Economia do luxo: gigantes do setor avançam mesmo em cenário de recessão

Consumidores americanos e chineses costumam sustentar faturamento de empresas de produtos de luxo, mas situação pode mudar

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Bloomberg Opinion — “O mercado de luxo não representa a economia geral”, disse Jean-Jacques Guiony, CFO da LVMH, nesta terça-feira (11). Ele está certo. Se você olhasse os números do terceiro trimestre da LVMH, poderia até achar que o mundo não está enfrentando turbulência geopolítica, inflação em alta e mercados acionários em queda.

A gigante do luxo relatou aumento de 19% nas vendas, excluindo fusões e aquisições e movimentos monetários, no trimestre encerrado em 30 de setembro. A receita orgânica proveniente da moda e dos artigos de couro aumentou 22%. Ambos os resultados superaram as expectativas dos analistas.

Os investidores ainda devem continuar cautelosos. Já era um fato que o terceiro trimestre seria um sucesso, com restrições de viagem flexibilizadas e muitos americanos voltando à Europa para tirar o máximo proveito de um dólar mais forte. E agora a LVMH estabeleceu uma alta meta para a próxima temporada de divulgação de resultados – em um momento em que os riscos estão aumentando até mesmo para os gigantes do setor.

Embora a Europa tenha brilhado, os mais importantes motores da demanda por artigos de luxo são os consumidores americanos e chineses. E há incertezas consideráveis em torno de ambos.

Os grandes consumidores americanos são mais vulneráveis a choques do que à desaceleração do crescimento econômico, portanto, as recentes oscilações da bolsa são preocupantes. A demanda dos clientes norte-americanos estava “mais ou menos” em linha com o segundo trimestre, disse a LVMH. Mas vale a pena observar uma desaceleração na Tiffany. A empresa disse que a fraqueza no ramo da prata se devia a um ambiente inflacionário no qual clientes preferem ouro. Mas também é possível que alguns consumidores do mercado de luxo estejam sendo mais cuidadosos com seus orçamentos.

As vendas da LVMH aos clientes chineses do continente foram estáveis em meio às restrições da covid-19. Isso é uma melhoria em relação ao segundo trimestre, mas está bem longe de ser uma recuperação. A demanda no país continua afetada pelos lockdowns e por um panorama econômico cada vez mais sombrio. Mesmo enquanto a vida volta ao normal, após dois anos de oscilação entre lockdowns e liberdade, não há garantia de que os consumidores gastarão com o mesmo prazer de quando a China reabriu após a primeira onda de covid em 2020.

Uma carta na manga é o turismo. O dólar forte pode ser um vento favorável para mais gastos de americanos à medida que as viagens para a Europa continuam no quarto trimestre. Qualquer afrouxamento significativo das restrições na China poderia levar a mais turismo de chineses na Europa – e a gastos mais luxuosos em Paris ou Milão – embora isso ainda pareça estar distante.

Neste cenário, a LVMH parece estar melhor posicionada entre as empresas de luxo. Além de ser a maior, tem um balanço patrimonial sólido que está rumo a uma posição de caixa líquido no início de 2024, de acordo com a Bloomberg Intelligence. Isso lhe dá o poder de investir em marketing à medida que outras empresas economizam e possivelmente fazer aquisições. A empresa bem diversificada com seus ramos de bebidas e beleza e possui duas das marcas de maior sucesso da indústria, Louis Vuitton e Christian Dior.

Se os consumidores de luxo economizarem – digamos, ao comprar uma bolsa de mão por ano em vez de duas – eles provavelmente preferirão marcas mais imponentes. E poderão até gastar mais em menos compras. A LVMH e sua concorrente Hermès devem se beneficiar disso.

A maior preocupação será as empresas menores. A exceção é a Prada. A empresa está gozando de um reavivamento causado pela geração Z, que está consumindo seus chapéus e mocassins. Se a italiana conseguir traduzir isso em vendas lucrativas de bolsas, ela poderá ter uma boa surpresa.

O cenário macroeconômico é mais desafiador para a Kering, que está administrando a transição da Gucci de uma marca clássica para uma mais moderna. O conglomerado de luxo deve se beneficiar da força de suas outras marcas, como Yves Saint Laurent e Balenciaga, mas reorientar sua maior marca durante uma retração será um trabalho árduo.

A Burberry também está no meio de uma reviravolta e vulnerabilidade. Dito isto, se o novo designer Daniel Lee puder criar os tipos de bolsas e sapatos de sucesso que ele criava na Bottega Veneta – marca da Kering – a Burberry pode conseguir navegar pelas águas agitadas que se aproximam.

As ações das fabricantes de produtos de luxo subiram na quarta-feira (12), após movimentação tímida nas últimas semanas, mesmo com o desempenho extraordinário da LVMH, que parece otimista considerando os perigos enfrentados pelas empresas de luxo.

“Todos estão falando sobre a recessão, mas ninguém a viu”, disse Guiony, da LVMH, Se e quando ela chegar, a gigante deverá ser a empresa mais resistente. Mas se a economia do luxo for na direção errada, nem ela sairá ilesa.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Andrea Felsted é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre os setores de varejo e bens de consumo. Anteriormente, escrevia para o Financial Times.

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