Bolsonaro vs Lula: veja como foi o último debate na Globo antes do 2º turno

Veja quem se saiu melhor, segundo pesquisas; reajuste para o salário mínimo, corrupção, aborto e o ataque de Roberto Jefferson a policiais estiveram entre os temas discutidos

Último debate entre candidatos a presidente, na Globo, teve muitos embates e acusações e pouca discussão de propostas
29 de Outubro, 2022 | 07:54 AM

Bloomberg Línea — O último debate entre os candidatos a presidente antes do segundo turno, transmitido pela Globo na noite de sexta-feira (28), repetiu o ciclo dos anteriores: Lula (PT) e Jair Bolsonaro (PL) passaram a maior parte do debate trocando acusações ou evitando responder perguntas diretas. E deixaram as propostas para um mandato entre 2023 e 2026 em segundo plano.

Bolsonaro foi sorteado para ser o primeiro a falar e lançou uma “pegadinha”: perguntou se era verdade que a campanha do petista havia dito que ele iria reduzir o salário mínimo e acabar com o 13º salário.

Inserções da campanha de Lula na TV acusaram o presidente de reduzir o salário mínimo: o governo negou que irá fazer isso e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou ao PT tirar a propaganda no ar.

“Não vim aqui para responder ao candidato, vim para responder ao povo”, respondeu Lula. Depois, em direito de resposta, disse que Bolsonaro “veio preocupado com o programa de televisão que eu não assisto”.

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“Ele não quer dizer que o programa eleitoral do partido dele falou mentiras”, disse Bolsonaro.

Lula perguntou ao presidente porque não houve aumento real do salário mínimo desde que Bolsonaro assumiu, lembrando que quando esteve no comando do país o salário mínimo cresceu acima da inflação “em todos os anos”. Bolsonaro se defendeu falando na pandemia, que exigiu aumento expressivo de gastos públicos e provocou uma crise econômica no país.

O presidente prometeu que pela primeira vez elevaria o salário mínimo acima da inflação em janeiro do ano que vem. Disse que passaria a ser de R$ 1.400. Na proposta de Orçamento da União de 2023 enviada pelo governo ao Congresso em agosto, no entanto, o valor previsto é de R$ 1.302.

Já Lula disse que vai fazer isso e atrelar o aumento também ao crescimento do PIB - sem dar mais detalhes. O petista também voltou a prometer que vai isentar de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5 mil.

Quem ganhou?

Pelo monitoramento feito por institutos de pesquisa durante o debate, o ex-presidente Lula parece ter se saído melhor.

Líder nas pesquisas, Lula apresentou algumas propostas presentes na carta que apresentou à sociedade nesta semana

De acordo com levantamento da Quaest nas redes sociais, Lula teve 51% de comentários positivos e 49%, de negativos. Já Bolsonaro teve 64% de menções negativas e 36% de menções positivas.

O instituto AtlasIntel monitorou o debate por meio de uma pesquisa qualitativa. Ouviu 100 pessoas, entre eleitores de Simone Tebet (MDB) e Ciro Gomes (PDT) no primeiro turno e indecisos.

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Para eles, Lula ganhou o debate. No primeiro bloco, que costuma concentrar maior audiência, 39,7% dos entrevistados disseram que o petista ganhou, enquanto 23,5% preferiram Bolsonaro.

Já nos demais blocos, o petista foi vencedor por maior margem. Lula foi o vencedor do segundo bloco para 53,8% dos pesquisados. No terceiro, foi escolhido vencedor por 57,1%. E no quarto e último bloco, o ex-presidente se saiu melhor para 51,5% dos eleitores ouvidos pelo Atlas.

O instituto informa e esclarece que esses dados não são uma pesquisa eleitoral e “não servem como estimativas precisas sobre a opinião da população”. “O objetivo é indicar uma tendência e informar análises, sem ambição de representar perfeitamente a população.”

Novo formato e estratégias dos candidatos

O debate seguiu o formato que começou a ser adotado pela Band, em que há dois blocos com 15 minutos para cada candidato com tema livre e dois blocos em que um faz perguntas ao outro, de acordo com temas sorteados. Na Globo, no entanto, não houve perguntas de jornalistas.

E o primeiro bloco foi o que deu o tom do resto do debate: Bolsonaro adotou um tom agressivo e fez acusações enquanto tentou se defender de acusações contra seu governo, e Lula tentou evitar cair em provocações.

Ficou claro que Lula tentou trazer as propostas que resumiu em sua carta “Para o Brasil de amanhã”, divulgada na quinta-feira (27), e comparar seus governos com o de Bolsonaro.

E o presidente foi ao debate para tentar desestabilizar o petista, segundo análise. Em diversos momentos, Bolsonaro disse a Lula “pare de mentir” e chamou o ex-presidente de “rei da mentira”. Em outro, pediu para Lula se aproximar dele e chamou o ex-presidente de “Luiz Inácio”.

“A impressão que eu tenho é que estou debatendo com um cidadão estranho à política brasileira”, disse Lula, em outro momento.

Provocações

Em outro momento, Bolsonaro chamou Lula de “abortista convicto” e o acusou de “defender a droga” e a “ideologia de gênero”. Era uma resposta ao petista, que perguntou se era verdade que o presidente havia defendido a distribuição de pílulas de aborto como política de controle de natalidade - ele disse isso em 2002, quando era deputado federal.

Candidato à reeleição e em segundo lugar nas pesquisas, Bolsonaro procurou desestabilizar Lula quando teve a palavra

O ex-deputado federal e ex-presidente do PTB Roberto Jefferson também foi assunto no debate. Ele foi preso nesta semana depois de disparar pelo menos 20 tiros de fuzil e jogar duas granadas contra policiais federais que foram à sua casa no estado do Rio de Janeiro cumprir um mandado de revogação de sua prisão domiciliar, expedido pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, depois de ofensas à ministra Carmen Lúcia.

Jefferson é um defensor de Bolsonaro e chegou a oferecer seu partido ao presidente para ele se candidatar à reeleição. E Lula acusou o presidente de tentar escondê-lo na campanha para se descolar da repercussão negativa do episódio, ao que Bolsonaro retrucou chamando o petista de “bandido”.

Lula também mencionou a compra de Viagra, um remédio para disfunção erétil, pelas Forças Armadas. Bolsonaro disse que o medicamento tinha outras finalidades e seria usado para tratar câncer de próstata. “Então por que só o Exército tem direito?”, questionou Lula.

Acusações de corrupção

Bolsonaro também evitou falar diretamente de política. Concentrou-se em acusar Lula de corrupção. Disse, por exemplo, que Lula “não levou água para o Nordeste, levou dinheiro para o seu bolso”. E também acusou os governos petistas de “financiar ditaduras”, em referência ao financiamento do BNDES para a construção do Porto de Mariel, em Cuba.

Lula, então, citou reportagem do Valor Econômico segundo a qual o governo brasileiro gastou R$ 10 bilhões e faturou R$ 12 bilhões com o porto. “Ele [Bolsonaro] tem que explicar por que isolou o Brasil do mundo”, disse. “O que você vai fazer para reinserir o Brasil no mundo? Ou [o país] vai continuar isolado pior do que Cuba? Ninguém quer conversar com você”, questionou, em outro momento, o ex-presidente.

Bolsonaro procurou explorar pontos fracos do petista ao dizer que seu governo recebeu “sérios problemas éticos, morais e econômicos, em grande parte herdados do governo do PT”. E disse que Lula foi “descondenado” das ações da Operação Lava Jato por ter “um amigo lá no STF”.

As condenações de Lula foram anuladas pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, que, por maioria de votos, decidiu primeiro que a Justiça Federal em Curitiba não era competente para julgar os casos; e, depois, que houve um conluio entre Sergio Moro e os procuradores da Lava Jato para condenar Lula, o que tornou o ex-juiz suspeito para os processos.

Lula procurou culpar Bolsonaro pela volta da fome no país - 33 milhões de brasileiros estão nessa situação, segundo estudo da Rede Penssan. Bolsonaro duvidou do dado e disse que quem estivesse “passando dificuldade” poderia se cadastrar para receber o Auxílio Brasil, porque o Brasil estaria mais próspero em seu governo.

“Prosperidade para quem? Talvez para a família Bolsonaro”, questionou Lula. E mencionou a compra de imóveis com dinheiro vivo pelo presidente e seus parentes no passado e a suspeita de prática de rachadinha, em que assessores de parlamentares devolvem parte do salário a quem ocupa o cargo principal.

-- Atualizada às 9h20 com correção dos dados do levantamento da Quaest.

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Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.