Mesmo com inflação, Argentina tem produtos mais baratos que no Brasil em dólar

Estudo compara preços na Argentina com os praticados no Brasil, no Chile e no Uruguai, o que ajuda a explicar por que tantos turistas voltaram a visitar o país vizinho

Carne molida
12 de Novembro, 2022 | 05:30 PM

Bloomberg Línea — A inflação não dá trégua na Argentina. Os aumentos de preços estão em uma espiral ascendente há meses e o Índice de Preços ao Consumidor (IPC) deverá superar os 100% neste ano, uma realidade que preocupa o governo e atinge especialmente as camadas mais vulneráveis da população.

Entretanto, para aqueles que chegam ao país com dólares, a depreciação da moeda local deixa uma ampla gama de produtos a preços mais baixos do que os encontrados no Brasil e no Uruguai. Não por acaso, o turismo em Buenos Aires e em outros destinos do país voltou a crescer entre brasileiros.

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O fato de que a inflação está correndo o poder de compra da população local a uma taxa superior a 6% ao mês gera múltiplas distorções para a economia. Uma delas é que as referências de preços acabam perdidas. Nesse contexto, um relatório recente da Quantum Finanzas, que compara os preços de varejo da Argentina com os de outros três países da região, é particularmente revelador.

Não se trata de um estudo acadêmico, mas uma amostra meramente ilustrativa sobre as distorções de preços. O objetivo não é tampouco verificar o peso de cada produto na renda média de cada população.

No caso da carne bovina, por exemplo, a diferença pode chegar a 77% levando em conta a cotação do dólar blue -- como é chamado o dólar paralelo no país. Enquanto no Brasil, o quilo da carne bovina de primeira qualidade pode sair em média a US$ 27, na Argentina custa cerca de US$ 6 (considerando o dólar blue) ou US$ 12. Os dados fazem parte do estudo da Quantum Finanzas.

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Ranking de preços: Argentina x países vizinhos

O estudo elaborado pela empresa liderada por Daniel Marx comparou os preços de produtos alimentícios básicos, higiene, vestuário, eletrônicos e combustíveis na Argentina, Brasil, Chile e Uruguai e concluiu que a Argentina tende a ser mais barata do que seus vizinhos quando a taxa de câmbio paralela (ou dólar CCL) é tomada como referência. Mas a situação pode mudar ao usar o câmbio oficial na conversão.

Como pode ser constatado no relatório, o preço dos alimentos básicos na Argentina é inferior à média desses países: 49% mais barato na taxa de câmbio oficial e 74% na taxa de câmbio paralela. O mesmo se aplica ao combustível, que é 42% mais barato na taxa de câmbio oficial e 71% mais baixo medido no dólar CCL.

Por outro lado, o preço do vestuário é 57% maior na taxa de câmbio oficial e 21% menor ao CCL. Algo semelhante acontece com o preço de eletrônicos, 65% mais alto à taxa de câmbio oficial e 16% mais baixo ao CCL.

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Comparativo

Em termos comparativos, a empresa tomou os preços de uma pequena amostra de mercadorias na Argentina com os mesmos no Brasil, no Chile e no Uruguai. E enquanto a Quantum enfatiza que “as dificuldades e limitações de uma análise deste tipo são bem conhecidas”, a empresa considera as informações fornecidas pelo estudo como “úteis” para “uma economia com importantes desequilíbrios e tensões”.

Fonte: Prensa AFIP

O resultado vem de um levantamento de preços em sites de compras online de supermercados e canais de varejo. Os preços de produtos similares são traduzidos em dólares correntes, considerando, no caso da Argentina, a taxa de câmbio oficial e a taxa de câmbio paralela (CCL).

Por fim, o relatório agrupa esses produtos de acordo com o item de consumo ao qual correspondem em alimentos básicos, higiene pessoal, vestuário, eletrônicos e combustível.

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Em suma, o estudo da Quantum mostra que os preços de alimentos básicos e combustíveis são mais baixos quando usadas ambas as taxas de câmbio, enquanto produtos de higiene pessoal, vestuário e eletrônicos mostram diferenças dependendo da taxa de câmbio utilizada.

O que é mais barato comprar em cada país

Com relação aos alimentos, pode-se ver que tanto o litro de leite quanto o quilo de carne bovina são mais baratos na Argentina, tanto à taxa de câmbio oficial quanto ao CCL. Atrás está o Chile, enquanto o Brasil e o Uruguai têm os preços mais altos.

Quanto aos produtos de higiene pessoal, a Argentina tem os preços mais baixos da região para sabonete à taxa de câmbio paralela. Mas se à taxa de câmbio oficial, os preços no Brasil são mais baixos. É também nesse ponto que se vê o preço mais baixo para papel higiênico de folha dupla. O Uruguai, entretanto, é de longe o país mais caro para estes produtos.

Para eletrônicos, a tendência não é clara. Um celular Samsung Galaxy S22 tem o preço mais baixo na Argentina ao câmbio oficial, enquanto o preço mais alto é encontrado no Brasil. Para uma TV LG de 60 polegadas com tecnologia 4K, o preço mais atrativo está no Chile, seguido de Brasil e Uruguai, e a Argentina é o país mais caro, tanto ao câmbio paralelo quanto ao câmbio oficial.

O vestuário parece ter uma tendência mais uniforme. A Argentina é o país mais caro se o preço for medido à taxa de câmbio oficial, mas é um dos mais baratos se o CCL for tomado como referência. Para uma camiseta de manga curta e um par de tênis masculino, os melhores preços estão no Brasil; para um par de calças de corrida feminina, na Argentina; e para um par de jeans de marca, o preço mais baixo está no Chile.

Por fim, o Uruguai tem o combustível mais caro. Na Argentina, por outro lado, os preços mais baixos são observados se tomarmos como referência o câmbio oficial.

-- Reportagem atualizada em 14/11/2022, às 10h12, para esclarecer que a comparação é feita em dólares, levando em conta as diferentes cotações da Argentina.

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Tomás Carrió

Tomás Carrió, jornalista especializado em economia e finanças. Trabalhou para os jornais El Cronista e La Nación e é colunista de economia da Radio Milenium. Licenciado em Comunicação Social (Universidad Austral) e Mestre em Jornalismo (Universidade Torcuato Di Tella).