O que Beyoncé tem a ver com a cultura do trabalho no século 21

Trabalhadores se sentem traídos por promessas de prosperidade, segurança, status e bem-estar, e Beyoncé conseguiu traduzir isso como ninguém

Um grito de guerra para trabalhadores que rejeitam antigas restrições em novos tempos
Por Bloomberg News - Julia Hobsbawm
15 de Outubro, 2022 | 10:16 AM

Bloomberg — “A cultura – não importa o quão definida – é singularmente persistente.” A frase é de Peter Drucker, considerado o pai da administração moderna. De fato, é. E isso é um problema, já que a cultura de insatisfação no ambiente de trabalho insiste em ficar cada vez mais evidente.

E os dados têm mostrado isso de várias formas, como a queda do bem-estar dos funcionários, por exemplo. Dados da Deloitte mostram que cerca de um terço dos funcionários e executivos lutam contra quadros de fadiga e problemas de saúde mental. Citando os dados mais recentes sobre o local de trabalho da Gallup, o Fórum Econômico Mundial observou que “o bem-estar e a satisfação no local de trabalho se estabilizaram após quase uma década de melhorias”.

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Mas nem tudo pode ser atribuído à pandemia. Em maio de 2019, antes que o coronavírus se espalhasse pelo mundo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou o burnout “um fenômeno ocupacional”. De fato, a preocupação com o trabalho não é algo de hoje e sempre esteve ligada à cultura: foi Aristóteles, afinal, quem se preocupou com o que seria necessário para criar uma sensação de florescimento ou eudemonia, ou o alcance da felicidade como finalidade moral.

Agora que os CEOs de todo o mundo estão tentando manter ou reinventar a cultura corporativa e a estratégia para o futuro depois que a pandemia reescreveu as regras de trabalho, é na cultura pop que os líderes devem buscar respostas para conquistar os corações e mentes de seus funcionários – especificamente a música pop.

Veja o hit do ano: “Break My Soul”, de Beyoncé. É um grito de guerra para trabalhadores que rejeitam antigas restrições em novos tempos. Não à toa, a música faz parte de um álbum intitulado “Renaissance”, seu último lançamento e rico em informações sobre a cultura pop contemporânea.

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“Break My Soul” não é a voz da geração inocente do passado, quando a cultura do trabalho foi infantilizada e o poder estava concentrado estritamente acima das bases. A reclamação também não é a mesma da Geração X, que clamava por melhores condições de trabalho e pagamento.

Em vez disso, Beyoncé está falando com os millenials e seus colegas mais jovens da Geração Z, que são o futuro do trabalho e cuja alfabetização emocional expressa seu ressentimento e decepção pelo fato de o mundo do trabalho, mesmo que bem pago, não oferecer o suficiente.

As gerações mais novas se sentem traídas por promessas quebradas de prosperidade, segurança, status e bem-estar. “Eu trabalhei para curar traumas geracionais e transformei meu coração partido em arte que ajudaria a impulsionar a cultura e espero viver muito além de mim”, disse Beyoncé à revista Harper’s Bazaar no ano passado.

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Exatamente 100 anos antes do hino de 2022 de Beyoncé ao mal-estar geracional existencial, o poema modernista de TS Eliot, The Waste Land, também fazia menções ao trabalho. Eliot escreve sobre a “hora violeta, a hora da noite que se dirige para casa” – e ainda assim avança mais: ao eu interior. Escrito no rescaldo da Primeira Guerra Mundial, The Waste Land é o equivalente cultural de uma música pop que retratava a época.

A força de trabalho global de hoje se sente igualmente quebrada, fragmentada e desconcertada como se fosse uma guerra. O coronavírus deixou seus rastros e cicatrizes que abriram caminho para um novo recomeço.

E os líderes precisam fazer duas coisas fundamentais para entrar no caminho certo. A primeira é reconhecer a sensação de perda e de dor.

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Todo local de trabalho precisa se reconstruir e se redesenhar. Nada é igual a antes. É preciso insistir em uma cultura corporativa que priorize conforto, segurança e certeza em um mundo incerto. Isso não significa fornecer um conjunto rígido de regras, mas sim uma abordagem flexível, sempre que possível, para responder à complexidade de suas vidas.

Não existe um manual pronto para isso. É preciso pensar novas regras, novas normas e abandonar abordagem verticalizada.

Para fazer isso é preciso ouvir. Não diga, pergunte. Gaste tanto na avaliação de funcionários quanto em entender o que os clientes pensam. Vá além dos formulários on-line e inicie sessões de feedback presenciais e por teleconferência constantes. Eles valerão cada dólar gasto.

A cultura não compete com a estratégia - ela a complementa. Mas tem que ser autêntico. Vamos parar de tentar tornar o local de trabalho ingenuamente otimista (Disney) e, em vez disso, ouvir a voz da sabedoria (Beyoncé).

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