Bloomberg Opinion — Mesmo dependendo do crescimento econômico, ainda há muito sobre ele que não compreendemos. O crescimento espetacular trouxe impactos extremamente positivos – vidas mais longas e saudáveis, milhões tirados da pobreza, miríades de inovações que melhoram a vida. Contudo, esses benefícios vêm com alto custo, incluindo poluição, degradação da terra, perda de biodiversidade e aquecimento global.
Alguns cientistas ambientais argumentam que esses impactos ambientais significam que o crescimento econômico agora está desestabilizando a sociedade. Os economistas tendem a rebater que a única forma de manter a sociedade estável é manter as economias em crescimento.
Como fui treinado como cientista, não é surpresa que eu seja meio cético quanto à possibilidade de crescimento infinito em um planeta finito. Fiquei perplexo com o motivo pelo qual os economistas acham os argumentos econômicos padrão do crescimento tão atraentes, ao mesmo tempo em que rejeitam as preocupações sobre os limites físicos do crescimento.
No entanto, há algumas semanas, encontrei a primeira explicação realmente convincente do porquê da perspectiva dos economistas ter sido tão persuasiva. Eu estava em uma palestra do ilustre economista Partha Dasgupta, da Universidade de Cambridge. Ele afirmou que é difícil avaliar o apelo dessas ideias para os economistas sem entender o contexto histórico de seu surgimento – durante o pós-guerra, quando as inovações tecnológicas em áreas como medicina, agricultura e química fizeram tanto para gerar prosperidade global.
Mesmo assim, a própria teoria do crescimento, segundo Dasgupta, contém sérias falhas que transviaram a economia moderna de formas importantes, resultando em uma busca contínua pelo crescimento que está reduzindo ativamente a riqueza geral do planeta. A questão levantada por Dasgupta, a qual ele posteriormente respondeu, é: como a teoria econômica chegou a um ponto em que nem sequer considera o mundo natural como parte importante de nossa riqueza econômica?
Uma antiga teoria de crescimento, proposta pelo economista Robert Solow em 1948, sustentava que o crescimento no longo prazo depende de fatores básicos, incluindo o crescimento populacional, a poupança e o investimento, e a taxa de desenvolvimento tecnológico. Teorias de crescimento posteriores seguiram este plano, enfatizando a inovação tecnológica – nossa capacidade de continuamente encontrar novas maneiras de utilizar os recursos de forma mais produtiva – como o verdadeiro motor do crescimento econômico.
Dasgupta apontou para esta profunda fé na inovação como o motivo pelo qual os economistas dos anos 70 rejeitaram as sugestões dos cientistas naturais de que poderia haver limites naturais para o crescimento. Esses cientistas sugeriram que a expansão humana da atividade econômica acabaria ficando grande demais para que o planeta pudesse conter com segurança e que nossas atividades poderiam minar muito do valor produzido pelo mundo natural. Os economistas descartaram estas preocupações, acreditando que a inovação sempre permitiria ao ser humano encontrar um meio de contornar esses problemas.
Talvez não intencionalmente, mas por meio de algumas pressuposições, os primeiros teóricos do crescimento estipularam que a natureza não tem um papel importante no apoio ao crescimento econômico. Na teoria padrão, a inovação humana entra na fórmula de crescimento como uma construção puramente humana, não dependente de uma gama enorme de coisas valiosas que o meio ambiente nos proporciona, como ar e água limpos, um clima estável e abundantes reservatórios de biomatéria complexa. Como resultado, a inovação e o crescimento são sempre possíveis, mesmo que o mundo natural seja severamente degradado.
Na verdade, isso parece uma ignorância atualmente, em um momento em que a ciência da ecologia foi bem desenvolvida e temos décadas de evidências mostrando os custos naturais das atividades humanas. Mas não tínhamos esse conhecimento quando a teoria do crescimento foi desenvolvida. A área da ecologia mal existia. “Na fase inicial”, disse Dasgupta em entrevista, “não acredito que tenha sido uma ideia ultrajante deixar a natureza de fora da modelagem econômica”.
Mas, argumenta ele, é certamente ultrajante continuar assim hoje, e ele deu passos importantes para mostrar como os economistas podem incluir a inovação nas teorias de crescimento de forma que reconheça sua profunda dependência do meio ambiente natural. O principal problema é que os economistas de hoje, quando falam de crescimento, quase sempre estão falando sobre o crescimento do PIB, que não registra a depreciação do capital natural que ocorre durante a produção de bens e serviços. O que Dasgupta tem tentado fazer em seu trabalho é incluir a natureza na economia.
Neste ponto, sua palestra entrou na matemática detalhada da teoria do crescimento, que eu não vou aprofundar aqui. Mas, resumindo, ele mostrou como pequenas mudanças na fórmula deixariam claro que nossa capacidade humana de inovar depende sempre de um estoque de produtos e serviços fornecidos pelo meio ambiente. Como resultado, o esgotamento desse estoque também esgotaria nossa capacidade de continuar inovando.
“Se uma família consome mais que sua renda”, segundo Dasgupta, " ela pode financiar o excesso ao utilizar o patrimônio – vender ações, usar as economias e outros. Mas não pode fazer isso para sempre sem falir. Esse é o problema que a humanidade enfrenta hoje, e por isso devemos passar a falar da riqueza inclusiva das nações e da economia global, não do PIB”.
Dasgupta mostrou precisamente, dentro da ortodoxia econômica, onde os teóricos do crescimento podem levar a sério as objeções dos cientistas ambientais e, assim, construir uma teoria mais realista e útil. A teoria revisada ainda considera o crescimento econômico enormemente positivo, mas prevê o crescimento não como crescimento do PIB, mas um crescimento muito mais inclusivo, que deve preservar o valor do mundo natural para que a prosperidade continue.
As teorias bem sucedidas de uma era muitas vezes ficam tão arraigadas que limitam a capacidade dos cientistas do futuro de pensar claramente. Mas hoje, há todos os motivos para levar a sério os limites das preocupações com o crescimento: Um estudo das Nações Unidas de 2018 descobriu que o capital natural do mundo diminuiu quase 40% entre 1992 e 2014. Parece que estamos consumindo o estoque de riqueza natural do qual dependemos.
Ouvi a palestra de Dasgupta no Centro Internacional de Física Teórica em Trieste, na Itália, em uma reunião convocada pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos. Foi algo incomum no sentido de reunir economistas, físicos, ecologistas, demógrafos e líderes empresariais para quebrar algumas das barreiras intelectuais ao progresso real da sustentabilidade. Mais eventos como este são extremamente necessários.
A inovação tecnológica pode não ser suficiente para nos livrar desta confusão. Para isso, precisaremos de certa inovação também em nosso pensamento econômico.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Mark Buchanan é físico e autor científico. Escreveu o livro “Forecast: What Physics, Meteorology and the Natural Sciences Can Teach Us About Economics.”
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