Lucro da Localiza cai no 3º tri com despesas da fusão com a Unidas

Locadora teve maiores gastos com a separação e venda de ativos exigida pelo Cade para dar aval à combinação de negócios com a Unidas e garantir a concorrência no mercado

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Bloomberg Línea — A Localiza (RENT3), líder do mercado brasileiro de locação de carros, lucrou R$ 682,1 milhões no terceiro trimestre, queda de 27,6% em 12 meses. O resultado reflete, principalmente, aumento da depreciação de carros, maiores despesas financeiras com o impacto dos juros elevados em sua dívida e o pico dos gastos com a integração com a Unidas e o “carve-out” (separação de ativos e alienação).

Este é o primeiro trimestre de apresentação de resultados combinados após a fusão com a Unidas, concluída no começo do segundo semestre.

A fim de garantir as condições de concorrência nesse mercado, o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão antitruste, aprovou o negócio com a exigência de desinvestimento de determinados ativos segregados das operações de aluguel de carros (RAC, na sigla em inglês) e de veículos seminovos, em uma operação chamada de “carve-out”.

Em três meses, a Localiza diz ter estruturado uma empresa operacional com uma frota de cerca de 50 mil carros, 180 agências e 22 lojas de seminovos, sistemas e time para cumprir o “carve-out”.

“Em 1º de outubro efetivamos a venda desta empresa para a Brookfield [controladora da locadora Ouro Verde], que passa a operar a marca Unidas e recebemos, conforme acordado, o valor de R$ 3,2 bilhões, com efeito no caixa no quarto trimestre. O valor restante será pago em até 9 meses”, informou a Localiza, em material sobre o balanço.

A companhia acrescentou que, adicionalmente, apurou um ajuste de preço positivo de cerca de R$ 320 milhões, referentes à variação do capital de giro e valor de frota alienada, que serão recebidos pela companhia nos próximos 120 dias.

“Os recursos apurados com a venda do carve-out serão reinvestidos no crescimento da frota, agora em melhores condições comerciais e de mix, em um contexto de crescimento da produção de veículos e aumento da relevância das vendas diretas”, disse a companhia.

“Vendas diretas” de veículos são aquelas fechadas pelas montadoras para perfis específicos de consumidores, como taxistas, motoristas de aplicativos de mobilidade, pessoas com deficiência, companhias de aluguel de carros ou transporte escolar.

Com a disparada dos preços dos carros nos últimos anos com os gargalos do segmento de semicondutores e de logística marítima, o setor automobilístico observa a tendência de uma maior demanda por carros por assinatura, o que é positivo para empresas do segmento, como Localiza, Unidas, Movida (MOVI3) e Ouro Verde, segundo recente relatório do banco americano Goldman Sachs.

“As vendas diretas de veículos cresceram 15% na comparação anual, enquanto as vendas no varejo caíram 15%. Acreditamos que isso se deve principalmente à mudança no comportamento do consumidor, que prefere agora alugar ou compartilhar carros mais do que assumir todos os custos de uma propriedade total de um veículo no contexto de altas taxas de juros, associado com a menor disponibildade de crédito”, escreveram os analistas Bruno Amorim, João Frizo e Guilherme Costa Martins, em relatório.

O Goldman Sachs tem recomendação de compra para a ação da Localiza com preço-alvo de R$ 78,10 (12 meses). Nas últimas 52 semanas, o papel oscilou entre uma mínima de R$ 47,16 e uma máxima de R$ 74,21. Ontem, antes da divulgação do balanço no fim da noite, encerrou o pregão a R$ 65,39 (+1,66%).

Captura de sinergias

Agora a Localiza diz que todo o seu foco está voltado para o processo de integração e captura de sinergias.

“Concluímos também a integração das agências de aluguel de carros, que já operam com a marca Localiza e também estamos concluindo o processo de migração de marca na rede de seminovos. Desde o terceiro trimestre, unificamos a gestão de compra de carros e avançamos nas negociações dos termos para o próximo ano em condições favoráveis para a companhia”, afirmou a Localiza.

A companhia disse já ter iniciado estudos para avaliar a racionalização do seu portfólio de negócios, com o objetivo de “otimizar a alocação de capital e o uso de recursos”.

Ao longo do terceiro trimestre, a Localiza diz ter observado o avanço da produção de automóveis, bem como o crescimento do volume de vendas diretas.

“Nesse contexto, aceleramos de forma relevante a compra de carros, com mix mais atraente em termos de retorno esperado, e aumentando gradualmente a venda de seminovos”, informou.

Entre julho e setembro, a Localiza adicionou cerca de 54 mil veículos à frota, superando o patamar de 537 mil carros, já excluindo a frota do “carve-out” vendida para a controladora da Ouro Verde.

Rejuvenescer frota

A companhia disse ter comprado 97,9 mil carros, com um preço médio consolidado de R$ 90 mil. “A redução no preço de compra em relação ao segundo trimestre decorre da retomada da produção e entrega de carros econômicos”, detalhou.

Em aluguel de carros, a empresa diz que o maior nível de compras de carros de entrada vem permitindo não só a aceleração dos volumes de aluguel, como também o início do processo de rejuvenescimento da frota.

No terceiro trimestre, a receita líquida da divisão de aluguel de carros apresentou um crescimento de 30,7%, enquanto a divisão de gestão de frotas avançou 52,6%, totalizando uma receita líquida consolidada de aluguel de R$ 3,2 bilhões.

Em seminovos, a Localiza afirma ter priorizado a desativação de carros econômicos, que tiveram sua vida útil estendida e possuem maior quilometragem média. Foram vendidos 43,6 mil carros a um preço médio de R$ 68,4 mil, somando uma receita líquida de R$ 3 bilhões, aumento de 42,2% em 12 meses.

“O maior volume permitiu maior diluição das despesas de venda, contribuindo para a manutenção da margem Ebitda em dois dígitos”, destacou a companhia.

Reajustes

A tarifa média do trimestre foi de R$ 108,2, um aumento de 22,1% em 12 meses, refletindo, segundo a empresa, uma estratégia de aumento de exposição a segmentos com maior nível de tarifa e novos aumentos de preços.

“A taxa de utilização de 80,2% reforça a capacidade da companhia de capturar demanda em todos os segmentos, mesmo em contexto de repasse de preços e consistente adição de frota”, analisou a Localiza.

No fim de setembro, a dívida líquida da companhia somava R$ 21,2 bilhões, aumento de 30,7% (ou R$ 5 bilhões) em relação ao final de 2021, explicada pelo crescimento da frota, segundo a companhia, que diz buscar otimizar custos e prazo na gestão de sua dívida. A relação dívida líquida/Ebitda encerrou o trimestre em 2,76x.

A Localiza terminou o trimestre com R$ 7,7 bilhões em caixa. Considerando as captações de outubro, a companhia diz ter uma posição proforma de caixa de R$ 8,7 bilhões.

“A partir do quarto trimestre, reduziremos os gastos com a combinação de negócios e iremos acelerar a captura de sinergias. Além disso, a potencial redução do capex [investimentos] de renovação deverá contribuir para a retomada do crescimento sustentável, com a manuteção de níveis adequados de alavancagem”, indicou a Localiza.

Perspectivas

“A recente incorporação das ações da Unidas pela Localiza fortaleceu ainda mais a liderança da Localiza no setor de locação de veículos e frotas do Brasil. A posição da companhia é sustentada por sua agora ainda maior escala, comprovada experiência operacional, presença nacional e forte operação de venda de carros usados”, avaliou a Fitch, em relatório no começo de outubro.

A agência de classificação de risco considera que, com a operação, cresceu o poder de barganha da Localiza junto às montadoras e os ganhos relacionados a economias de escala.

“Ao final de 2022 e 2023, a frota própria da Localiza deve totalizar 524 mil (já excluindo os 49 mil veículos da carve-out imposta para a combinação dos negócios de Localiza e Unidas) e 559 mil veículos, respectivamente”, estimou a Fitch.

Segundo a agência, a alavancagem líquida consolidada da Localiza, medida por dívida líquida/EBITDA, deve ficar entre 2,5 e 3,0 vezes, ante a média da Localiza de 2,7 vezes nos últimos três anos.

“A expansão das margens de RaC [rent-a-car] e GTF (gestão de frotas], que resulta em maior retorno sobre o capital investido (ROIC) e em spread de ROIC sobre o custo da dívida em linha com o histórico da empresa, deve permitir à Localiza enfrentar as altas taxas de juros e a inflação de ativos, conciliando aumento e renovação da frota com moderada alavancagem financeira”, projetou a Fitch.

As ações da Localiza fecharam ontem (14) em alta de 1,66%, cotada a R$ 65,39. O papel acumula valorização de 23,44% no ano, enquanto o Ibovespa, principal índice de referência do mercado acionário brasileira, subiu, ontem, 0,81% e tem ganhos acumulados de 7,96% em 2022.

(Atualiza às 9h30 com comentário de analistas e da Fitch)

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