Lula corre para recuperar apoio no estado de SP às vésperas do 2º turno

Campanha do ex-presidente prioriza grandes cidades e amplia presença do ex-governador Geraldo Alckmin para reduzir desvantagem local para Bolsonaro

Lula em campanha em São Bernardo do Campo, seu berço político na região metropolitana de São Paulo (Nelson Almeida/AFP/Getty Images)
Por Simone Preissler Iglesias
18 de Outubro, 2022 | 10:02 AM

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Bloomberg — O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou às suas raízes industriais em São Bernardo do Campo (SP) para recomeçar a corrida pela presidência do Brasil.

Ele escolheu a cidade da Grande São Paulo para um rali que deu o pontapé inicial na campanha para o segundo turno. Conhecido como o berço do movimento operário e sindicalista brasileiro, São Bernardo foi a cidade em que ele emergiu como força política nos anos 1970, fundando o sindicato dos metalúrgicos, organizando greves e liderando marchas em defesa dos trabalhadores.

“Esta é a rua onde tradicionalmente fazemos nossas manifestações, desde a fundação do Partido dos Trabalhadores”, disse o ex-presidente por duas vezes a apoiadores no último dia 6 de outubro. “Estamos em casa aqui em São Bernardo do Campo.”

Lula ganhou a votação na cidade de cerca de 900 mil habitantes no primeiro turno. Mas ele inesperadamente perdeu no Estado de São Paulo em geral para Jair Bolsonaro por quase sete pontos percentuais, uma derrota que fez a equipe do petista lutar para reforçar o apoio antes do segundo turno de 30 de outubro.

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Dentro da campanha de Lula, o resultado no estado mais populoso do Brasil – berço de sua carreira política e que abriga cerca de 25% de todo o eleitorado do país – foi comparado a um acidente de avião, em que uma confluência de pequenos fatores leva à catástrofe. Na primeira reunião pós-primeiro turno de sua equipe, a conversa foi de frustração e fracasso.

Edinho Silva, coordenador de campanha do ex-presidente, pode ter tido uma ideia do que estava por vir, dizendo em entrevista na véspera da votação que São Paulo havia se tornado um centro de apoio à política de direita de Bolsonaro.

“Temos uma parcela da sociedade brasileira que, infelizmente, é racista, homofóbica, machista, xenófoba e não aceita a ascensão social das classes mais baixas”, disse. “E uma parte significativa do Brasil que pensa assim mora em São Paulo.”

O próprio Lula saiu do chão de fábrica para se tornar um sindicalista em São Bernardo, então sinônimo da indústria automobilística. Seu apoio continua forte: venceu por mais de 10 pontos percentuais na cidade.

Mas, assim como as fábricas de automóveis de sua juventude se foram, o fracasso de Lula em tomar um estado que ele dominou – e que representa cerca de um terço da economia do Brasil – reflete uma nova realidade na qual Bolsonaro conquistou uma posição significativa no cenário político.

Mesmo que as pesquisas apontem que Lula continua tendo vantagem sobre o atual presidente em todo o país, o tipo de política profundamente arraigada em São Paulo representará o maior desafio para quem sair vencedor.

‘São Paulo é o estado da meritocracia’

Conhecida há muito tempo como a Detroit do Brasil, São Bernardo está tentando se reinventar, mas não tem sido fácil. Muitos ex-funcionários de fábricas de automóveis estão desempregados ou trabalhando no comércio local, em pequenas lojas ou na economia informal.

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“Queremos ter o direito de trabalhar, estudar, tomar café da manhã, almoçar todos os dias”, disse Lula no comício de São Bernardo.

Esse tipo de mensagem ainda ressoa em ambientes urbanos: Lula conquistou mais votos do que Bolsonaro na capital paulista, 47,5% a 38%, mas o atual presidente teve uma vantagem de mais de 20 pontos percentuais no interior. A cidade de São Paulo tem cerca de 9 milhões de eleitores, e há 25 milhões no interior.

“São Paulo é o estado da meritocracia, da livre iniciativa e do empreendedorismo”, disse Ricardo Salles, aliado de Bolsonaro e ex-ministro do Meio Ambiente que foi eleito majoritariamente para o Congresso pelo estado. “O interior de São Paulo, em particular, também tem uma forte crença na defesa da família tradicional. Todos esses pontos são representados pela direita liberal conservadora.”

Bolsonaro teve um desempenho notável há quatro anos, recebendo cerca de 68% dos votos do estado em uma eleição que ocorreu no contexto do escândalo de corrupção da Operação Lava Jato, que levou Lula à prisão.

O ex-presidente foi posteriormente libertado e sua sentença anulada, o que permitiu que ele pudesse concorrer novamente. O resultado no início deste mês mostrou que os brasileiros não esqueceram – e que o apelo de Bolsonaro é mais duradouro que o pensamento.

O candidato de Lula a governador do estado, Fernando Haddad, não ajudou na causa. Todas as pesquisas mostraram Haddad à frente, mas a escolha de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas, venceu por cerca de 7 pontos percentuais. A corrida para o governo também foi para o segundo turno.

Marcha pelas grandes cidades

A equipe de Lula respondeu ao revés do primeiro turno lançando uma operação para sitiar as cidades mais importantes de São Paulo com comícios e marchas. Nos dias seguintes à parada da campanha em São Bernardo, Lula visitou Guarulhos, sede do maior aeroporto do Brasil, e Campinas, uma das maiores cidades do interior. Lula perdeu para Bolsonaro nos dois lugares.

“Vamos dar a volta por cima e vencer em São Paulo”, disse Haddad a centenas de apoiadores de Lula na segunda-feira (17) em mais um comício, no bairro de São Mateus, um dos mais populosos da capital paulista.

Enquanto isso, o companheiro de chapa de Lula, Geraldo Alckmin, viaja pelo interior de São Paulo. Conservador, Alckmin governou o estado por três mandatos e, em 2006, quando concorreu à presidência sem sucesso contra Lula, registrou o melhor desempenho de qualquer candidato.

Alckmin pouco explorado

Para Denilde Holzhacker, professora de ciência política da ESPM, em São Paulo, a campanha de Lula errou ao não fazer mais uso de Alckmin antes do primeiro turno. O foco era explicar a aliança à base do petista, em vez de tentar conquistar eleitores da oposição, disse ela, quando “a lógica deveria ter sido inversa: explicar aos eleitores conservadores por que Alckmin decidiu se aliar a Lula .”

Ao mesmo tempo em que tenta aumentar o apelo de seu próprio candidato, a equipe de Lula está trabalhando para aumentar a rejeição popular a Bolsonaro. É uma estratégia baseada na premissa de que brasileiros polarizados escolherão a opção menos ruim no final.

Apesar dos esforços da campanha, as previsões para o segundo turno dentro da equipe de Lula não são otimistas, e a principal estratégia para os últimos dias é a limitação de danos. Ninguém tem a ilusão de que Lula pode vencer Bolsonaro no estado de São Paulo.

Para Guilherme Boulos, aliado de Lula e deputado mais votado no estado de São Paulo, a campanha do ex-presidente precisa se conectar com eleitores que escolheram outros candidatos no primeiro turno, bem como com aqueles que se abstiveram ou anularam.

“Teremos que conversar com esses eleitores de forma humilde e democrática”, disse.

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