CEO do Bradesco: Vivemos uma ‘tempestade perfeita’, mas vai passar; ação desaba

Octavio de Lazari Junior prevê mais pressão da inadimplência no 4º trimestre, cogita vender carteira de crédito e espera mudança de rumo com corte de juros em 2023

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Bloomberg Línea — Uma “tempestade perfeita”. Assim o CEO do Bradesco (BBDC4), Octavio de Lazari Junior, descreveu o cenário do banco de varejo, que vive uma disparada da inadimplência, aumento de despesas, redução de margem financeira com o mercado (tesouraria) e o impacto negativo da deflação no terceiro trimestre no cálculo de seus ativos. O quarto trimestre deve, segundo o executivo, seguir desafiador, com previsão de uma possível venda de carteira de crédito e provisão adicional para cobrir o risco dos devedores.

Por volta das 15h50 desta quarta-feira (9), as ações do Bradesco desabavam mais de 15%, com mínima de R$ 15,70. As corretoras do JPMorgan, Morgan Stanley, Goldman Sachs e UBS formavam a principal força vendedora dos papéis no pregão.

No terceiro trimestre, o lucro do Bradesco caiu 22,8% para R$ 5,2 bilhões, na comparação anual, com o indicador de rentabilidade (ROE, retorno sobre patrimônio) despencando de 18,6% para 13% em 12 meses. Os analistas já esperavam que o resultado do Bradesco decepcionaria no 3º trimestre devido à seu perfil de banco de varejo, mais exposto à clientela de baixa renda, que teve seu poder de compra corroído pelos juros e inflação elevados.

“Nossa inadimplência está bem diagnosticada: os atrasos de pessoas físicas, micro e pequenas empresas aceleraram em cartões de crédito pessoal. Já reduzimos bastante a aprovação de cartões para esse público”, disse o executivo, durante teleconferência com jornalistas, na manhã desta quarta-feira (9).

A aceleração da inadimplência no varejo fez o Bradesco vendar uma carteira de crédito de R$ 5 bilhões. “Estamos com a programação de venda de uma carteira no quarto trimestre, mas ainda estamos refletindo. Já fizemos uma rodada de preços, mas há uma oferta maior de carteiras no mercado e os preços ficam mais amassados. Temos de avaliar se o preço oferecido é interessante para nós”, afirmou.

Diante desse quadro de pressão da inadimplência, que o Bradesco prevê a continuidade do problema até o primeiro semestre de 2023, o banco com sede em Osasco ficou mais seletivo em emitir cartões de crédito, e está preferindo se expor ao cliente com perfil de média e alta renda, avaliado como de menor risco, segundo ele.

Crédito

O índice de aprovação de pedidos de crédito caiu de 68% para 48% do segundo trimestre para cá. O CEO disse que o banco trabalha com a expectativa de conseguir controlar os indicadores de inadimplência neste quarto trimestre.

A provisão adicional de R$ 1 bilhão no terceiro trimestre deve se repetir no quarto trimestre. O executivo considera, no entanto, que não há risco de contágio da inadimplência para grandes empresas.

“Não vejo um horizonte de deterioração do crédito para grandes empresas, que são pouco alavancadas. Não há uma contaminação dos atrasos das pequenas empresas para as grandes. Fizemos a provisão de R$ 1 bilhão por cautela, pois a inadimplência acelerou rápido, e estamos sendo conservadores”, afirmou o CEO.

O executivo espera que o segundo semestre de 2023 melhore as perspectivas econômicas com um eventual ciclo de baixa da taxa Selic, hoje em 13,75% ao ano, mas ele lembra os desafios globais, como a prevista recessão nos EUA e na Europa.

Novo governo

Quanto ao novo governo federal, ele disse que não espera grandes surpresas em 2023, que as questões fiscais e orçamentárias do país estão bem diagnosticadas e que a equipe econômica da administração de Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, deve encontrar as melhores alternativas para acomodar os gastos extras, estimados entre R$ 150 bilhões e R$ 200 bilhões.

“A equipe econômica que virá estará sensível aos problemas do Brasil na questão fiscal, e as coisas podem ser melhores do que estamos imaginando se confirmado um cenário de corte de juros”, avaliou o CEO.

Quanto à leve queda do índice de Basileia, que oscilou para baixo 0,1 ponto percentual, para 13,6% no terceiro trimestre, na base anual, o Bradesco atribuiu a variação negativa do seu índice de solvência à mudança regulatória do Banco Central quanto ao registro de créditos tributários com hedge de ativos no exterior. Essa alteração é prevista em duas etapas (junho passado e dezembro deste ano). O Bradesco informou que ainda está acima do ínimo regulatório de 9,5% para índice de Basileia nível 1.

O CEO do Bradesco disse ainda que o banco decidiu redimensionar seus neobancos (Bitz, next e Digio) diante de um cenário de maior necessidade de disciplina financeira com o aumento da inadimplência.

Análise

O BB Investimentos reduziu a recomendação de compra para neutro para as ações do Bradesco, após a divulgação do balanço, cortando o preço-alvo de R$ 24 para o final de 2023.

“O resultado foi afetado principalmente pela forte escalada das despesas com provisões (PDD) dado o incremento da inadimplência no período, e agravado pela contribuição negativa da margem financeira com o mercado (tesouraria), com os ativos e passivos respondendo de maneira desfavorável ao ambiente de elevação dos juros”, escreveu o analista Rafael Reis, em relatório.

Ele disse que continua otimista quanto ao Bradesco dado o histórico de execução do banco, mas entende como prudente reduzir a recomendação até obter uma visibilidade de um momento mais favorável.

“O fato de o Bradesco ter revisto suas próprias projeções, incluindo um volume de despesas de provisões substancialmente maior (R$ 25,5 bi a R$ 27,5 bi no ano, ante R$ 17 bi a R$ 21 bi anteriormente) denota que a magnitude da deterioração surpreendeu até mesmo o próprio banco. O crescimento anual da carteira de crédito, que no 3º trimestre já se enocntra abaixo do piso das projeções em 13,6% e aquém do mercado, sinaliza o freio na concessão. Isso inevitavelmente reflete nas receitas de serviços, que já mostraram enfraquecimento, dado o modelo de negócios bastante dependente do crédito”, analisou Reis.

(Atualiza às 15h50 com a queda das ações)

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