre o próximo governo, como quem irá comandar a Economia, Maciel afirmou que está construtivo com o país.

“Não consigo ver um cenário hoje de vitória do Lula e perda do mercado. Eu vejo os dois ganhando ou os dois perdendo. E acho que vamos ver os dois ganhando”, disse.

Ele chamou a atenção, por exemplo, para o Brasil se destacando em relação aos seus pares globais, com superávit comercial, reservas em dólar e com um ciclo de política monetária avançado, que já conta com a pausa de aumento dos juros.

Com relação ao presidente eleito Lula, o CEO da AZ Quest afirmou que ele deverá ter “a sensibilidade política, capacidade de diagnóstico do quadro e que ele vai ter que reagir” após as recentes sinalizações.

“Acho que a gente tende a ver daqui até o final do ano uma reorganização desse discurso e volta da racionalidade, porque os movimentos que aconteceram na última semana, do ponto de vista político, são irracionais. Até porque o maior perdedor seria ele”, disse, referindo-se às sinalizações de quebra do teto de gastos.

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Neste contexto, Maciel afirmou que é preciso tomar cuidado ao ficar vendido [aposta na queda] na bolsa ou comprado [aposta na alta] no dólar e tomado no juro futuro, que ganha com a alta das taxas.

“Se colocarmos o trem de volta nos trilhos, a resposta do mercado vai ser muito rápida e agressiva para cima.”

Walter Maciel, CEO da AZ Quest

E completou: “Nesse ponto de preços, se você colocar uma arma na minha cabeça, eu prefiro estar comprado do que vendido. A Petrobras caiu 70% desde a eleição, então acho que nesse momento tem que começar a montar posição, porque está muito barato. E de novo, tudo leva a crer que a racionalidade vai imperar.”

Nos fundos multimercados da casa, Maciel conta que a AZ Quest manteve as posições compradas no real contra o dólar, que reduziu a posição nos títulos públicos atrelados à inflação (Tesouro IPCA+) e que saiu dos papéis prefixados. A casa agora está esperando os próximos passos do governo para voltar a tomar posição.

“Achamos que o dólar de equilíbrio com um governo minimamente responsável é muito mais baixo, mas precisamos hoje de mais evidências para tomarmos posições maiores”, completou.

Cena externa

Enquanto no Brasil as expectativas apontam para uma melhora da inflação, Maciel disse ver os Estados Unidos em um caminho contrário.

“Os EUA têm uma inflação de gargalo que todo mundo tem, além de um excesso de poupança, com a maior renda líquida disponível nos últimos 100 anos. Isso porque em um momento de dificuldade econômica o governo exagerou nos incentivos”, disse.

E completou: “Isso gerou um gargalo na oferta de trabalho que não é possível resolver com a política monetária. E o Fed vai ter que machucar a população até que haja uma perda de renda e volta ao mercado de trabalho, de forma a chegar em um juro real contracionista”.

Maciel disse não esperar uma recessão nos EUA, mas um juro alto levando a um “crescimento medíocre e a condições financeiras mais apertadas” por lá.

Com relação à guerra da Rússia na Ucrânia, o gestor afirmou que o maior impacto para os mercados não é o de curto prazo, de pressão nas commodities, mas o geopolítico.

“Vai ter um processo de reversão parcial da globalização e isso vai trazer um aumento da inflação e dos custos de produção no longo prazo, porque vai trocar uma mão de obra mais barata por uma ocidental, mais cara”, diz.

O contexto, contudo, tende a beneficiar a América Latina, segundo ele, em especial o México.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.