O ex-Credit Suisse que tirou um ano sabático e criou uma edtech com 7 mil alunos

Em seis anos, a Ada se tornou uma das maiores escolas de programação do país e forma profissionais para empresas como Itaú, Google e Safra

Educação com foco em empregabilidade depois de carreira no mercado financeiro
15 de Outubro, 2022 | 07:39 AM

Bloomberg Línea — Tornar-se empreendedor não é uma decisão financeira, diz a máxima sobre quem decide lançar o próprio negócio. E é assim que Felipe Paiva, de 36 anos, descreve sua decisão há alguns anos de mão de uma carreira no Credit Suisse, um dos maiores bancos de investimentos do mundo, para empreender. “O tempo vai passando e você começa a se contestar: é isso o que eu quero para a minha vida?”, disse.

Paiva é CEO e fundador da Let’s Code, uma empresa de ensino de programação que foi rebatizada recentemente de Ada em homenagem a Ada Lovelace, a primeira programadora de computadores da história. A edtech, que começou em 2016 com quatro funcionários em uma casa em São Paulo, é hoje uma das empresas de tecnologia com sede no coração financeiro de São Paulo, a Faria Lima.

Com de 200 funcionários, a Let’s Code/Ada formou mais de 7 mil alunos desde a fundação e é responsável por formar e capacitar profissionais de grandes empresas do setor financeiro e de outros segmentos, como Bradesco (BBDC4), Itaú (ITUB4) Google (GOOG), Safra, Santander (SANB11), Nubank (NU), Banco do Brasil (B3SA3), Suzano (SUZB3), Raia Drogasil (RADL3), entre outras.

Engenheiro formado pela Escola Politécnica da USP (Universidade de São Paulo), Paiva conta que tanto a passagem pelo Credit Suisse quanto o ano sabático que tirou ao sair do banco foram fundamentais para “afinar o rumo” do que seria a Ada e de seu trabalho como empreendedor.

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“Fiz uma viagem sozinho de sete meses, por 12 países, sem destino. Comecei no Japão e terminei na Amazônia, fazendo um curso de sobrevivência na selva. Isso me preparou para lidar com incerteza, a falta de rota, e me ensinou a celebrar as pequenas vitórias”, conta Paiva à Bloomberg Línea.

De volta ao Brasil e, depois de estudar os mercados em que poderia começar a empreender, duas áreas lhe pareceram proeminentes ainda em 2016: saúde e educação. Paiva optou pela segunda, diante da percepção de que existia uma gap crescente nesse mercado.

“A educação é um dos itens básicos da sociedade, mas estava parada no tempo, não dialogava com a tecnologia. Eu sempre tive uma inquietação diante do tema, algo estruturalmente fraco no Brasil”, diz.

O surgimento da empresa coincidiu com uma fase de crescimento do mercado de edtech no Brasil. De acordo com levantamento da Abstartups (Associação Brasileira de Startups), o Brasil tem 566 empresas de tecnologia nesse segmento. As edtechs representam o maior grupo de startups no país (17,3%).

Recentemente, edtechs têm sido alvo de aquisição por grandes grupos de educação do país. Um exemplo é da Arco Educação, dona das redes de ensino COC, Dom Bosco e Ari de Sá, que comprou no início do outubro 75,1% do capital da Isaac, startup que desenvolve uma plataforma de soluções financeiras voltada para educação. O negócio avaliou a Isaac em US$ 150 milhões.

Modelo de negócio

A Let’s Code foi idealizada por Paiva, ao lado dos sócios Omar Pavel e Guto Ramos - ambos tiveram suas participações adquiridas por ele em 2018 - e teve um investimento inicial de apenas R$ 100 mil. A empresa nasceu sob um modelo de negócio B2C, focada no consumidor final, mas acabou migrando para o modelo B2B, ou business-to-business, com foco em atender diretamente as empresas.

A transformação, segundo Paiva, ajudou a estruturar a máquina de vendas e a focar recursos no desenvolvimento do produto. “No B2B, a venda é muito mais racional e muito menos emocional. Para eu ter os clientes que tenho hoje diante do meu tempo de mercado, tenho que entregar um bom produto.”

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Com foco nos produtos que ele divide entre “software” e “experiência pedagógica”, Paiva afirma que o investimento em marketing da empresa atualmente é de “praticamente zero”. Ao todo, a Ada atende aproximadamente 150 alunos por empresa anualmente. Cada contrato varia de R$ 700 mil a R$ 1 milhão.

Mas firmar o modelo B2B também possibilitou alavancar o programa de bolsas da Ada, hoje com quase 50 mil inscritos, segundo Paiva. O programa é realizado em parceria com empresas, como a Americanas e o Credit Suisse. A edtech fica responsável por mediar o processo seletivo dos alunos, formá-los como desenvolvedores ou especialistas em dados, e empregá-los nas empresas parceiras.

“Com isso, nos especializamos em ser uma ferramenta de recrutamento e de retenção de talento, e que ainda cumpre o propósito de educação e de empregabilidade”, explica o ex-Credit.

Focar recursos também tem sido fundamental para o processo de expansão e internacionalização da escola de programação, que agora se prepara para migrar para o ensino em inglês e espanhol, demanda que surgiu entre os novos contratos fechados pela edtech.

Os programas de formação têm uma média de 6 meses de duração, todos gratuitos para o cliente pessoa física e com foco em empregabilidade - o que, para Paiva, as faculdades ainda deixam a desejar. Ao todo, são 3 mil alunos ativos e uma meta de expandir para 20 mil até 2025.

“O crescimento da empresa ocorre concomitantemente com o meu crescimento. Pra ter uma grande empresa, eu também preciso me tornar uma pessoa melhor”, diz.

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Melina Flynn

Melina Flynn é jornalista naturalizada brasileira, estudou Artes Cênicas e Comunicação Social, e passou por veículos como G1, RBS TV e TC, plataforma de inteligência de mercado, onde se especializou em política e economia, e hoje coordena a operação multimídia da Bloomberg Linea no Brasil.