Bloomberg Línea — Com a vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na eleição presidencial, investidores se questionam sobre os próximos passos do novo governo em relação à Petrobras (PETR3; PETR4), bem como possíveis mudanças na empresa e até na política de preços. Mas o que deve mudar na companhia na prática?
Em relatório divulgado na quinta-feira (3), a agência de classificação de risco Fitch Ratings chama a atenção para a preocupação dos investidores no que diz respeito ao envolvimento de Lula na Operação Lava Jato, “que investigou supostos recebimentos de propinas por executivos para firmar contratos com construtoras a preços inflacionados”.
Hoje, contudo, o cenário é outro, escrevem os analistas, com a Petrobras “fundamentalmente diferente do que era no passado”.
“A companhia se reestruturou com o pagamento de quase US$ 100 bilhões em dívidas, 25% das quais financiadas por meio de desinvestimentos de ativos não essenciais, e se posicionou para aumentar a produção a um custo inferior ao de seus pares. Alavancagem e liquidez tornaram-se compatíveis com a categoria de rating ‘A’”, escreve o time liderado por Saverio Minervini, diretor da Fitch Ratings.
Segundo a instituição, há poucos fundamentos econômicos para uma interferência na Petrobras. “A empresa deve gerar fortes fluxos de caixa, mesmo que com a expectativa de o preço do petróleo passar a US$ 55 por barril no longo prazo. O governo se beneficia de significativas receitas fiscais e dividendos da empresa, que podem chegar a quase 1% do Produto Interno Bruto (PIB)”, diz o relatório.
No documento, a Fitch Ratings escreve que o presidente eleito tem uma visão de política econômica muito diferente da do presidente Jair Bolsonaro (PL), mas que a casa não espera “grandes alterações macroeconômicas”. “Mudanças na política microeconômica são prováveis, mas devem ser graduais, em vez de uma reversão abrupta da legislação e das regras existentes”, afirma.
Nesta semana, a Petrobras divulgou seus resultados referentes ao terceiro trimestre, com queda de 15,2% em seu lucro líquido na base trimestral, para R$ 46,11 bilhões, em meio à queda do valor do barril do petróleo no mercado internacional.
Segundo comunicado da petroleira, esses fatores foram parcialmente compensados pela melhora no resultado financeiro (R$ 7,8 bilhões), refletindo a menor desvalorização do real frente ao dólar no terceiro trimestre na comparação com o segundo. A estatal também anunciou ontem a distribuição de R$ 43,7 bilhões em divididendos aos acionistas.
Direção e do Conselho da Petrobras
De acordo com os analistas da Fitch Ratings, é muito provável que Lula nomeie novos membros para o conselho de administração da Petrobras. De acordo com o estatuto da empresa, o conselho deve ser composto por 11 membros, dos quais quatro devem ser independentes, e os sete restantes, compostos pelo CEO e outros nomeados pelo governo.
“A Petrobras mostrou-se resiliente a tentativas de influência. A Fitch acredita que esse é um grande ponto de pressão para a empresa. O governo tem capacidade de implementar uma agenda em uma administração presidencial, o que pode ter consequências financeiras materiais”, diz a agência.
Minervini lembra que em 2022, Bolsonaro “tentou diversas vezes influenciar na gestão da companhia”, com algumas substituições no conselho e na diretoria executiva. Ele destaca, contudo, que a Petrobras continuou implementando suas políticas e não foi afetada, devido a sua resiliência à época, o que garantiu que continuasse lucrativa.
“Lula provavelmente não fará nenhuma mudança material imediata, a fim de acalmar os acionistas, mas o histórico do Brasil e da região mostra que estatais são utilizadas como instrumentos políticos para cumprir uma agenda mais ampla”, escreve no relatório.
Qual seria o impacto de uma mudança na política de preços?
Na avaliação de Minervini, se a cotação global do petróleo bruto seguir a premissa de preços de longo prazo da Fitch, caindo para US$ 53 por barril até 2025, haverá poucos fundamentos econômicos para influenciar a política de preços da Petrobras.
No entanto, se os preços continuarem elevados, como em 2022, a agência acredita que o governo intervirá. “O impacto na Petrobras dependerá da extensão da intervenção tanto em termos de tempo quanto de preços.”
Segundo a Fitch Ratings, a Petrobras deve manter seu forte fluxo de caixa, gerado a partir de baixos custos e de uma eficiente produção. Pela metodologia da Fitch, a empresa gerou em 2022 gerou US$ 36 bilhões em recursos das operações (FFO) ao implementar sua política de preços, sem incorrer em perdas.
“Permitir que a Petrobras mantenha suas políticas financeiras e seu plano de negócios é a melhor estratégia financeira para o governo federal, pois recebe, de acordo com o cenário-base da Fitch, US$ 22,4 bilhões da Petrobras, além de US$ 25 bilhões em dividendos referentes à participação acionária de 28,7%”, escreve Minervini.
Para o horizonte avaliado, a Fitch estima que o governo receberá, US$ 30 bilhões, entre impostos e dividendos. Isto representa 1,5% do PIB e 1,7% das receitas da União, aplicando as previsões da Fitch. Anualmente, o governo deve receber US$ 9,5 bilhões, em média, ou 0,5% do PIB e 0,6% das receitas do governo central, de 2023 a 2025.
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