Por que o mercado já aposta em corte de juro no Brasil em março de 2023

Fatores como desaquecimento da economia e eleição mais apertada levam parte do mercado a antecipar projeções para a redução das taxas no próximo ano

Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central: objetivo de trazer a inflação de volta para a meta pode ser facilitada com uma política fiscal mais equilibrada
Por Maria Eloisa Capurro e Josue Leonel
13 de Outubro, 2022 | 08:59 AM

Bloomberg — Traders brasileiros apostam que um dos bancos centrais mais hawkish do mundo mudará de rumo e cortará as taxas de juros já em março de 2023, à medida que a economia esfria e as expectativas de inflação caem.

Alguns investidores também veem a eleição mais apertada do que o esperado como fator positivo para uma política fiscal mais apertada, o que também tornaria mais fácil para o Banco Central iniciar uma fase de flexibilização monetária.

O Brasil foi a primeira grande economia das Américas a começar a retirar seus estímulos monetários após a pandemia, ainda no começo de 2021, e aumentou as taxas de juros de forma muito mais agressiva do que seus pares. A taxa de juros reais do país é a mais alta por uma ampla margem entre mais de 50 bancos centrais monitorado pela Bloomberg, o que ajuda a controlar os preços ao consumidor.

  

À medida que as perspectivas de inflação têm alívio, o BC pode julgar em breve que pode se dar ao luxo de tornar a política menos restritiva para evitar uma desaceleração muito acentuada da economia.

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Traders esperam que o BC corte sua taxa básica em cerca de 2,75 pontos percentuais ao longo do próximo ano, começando com um corte de 0,25 ponto percentual em março. Isso é acima dos cerca de 2,5 pontos percentuais que eram esperados em agosto deste ano.

O presidente do BC, Roberto Campos Neto, disse no mês passado que um corte da Selic a partir de junho estaria alinhado com os planos de trazer a inflação de volta para a meta. Mas alguns investidores esperam que uma inflação que esfrie rapidamente possa levar ele e seus colegas a agir antes disso.

“Temos uma tendência muito clara de queda da inflação e uma probabilidade crescente de recessão global no próximo ano”, disse Gustavo Pessoa, sócio da gestora de ativos Legacy Capital, em São Paulo, em entrevista por telefone.

As taxas de juros nominal e real do Brasil são “uma enormidade” para os padrões globais, disse Pessoa, que prevê um primeiro corte de juros em março de 2023.

Efeito no PIB pode ser menor em 2023

A inflação anual desacelerou para 7,2% em setembro, ante mais de 12% em abril. As expectativas de inflação do mercado para 2022 caíram por 15 semanas consecutivas, também ajudadas por cortes pré-eleitorais nos impostos sobre combustíveis.

O crescimento do PIB deve reduzir de magnitude no próximo ano, refletindo a desaceleração global e os custos de empréstimos mais altos.

Ainda assim, a expectativa de taxas mais baixas pode ajudar a conter a desaceleração da economia no próximo ano, segundo Solange Srour, economista-chefe do Credit Suisse para o Brasil.

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“Se o mercado estiver precificando um corte de juros significativamente agressivo no início de 2023, veremos uma flexibilização das condições financeiras”, disse Srour em entrevista. “A desaceleração da economia pela qual estamos esperando pode não acontecer ou ser de magnitude menor do que pensamos.”

Eleição apertada

O presidente Jair Bolsonaro se saiu melhor do que as pesquisas previam no primeiro turno da eleição presidencial e agora enfrenta Luiz Inácio Lula da Silva no segundo turno.

Embora Lula continue sendo apontado como favorito, alguns traders calculam que o resultado apertado do primeiro turno pode levá-lo a buscar eleitores centristas e possivelmente atenuar algumas de suas propostas. Isso seria um bom presságio para as finanças públicas do Brasil, possivelmente reduzindo a necessidade de uma política monetária apertada para compensar uma política fiscal frouxa.

“Uma eventual diminuição na incerteza fiscal criaria um ambiente mais favorável para o Banco Central aliviar sua política monetária”, disse Daniel Popovich, gestor de portfólio no Brasil da Franklin Templeton, em entrevista.

A eleição também deu aos aliados de Bolsonaro uma posição forte no Congresso, o que poderia limitar a capacidade de um eventual governo Lula de aumentar o endividamento do governo.

Se o novo governo não enviar os sinais certos em termos de responsabilidade fiscal, o Banco Central “não se sentirá confortável” em iniciar um ciclo de cortes de juros, disse Pessoa, da Legacy Capital.

O BC elevou sua taxa básica para 13,75% ao ano, ante um patamar de 2% no início do ciclo de aperto monetário, nos 18 meses até agosto. Isso ajudou a tornar o real a melhor moeda após o rublo russo entre as principais divisas deste ano. O real avançou 7%, enquanto a maioria de outras moedas se enfraqueceu.

O banco prevê que a inflação desacelere para 4,6% no próximo ano e para 2,8% em 2024. A meta de inflação do Brasil é de 3,5% neste ano, caindo gradualmente para até 3% em 2024.

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