Bloomberg — O bilionário fundador da Bridgewater Associates, Ray Dalio, anunciou nesta terça-feira (4) que abriu mão do controle da empresa, o maior fundo hedge do mundo, e confiou seu futuro e US$ 150 bilhões sob gestão em ativos a uma geração de líderes mais jovens.
Em 30 de setembro, ele transferiu todos os seus direitos de voto para o conselho de administração da companhia, deixando sua posição de um entre os três co-diretores de investimentos (CIO) da Bridgewater.
“Ray não tem mais a palavra final”, disse o co-presidente executivo Nir Bar Dea, em entrevista. “Isso é uma grande mudança.”
O movimento também é visto como um marco histórico para os mercados americanos e globais. Enquanto alguns de seus colegas converteram as empresas que fundaram em family offices ou gestoras fechadas, Dalio estava determinado a criar algo que durasse mais que ele.
Dalio iniciou um plano de transição em 2010, imaginando que poderia levar apenas dois anos para concluí-lo. A busca por sucessores, contudo, não foi tão fácil quanto se imaginava. Mas agora que essas pessoas já foram escolhidas, entregar o controle é o passo final e irreversível.
“Essa foi a progressão natural dos eventos; assim que estávamos prontos, fomos em frente”, disse Dalio, 73 anos, que manterá sua cadeira no conselho com um novo título: fundador e mentor do CIO. “Eu não queria ter que ficar até morrer.”
O momento também é favorável. Depois de enfrentar dificuldades para interpretar os mercados durante os primeiros meses da pandemia, a Bridgewater vem apresentando melhora na performance.
Seu principal fundo, o Pure Alpha, avançou 34,6% neste ano até 30 de setembro. Outro fundo, o “All Weather”, com uma abordagem projetada para oferecer retornos mais estáveis em quaisquer ambientes da economia, no entanto, perdeu 27,2% no mesmo período.
“Meritocracia de Ideias”
Dalio era um ex-trader e corretor de commodities quando fundou a Bridgewater em seu apartamento de dois quartos em Nova York, em 1975. Graças ao desempenho de destaque nos anos 2000, a empresa acumulou dezenas de bilhões de dólares em ativos e conquistou muitas das maiores instituições como clientes.
A Bridgewater, com sede em Westport, Connecticut, também se tornou tão notória por sigilo que atraiu comparações com uma espécie de “culto”.
O lugar certamente era incomum. Dalio queria criar uma “meritocracia de ideias” e acreditava que a melhor maneira de alcançá-la era por meio de “veracidade radical e transparência radical”. O desacordo aberto foi encorajado, os funcionários eram avaliados em atributos como credibilidade, e as reuniões, gravadas.
Quando Dalio decidiu, há mais de uma década, colocar em prática a sucessão da Bridgewater, “eu estava apenas administrando as coisas”, lembrou ele. “Não tínhamos um conselho nem mesmo uma ideia de como estabelecer uma boa governança.”
Um grande desafio
O projeto de sucessão, contudo, provou ser muito mais difícil do que ele esperava. Na década seguinte, sete pessoas diferentes, em diversos momentos, detinham o título de único ou co-CEO.
Apenas no ano passado os novos níveis de liderança e governança da Bridgewater finalmente se uniram. Em dezembro, a empresa revelou a composição de seu conselho. E em janeiro, quando David McCormick renunciou para concorrer à uma cadeira no Senado dos Estados Unidos, nomeou Bar Dea e Mark Bertolini para sucedê-lo como co-CEOs.
“Foi um desafio ao longo do caminho porque Ray tinha opiniões fortes sobre como as coisas deveriam ser”, disse Greg Jensen, que ingressou na Bridgewater como estagiário em 1996, atuou como CEO no início de 2010 e agora é co-CIO com Bob Prince.
Em um fundo hedge, que seria o equivalente aos multimercados no Brasil, o desempenho ruim geralmente é o catalisador da mudança. Enquanto rivais como Brevan Howard Asset Management e Rokos Capital Management tiveram ganhos recordes em 2020, o fundo Pure Alpha da Bridgewater perdeu quase 13%. O resultado ficou no topo dos retornos comparativamente ruins na década de 2010.
Sinais de mudança
Para uma empresa tão confiante de que havia cultivado os melhores talentos de investimento, os resultados foram um choque. Na exaustiva revisão e análise que se seguiram, a Bridgewater percebeu que vários de seus métodos estavam restringindo a criatividade e a colaboração, em vez de trazer à tona as melhores ideias, de acordo com Jensen.
“O objetivo é fazer com que as pessoas falem o que pensam”, disse ele. “Algumas dessas ferramentas funcionaram para revelar a verdade, e outras, não.”
Como resultado, as avaliações, por exemplo, deixaram de tentam capturar e prever todas as características e qualidades de um funcionário. O foco agora é mais estreito e prático, explicou Jensen.
Ele também deu a entender que mais mudanças estão por vir. Agora que o controle está com o conselho, a Bridgewater provavelmente investirá mais agressivamente em tecnologia e em pessoas – mesmo que Dalio se oponha a isso, disse ele.
Filantropia e mentoria
Durante a entrevista, Dalio projetou uma aura de contentamento e transmitiu uma sensação de alívio.
A sucessão significa que ele pode dedicar mais tempo à filantropia e a transmitir as lições que aprendeu como estudante de economia ao longo da vida. Ele disse que não tem planos de vender sua participação minoritária na Bridgewater e espera orientar os investidores da empresa nos próximos anos.
Movimentos de sucessão não têm sido fáceis em Wall Street. Na Blackstone, a maior gestora de ativos alternativos do mundo, Steve Schwarzman, de 75 anos, continua como presidente e CEO.
Na KKR, Henry Kravis, 78anos, e George Roberts, 79, ainda são co-presidentes. E no Carlyle Group, o cofundador Bill Conway, de 73 anos, recentemente voltou ao cargo de CEO interino quando a empresa demitiu Kewsong Lee, de 57 anos.
Se Dalio sente falta de ser o chefe, ele não deixa transparecer.
“É a coisa mais linda de se ver”, disse ele. “A Bridgewater é minha família estendida, e agora minha família está bem sem mim. É uma alegria. Eles são fortes.”
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