Bloomberg Opinion — Elon Musk não perdeu a oportunidade de mostrar ao mundo que o novo chefe do Twitter (TWTR) chegou. Ele até colocou o cargo em sua biografia da plataforma quando entrou na sede da empresa na semana passada. Ele então fez planos para mudar radicalmente a política de verificação da rede social, e, segundo um documento divulgado nesta segunda-feira (31), Elon Musk é agora o único diretor do Twitter após a destituição de toda a diretoria.
Seu ritmo acelerado provavelmente está causando uma reviravolta para o pessoal do Twitter, que está acostumado a uma abordagem lenta de mudança. Apenas nos últimos três dias, ele analisou reformas radicais, incluindo cortes de empregos, ao mesmo tempo em que sinaliza uma abordagem caótica e confusa para melhorar a “liberdade de expressão”.
Segundo relatórios do The Verge e do Platformer, Musk quer remover os indicadores de perfil verificado dos usuários que não pagarem pelo novo serviço de assinatura Twitter Blue por até US$ 20 por mês. Nesta terça-feira (1º), Musk confirmou que a mensalidade será de US$ 8.
Isso causou consternação entre os verificados, mas até que não é uma má ideia. O modelo de assinatura do YouTube, extremamente bem-sucedido, é igualmente extorsivo: o programa é essencialmente pagar US$ 10 por mês ou receber uma avalanche de anúncios no site. Em sete anos, isso criou um negócio estimado em US$ 6 bilhões por ano. É maquiavélico e funciona.
No Twitter, receber o selo de verificado era algo gratuito, e estima-se que 300 mil contas são oficialmente verificadas. Se metade desses usuários pagarem a taxa de US$ 8, isso representa cerca de US$ 3,6 milhões em receita por trimestre, ou US$ 14,4 milhões anualmente para o Twitter. É pouco para um gigante da mídia social (a receita publicitária do segundo trimestre do Twitter foi de US$ 1,2 bilhão; a da Meta (META) foi de US$ 28,8 bilhões), mas poderia ser o início de um negócio em expansão se Musk conseguisse aproveitar sua base de clientes verificados e oferecer mais.
Mas só essa é a notícia boa. A abordagem de Musk para a supervisão do conteúdo é muito mais perturbadora. Na semana passada, ele disse aos anunciantes que estava comprando Twitter porque a civilização humana precisava de um local “em que uma ampla gama de crenças pudesse ser debatida de forma saudável”.
Mas sua definição pessoal de “debate” não é nada saudável. No domingo (31), ele promoveu uma teoria de conspiração sem fundamento sobre o recente ataque violento a Paul Pelosi, esposo da congressista americana Nancy Pelosi. “Pode haver mais nessa história”, disse Musk, em resposta a um tweet de Hillary Clinton. Poucas horas depois, seu tweet de um site (que já afirmou que Clinton estava morta e usou uma dublê durante sua campanha havia sido apagado.
Publicar acusações ultrajantes, como Musk já fez anteriormente, é um abuso da liberdade de expressão, o que fica ainda mais inquietante agora que ele vai tomar as rédeas das políticas do Twitter para moderação de conteúdo. Moderar uma plataforma de mídia social é tão desafiador que Mark Zuckerberg afastou toda a sua empresa do Facebook em direção ao metaverso e à realidade virtual. Musk está entrando na empresa em um momento em que os governos de todo o mundo, da União Europeia ao Brasil e à Índia, estão preparando regras muito mais rígidas sobre o conteúdo on-line.
A abordagem absolutista de Musk à “liberdade de expressão” contradiz completamente suas promessas de seguir as “leis da terra”, como a futura Lei de Serviços Digitais da UE, que tornará ilegal para as grandes plataformas de internet permitir a viralização da desinformação – como a que ele mesmo publicou. Essas promessas podem acabar sendo tão vazias quanto sua promessa de que um milhão de táxis autônomos da Tesla (TSLA) estariam rodando em 2020.
Não é surpresa que o Comissário da UE Thierry Breton tenha lembrado Musk de sua promessa em maio de estar “muito na mesma página” que a UE em sua próxima lei de conteúdo:
Outros tweets direcionados ao Musk são muito mais preocupantes. Comentadores na China estão agora pressionando o bilionário para remover o rótulo “mídia afiliada ao governo” que o Twitter lhes deu.
Segundo informações, há centenas de contas da mídia estatal chinesa transmitindo propaganda governista todos os dias. O que acontece quando muitos começarem a pedir que Musk remova seus rótulos para que não sejam tão facilmente identificados? O que acontece se o governo da China – uma das maiores fontes de produção e venda de veículos da Tesla – sugerir que ele pode controlar a expansão da produção da Tesla no país se o Twitter não obedecer?
Não é tão difícil ver os governos do Brasil ou da Índia (um mercado inexplorado e provavelmente lucrativo para a Tesla) fazendo exigências semelhantes sobre a regulamentação de conteúdo ao novo dono do Twitter.
Musk parece despreparado para as questões de política internacional que se aproximam, e odeia ouvir os que estão fora de sua bolha de apoiadores. Ele rapidamente demitiu o CEO, o CFO e o diretor jurídico do Twitter, deixando as equipes de toda a empresa desprovidas de liderança.
Enquanto isso, ele procurou ideias através de pesquisas no Twitter e usuários. Musk mostrou interesse em uma ideia de Amjad Masad, por exemplo, sobre a criação de um mercado para algoritmos de recomendação. “As empresas de mídia social assumiram a tarefa impossível de agradar a todos”, disse Masad, acrescentando que os sites devem seguir os princípios do mercado, permitindo que as pessoas escolham que tipo de conteúdo ver.
Essa é uma abordagem inteligente, mas potencialmente perigosa, uma vez que o histórico das redes sociais mostra que os seres humanos frequentemente gravitam em direção à raiva, toxicidade e conflito, ou seja, o conteúdo com mais engajamento.
A principal solução política de Musk até agora é pegar emprestada uma ideia do Facebook, dizendo que o Twitter teria um “conselho de moderação de conteúdo” para deliberar sobre a restauração de contas banidas (o que provavelmente incluirá uma avaliação sobre a conta de Donald Trump). O Facebook teve durante anos um conselho quase independente de 20 membros para julgar decisões difíceis de moderação, tais como o que fazer com o Trump depois de suas publicações em 6 de janeiro de 2021, sobre a invasão do Capitólio.
Mas o conselho teve pouco impacto no Facebook como um todo, lidando apenas com uma fração de todas as questões de moderação de conteúdo, nenhuma das quais conserta o mecanismo de recomendação do site que mantém os usuários viciados em conteúdo que promove a desinformação.
Musk logo saberá que o serviço mais valioso do Twitter é a própria moderação de conteúdo. Se não fosse por uma curadoria cuidadosa, o site se tornaria a “paisagem do inferno” que ele prometeu aos anunciantes que evitaria. Coordenar isso agora é um dos trabalhos mais desafiadores na tecnologia, exigindo um profundo entendimento da lei e da ética. Musk, pelo menos, mostrou certa humildade diante dessa tarefa: “falhar na busca desse objetivo, apesar de nossos melhores esforços, é uma possibilidade muito real”, disse ele aos anunciantes.Essa declaração pode ser a mais razoável que ele fez até o momento.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e cobre a área de tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “We Are Anonymous”.
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