Investidor está de olho em novo Congresso para se posicionar, diz gestora

Werner Roger, da Trígono Capital, que teve o fundo de ação com maior retorno em 3 anos, diz que composição do Legislativo vai indicar medidas possíveis a partir de 2023

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Bloomberg Línea — Após o resultado do primeiro turno das eleições neste domingo (2), investidores vão analisar a composição do novo Congresso Nacional em busca de pistas sobre o grau de dificuldades que o próximo presidente da República enfrentará para aprovar mudanças constitucionais a partir de 2023. A avaliação é do gestor e sócio cofundador da Trígono Capital, Werner Roger, em entrevista à Bloomberg Línea.

O gestor trabalha com a expectativa de crescimento da bancada ruralista e vê risco de perda de espaço das forças de esquerda no Parlamento, mesmo com uma possível vitória do ex-presidente Lula.

“Quem governa o Brasil é o Congresso, não o presidente. O futuro presidente terá de negociar com o Centrão ou não conseguirá aprovar nada por falta de maioria de votos. Não espero que o Congresso mude muito nesta eleição. A bancada ruralista vai crescer, sem sombra de dúvida”, disse Roger.

“O Centrão é organizado e vai, no mínimo, manter sua atual posição. Não acredito que a esquerda tenha um peso grande e eleja muitos nomes, pois perdeu prefeitos e governadores”, analisou o gestor, em referência ao bloco partidário de sustentação política do atual governo federal.

A Trígono Capital tem R$ 2,3 bilhões sob gestão e emplacou três fundos de ações (principalmente de small e micro caps) no ranking Top 5 dos maiores retornos de 2021, segundo dados da consultoria Economatica.

Outro levantamento, da Quantum Finance, apontou que o Trígono Delphos Income teve a melhor performance em uma janela de julho de 2019 a julho de 2022 entre mais de 200 fundos de ações que atenderam aos critérios (em negociação há mais de três anos e dispor de mais de 1.500 cotistas), com rentabilidade acumulada de 140% no período.

Para Roger, o presidente Jair Bolsonaro (PL), que tenta a reeleição enfrentando o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), líder das pesquisas de intenção de voto, tentou governar no começo da gestão sem o apoio do Centrão, mas teve suas ações limitadas no Congresso.

“Se o vencedor for o Lula, ele terá de compor com outros partidos ou terá dificuldades para governar, para aprovar propostas constitucionais, renovar medidas provisórias. O problema é que a bancada do agronegócio não quer conversa com o Lula. Se ele não superar esse ranço, não conseguirá fazer nenhuma reforma, pois para aprovar qualquer mudança na Constituição precisa de 2/3 dos votos dos parlamentares”, afirmou o sócio da Trígono Capital.

Segundo Roger, os investidores buscam saber como será a atuação do novo governo federal sobre questões fiscais e orçamentárias a partir de 2023.

“Caso o Lula vença, ele não vai fazer nada que desaponte o mercado. Pelo contrário. Ele vai ter um discurso favorável ao agronegócio, vai apoiar setores como a construção civil e a indústria automobilística, como fez no passado. Seria de novo a versão Lula paz e amor”, diz o gestor da Trígono Capital.

Recessão e juros

Ele cita ainda os desafios macroeconômicos do novo governo federal, como os alertas de recessão global e de ciclo de alta de juros nos EUA e na Europa. Para Roger, o Banco Central já deveria ter iniciado o corte da taxa Selic, mantida em 13,75% ao ano na reunião do Copom (Comitê de Política Monetária) de setembro.

“Não temos uma inflação de demanda, mas de oferta. É preciso aumentar a produção, e não os juros, para a inflação cair”, defendeu o gestor.

Roger considera que os investidores estrangeiros podem aumentar suas posições no mercado brasileiro de ações quando as previsões de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) melhorarem com a perspectiva de corte de juros no curto prazo.

“O PIB atrai capital estrangeiro. Se o PIB do Brasil crescer realmente mais que o da China, o efeito disso é aumentar o fluxo de capital para nossas empresas abertas. PIB maior, juro menor, custo de capital mais barato, isso favorece muito nosso mercado”, afirma.

Dólar

O gestor diz que uma das estratégias da Trígono é alocar recursos em empresas exportadoras que se beneficiam com a alta do dólar, descoladas do risco Brasil.

“Isso não significa que torcemos que o dólar suba para R$ 5,50. Se o dólar cair para R$ 4,50, isso significa que a inflação vai cair, pois o dólar mais barato vai puxar o preço do diesel para baixo, vai ter queda dos juros, mais apetite para risco e maior fluxo de recursos para nosso mercado. Aí posso mudar minha posição em determinado ativo”, exemplifica.

A sinalização do corte de juros pode, segundo ele, estimular o investidor de reduzir posição em aplicações de renda fixa e voltar a reforçar posições no mercado de renda variável. “Os investidores institucionais estão pouco expostos à renda variável. No fim do ano, os comitês dessas instituições vão olhar para 2023 e podem reservar mais dinheiro para a Bolsa”.

Alerta para inadimplência

Roger diz estar preocupado com o aumento da inadimplência e o impacto negativo no setor financeiro.

“Trabalhei como diretor de crédito durante nove anos em dois bancos estrangeiros [Citi e Chase]. O que estou vendo é que as provisões divulgadas pelos bancos nacionais estão muito maleáveis. Não sei se são suficientes. Não acredito nas provisões dos bancos, que estão menos conservadores do que deveriam ser. Tudo para apresentar ao mercado um ROE [retorno sobre patrimônio, indicador de rentabilidade] de 20%”, afirma o sócio da Trígono.

Ele acrescenta que algumas instituições bancárias sabem que os devedores estão sem capacidade de honrar seus compromissos, mas evitam lançar provisões.

“Eu desconfio de algumas carteiras de crédito. Se o cliente pega um empréstimo de 90 dias e fica rolando a dívida, o banco já sabe que ele não tem capacidade de pagar. Muitas fintechs vão ter problemas”, diz o gestor.

Outra crítica de Roger é a concessão de crédito pelo braço financeiro de grupos varejistas. “Quando o varejo trabalha como financeira e não tem expertise, há um risco imenso de quebrar. O varejo vai pagar caro por isso, pois empresta, dá a corda para o cliente se enforcar. Ele não paga o carnê, não vai mais na loja e faz propaganda negativa da loja que cobra a dívida”, analisa.

Na sua avaliação, a inadimplência no Brasil só não está em nível mais elevado devido ao pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600, que tem sido usado pelos beneficiários do programa governamental para quitar débitos com produtos financeiros como cartão de crédito e cheque especial.

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