Bloomberg Opinion — Antes, os jornais eram primordiais para os ideólogos ricos. Agora, as plataformas de mídia social estão se tornando um trunfo para os poderosos que querem direcionar uma visão para a liberdade de expressão, principalmente se já foram prejudicados pelas regras de sites mais estabelecidos. Kanye West foi a personalidade mais recente a adquirir uma plataforma, defendendo o “direito de se expressar livremente”.
O músico e magnata da moda também conhecido como Ye concordou em comprar o Parler, um fórum relativamente pequeno que se autodenomina uma alternativa de liberdade de expressão ao Twitter, de acordo com um anúncio da empresa na segunda-feira (17). O Parler é uma rede social de direita que a Apple (AAPL) e o Google (GOOGL) temporariamente baniram de suas lojas de aplicativos após relatos de que ela foi usada para planejar a invasão do Capitólio dos Estados Unidos em 6 de janeiro de 2021.
“Em um mundo em que as opiniões conservadoras são consideradas controversas, temos que ter o direito de nos expressar livremente”, disse Ye em um comunicado à imprensa anunciando o acordo. Há cerca de uma semana, o rapper foi suspenso do Twitter e do Instagram por causa de publicações antissemitas.
Ele entrou para um rol de plutocratas - pessoas que defendem uma sociedade governada ou controlada por pessoas de grande riqueza ou renda - voláteis que desejam ter seu próprio espaço de liberdade de expressão no qual usuários podem expor pontos de vista extremistas, teorias da conspiração e muito mais. Elon Musk quer repaginar o Twitter (TWTR), e Donald Trump – que também foi banido do Twitter e do Facebook por incitar a violência – construiu a plataforma Truth Social.
Mas nada é simples no que diz respeito a esses acordos.
Para começar, não sabemos quanto Ye pagou pelo Parler ou se ele conseguiu reunir o capital necessário para uma aquisição. A Parlement Technologies, proprietária da Parler, disse na segunda-feira (17) que havia “entrado em um acordo em princípio” com Ye e não divulgou os termos financeiros. Nem a empresa nem Ye responderam a perguntas sobre o acordo.
A aquisição do Twitter por Musk também não foi fechada, e o financiamento da Truth Social através de uma Spac criada para abrir o capital da plataforma por cerca de US$ 1 bilhão também foi prejudicado por atrasos.
Se os três negócios forem fechados, a internet poderá entrar em um território inexplorado com três plataformas controladas por bilionários caprichosos e uma celebridade excêntrica. Mas talvez não. Essa evolução não é tão incomum quando se considera que há mais de um século a mídia tradicional é dirigida por poderosos – e por vezes alguns insólitos.
Henry Ford, por exemplo, foi proprietário do famoso jornal semanal Dearborn Independent de 1919 a 1927, o qual usou para promover pontos de vista antissemitas, com artigos afirmando que uma vasta conspiração judaica estava infectando os Estados Unidos e que os judeus estavam inclinados a corromper o mundo através de guerras e do mercado de ações. O jornal tinha tiragem de cerca de 500 mil unidades e era distribuído em todos os EUA através da rede de concessionárias de automóveis da Ford.
No Reino Unido, os irmãos aristocráticos Alfred e Harold Harmsworth iniciaram o jornal Daily Mail em 1896 para torcer publicamente pelo imperialismo britânico, bem como pela ascensão do fascismo na Europa e na Alemanha na década de 1930.
Embora os proprietários das mídias sociais de hoje estejam focando na liberdade de expressão, eles podem eventualmente refletir seus antecessores do século XX, divulgando uma agenda em suas plataformas. Não será tão simples quanto imprimir um editorial de impacto em um jornal, mas ainda é possível exercer influência com uma mensagem diretamente de seus perfis ou de seus apoiadores.
Para Trump, esse objetivo provavelmente é se eleger novamente, enquanto para Musk isso pode significar promover suas próprias empresas via Twitter. As declarações grosseiras e bizarras de Kanye sobre minorias estão por toda parte, portanto não está claro quais ideias ele pode tentar promover através do Parler. O site tem cerca de 16 milhões de usuários registrados, segundo um porta-voz da Parler. Na Truth Social, Donald Trump tem pouco mais de 4 milhões de seguidores.
Os números são baixos quando comparados com o Twitter, que tem mais de 230 milhões de usuários ativos, e do Facebook, que tem quase 3 bilhões. Mas esses proprietários ricos ainda podem causar problemas, principalmente se permitirem que teorias da conspiração floresçam. Isso causaria um tremendo prejuízo.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Parmy Olson é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre tecnologia. Já escreveu para o Wall Street Journal e a Forbes e é autora de “We Are Anonymous.”
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