Bloomberg Línea — O ex-presidente Lula (PT) divulgou nesta tarde de quinta-feira (27), a três dias do segundo turno, uma carta com um resumo de suas propostas de campanha e na qual se compromete com uma “política fiscal responsável”, com foco no social.
A carta é divulgada depois de Lula ter sido alvo de questionamentos por mais informações sobre seu programa de governo, incluindo por parte do seu adversário, o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Logo após a divulgação do documento, por volta das 16h40, ativos brasileiros sofreram valorização, ainda que uma parte dos ganhos tenha sido devolvida mais tarde. O Ibovespa chegou a se aproximar dos 116.000 pontos, antes de fechar aos 114.640,76 pontos, com alta no pregão de 1,66%.
O ETF EWZ, fundo passivo negociado em bolsa cuja carteira tem empresas brasileiras que representam cerca de 85% da bolsa brasileira, fechou com alta de 3,03%, negociado a US$ 31,63. Houve um pico no desempenho do ativo também por volta das 16h40, mas depois devolveu parte dos ganhos.
‘Previsibilidade para investidores’
“A reconstrução do Brasil exige uma gestão pública competente, responsável, aberta ao diálogo e com a mais ampla participação da sociedade. Exige uma gestão da economia com credibilidade, responsabilidade e previsibilidade”, afirma o documento.
O documento remete indiretamente à Carta aos Brasileiros publicada pelo PT durante a campanha eleitoral de 2002, em que Lula se comprometeu com responsabilidade fiscal e disse que respeitaria os contratos assinados, diante dos temores de investidores e empresários de que ele pudesse passar por cima dessas questões.
Mas Lula já declarou em entrevistas que, como já foi presidente por dois mandatos (de 2003 a 2010), não precisaria, em sua avaliação, convencer mais ninguém da seriedade de suas propostas.
Na carta desta quinta, o petista procura responder a quem vem exigindo do candidato um detalhamento das propostas, especialmente na área econômica, e até a indicação de nomes.
“É possível combinar responsabilidade fiscal, responsabilidade social e desenvolvimento sustentável – e é isso que vamos fazer, seguindo as tendências das principais economias do mundo”, diz o documento.
“A política fiscal responsável deve seguir regras claras e realistas, com compromissos plurianuais, compatíveis com o enfrentamento da emergência social que vivemos e com a necessidade de reativar o investimento público e privado para arrancar o país da estagnação.”
Lula não fala em nomes para um eventual governo no documento. Mas diz que “as primeiras medidas de nosso governo serão para resgatar da fome 33 milhões de pessoas e resgatar da pobreza mais de 100 milhões de brasileiros e brasileiras”. “Temos consciência da nossa responsabilidade.”
O ex-presidente também demonstrou estar aberto a políticas não tão identificadas com a esquerda e com o PT, já que incorporou ao seu programa sugestões da senadora Simone Tebet (MDB), terceira colocada no primeiro turno da corrida presidencial. Na carta, Lula citou a proposta de acabar com as filas na saúde.
Defesa da democracia
A carta tem tom de defesa da democracia - chega a falar em “reconstrução do Brasil” - e acusa o presidente Jair Bolsonaro (PL) de ameaçar as instituições brasileiras.
Lula não cita nenhum episódio específico, mas, nas últimas semanas, representantes do governo têm dado declarações que colocam em dúvida a lisura do resultado das eleições.
Na segunda-feira (24), o ministro das Comunicações, Fábio Faria, e o ex-secretário de Comunicação do governo Fábio Wajngarten apontaram que rádios no Nordeste, região em que Lula é o favorito por ampla margem, estariam veiculando menos inserções da campanha de Bolsonaro.
O presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, extinguiu o processo: disse que não foram apresentadas provas nem indícios que deem respaldo à acusação.
Algumas rádios, por sua vez, disseram que foi o PL, partido de Bolsonaro, que teria deixado de enviar o material a ser veiculado. Além disso, conforme resolução do TSE, a fiscalização do horário eleitoral gratuito está a cargo das campanhas, e não o tribunal.
No mesmo despacho, Moraes enviou os autos do processo para a Procuradoria-Geral Eleitoral para investigar o suposto uso indevido dos recursos do fundo partidário e disse que a “denúncia” feita dias antes pelo governo era uma tentativa de tumultuar as eleições.
Poucas semanas antes, logo depois do primeiro turno, o governo também tentou desacreditar os institutos de pesquisa, diante de diversas discrepâncias entre as intenções de voto apontadas pelas pesquisas eleitorais e o desempenho de Bolsonaro e de outros candidatos de direita entre o eleitorado.
O ministro da Justiça, Anderson Torres, mandou a Polícia Federal abrir um inquérito para investigar a suposta divulgação de pesquisas falsas - o que é crime eleitoral -, e o presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Alexandre Cordeiro, determinou a investigação de suposta formação de cartel no setor.
O objetivo alegado era defender a tese de que os institutos teriam formado um cartel para divulgar pesquisas falsas que mostravam Lula como favorito e prejudicar Bolsonaro. Mas o TSE também arquivou essas investigações, já que cabe ao tribunal, e não ao governo, fiscalizar as pesquisas eleitorais.
“O Brasil não pode estar submetido a um governante que agride sistematicamente o STF e o TSE e já ameaçou fechar o Congresso. Um governo que nega a transparência, o acesso público à informação e desestruturou os mecanismos de controle e combate à corrupção. Nossa democracia é fruto de décadas de luta, de mulheres e homens, pela nossa liberdade e pelos nossos direitos”, diz a carta de Lula.
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