Quem se saiu melhor, Bolsonaro ou Lula? Veja como foi o debate na Globo

Programa teve maior audiência desde 2006 e foi marcado por bate-boca entre os candidatos que lideram as pesquisas de intenção de voto, com poucas propostas de ambos

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Bloomberg Línea — O último debate entre os candidatos a presidente, realizado na noite da quinta-feira (29) pela TV Globo, teve o mesmo tom agressivo do primeiro, transmitido pela Band. O ex-presidente Lula (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL), primeiro e segundo colocados nas pesquisas de intenção de voto, protagonizaram confrontos entre si, mas também sofreram ataques dos demais candidatos.

Foram apresentadas poucas propostas de governo, a maioria delas já conhecidas dos eleitores nesta reta final das eleições. A campanha terminou oficialmente à meia-noite da quinta, embora o debate, que durou mais de três horas, tenha entrado pela madrugada da sexta-feira (30).

Bolsonaro não fez nenhuma pergunta direta a Lula, o que foi entendido por analistas como forma de evitar dar espaço para o ex-presidente falar. Mesmo assim, o primeiro bloco foi marcado por ofensas pessoais entre os dois, o que também gerou direitos de resposta em série concedidos pela Globo a ambos.

O presidente chamou o petista de ex-presidiário algumas vezes, disse que ele era “chefe de uma quadrilha” e citou a corrupção das administrações petistas em diversas oportunidades. Já Lula retrucou e chamou Bolsonaro de mentiroso e disse que ele não tinha postura presidencial. “Quando vier ao microfone, você se comporte como presidente da República, não minta descaradamente”, disse o ex-presidente.

A audiência e a reação na internet

O debate começou às 22h30 e durou 3h20, acabando perto das 2h da madrugada desta sexta. Ele alcançou a maior audiência para um debate às vésperas do primeiro turno desde 2006, segundo informações da Folha de S. Paulo citando dados da Kantar Ibope Media obtidos pelo TV Pop. Em dado momento, metade das televisões ligadas no país estavam sintonizadas na Globo para o programa com os candidatos.

O debate teve grande repercussão, segundo levantamento feito pela Quaest. Foram 204 milhões de menções ao evento na internet, contando Twitter, Facebook, Instagram e blogs.

Os mais citados foram Lula e Bolsonaro, quase empatados, com 40% e 39% das menções, respectivamente. Depois deles, Ciro (12%), Kelmon (5%), Tebet (2%) e Soraya (1%).

Em menções positivas, no entanto, a liderança coube a Ciro Gomes: 49,2% das citações de seu nome foram favoráveis, pouco à frente de Bolsonaro, com 49% dos casos. Tebet teve 45,2% de menções positivas e Lula ficou logo atrás, com 43,5%.

Bolsonaro e Lula no alvo

A estratégia adotada pelos candidatos que estão atrás nas pesquisas foi a de questionar Lula e Bolsonaro na maioria de suas perguntas, o que foi interpretado por analistas como uma suposta maneira de se mostrar dispostos a negociar alianças em um eventual segundo turno e, futuramente, em um governo.

Um exemplo: Bolsonaro disse que Soraya Thronicke (União Brasil) o criticava porque ele negou a ela cargos em seu governo. A senadora respondeu que ele havia traído o Capitão Renan Contar, candidato ao governo de Mato Grosso do Sul pelo União Brasil, que o apoia nas eleições deste ano. Bolsonaro respondeu pedindo votos em Contar, apesar de ter negociado apoio ao candidato Eduardo Riedel, do PSDB, em um acordo costurado pela candidata ao Senado Tereza Cristina, ex-ministra da Agricultura.

Em outro momento, Soraya disse que pediu três cargos a Bolsonaro, conseguiu dois, mas ambos os indicados teriam deixado os postos por “não aceitarem a rachadinha” - a prática de devolver ao parlamentar parte do salário dos assessores. O presidente não contestou a fala e a senadora não deu mais informações.

Simone Tebet (PMDB) procurou fazer perguntas a Lula sempre que possível, no que foi visto como um movimento de fazer com que o petista falasse de suas propostas - ele retribuiu o gesto algumas vezes. Integrantes da campanha petista acreditam que a intenção da senadora é costurar algum acordo político com Lula no segundo turno, o que os integrantes da campanha dela negam.

O petista, no entanto, pouco falou de propostas concretas e focou em elogiar o desempenho econômico de seus governos de 2003 a 2010, em estratégia que tem adotado na campanha em contraponto ao quadro atual, com a inflação no maior nível em duas décadas e perda do poder de compra da população.

Quando acusado de corrupção, disse que os escândalos que aconteceram só puderam ser identificados porque ele permitiu que houvesse mecanismos de se investigar, processar e julgar.

Tebet criticou Bolsonaro citando a “incompetência na gestão da pandemia” e o orçamento secreto, modalidade de destinação de dinheiro do Orçamento da União a estados e municípios por parlamentares em que eles não são obrigados a se identificar como autores dos pedidos de envio.

O presidente voltou a dizer que não tem “qualquer ascendência sobre o orçamento secreto” e que vetou a proposta quando ela foi aprovada pelo Congresso. O governo, na verdade, vetou a primeira versão do orçamento secreto e depois, em dezembro de 2019, enviou ao Congresso um projeto com o mesmo teor, assinado por ele e com uma exposição de motivos a favor do mecanismo assinada pelo general Luiz Eduardo Ramos, na época ministro da Secretaria de Governo.

Em relação à pandemia, Bolsonaro foi criticado pelo fato de o governo federal não ter agido para fechar acordos de fornecimento de vacina em 2020 e respondeu que “nenhum país do mundo comprou vacinas em 2020″. Em dezembro de 2020, no entanto, pelo menos 50 países já haviam iniciado as vacinações contra covid-19, como Estados Unidos, Reino Unido, Canadá, países da União Europeia e o Chile.

Os demais candidatos

Simone Tebet (MDB) voltou a falar em pagar R$ 5 mil a todos os alunos que terminarem o ensino médio, mas acrescentou, em entrevista à jornalista Renata Lo Prete, da Globo, ao final do debate, que financiaria esse programa por meio da gestão de tributos da União, em valores de até R$ 370 bilhões.

Soraya Thronicke (União Brasil) voltou a falar em reforma tributária e a defender sua ideia de “imposto único”, defendida por seu candidato a vice, o ex-deputado federal Marcos Cintra (União Brasil).

Ciro Gomes (PDT) citou o seu Plano Nacional de Desenvolvimento, que usa como programa de governo, e voltou a citar a sua proposta defendida desde a campanha de 2018 de tirar endividados da situação de inadimplência. Segundo ele, 63 milhões de brasileiros “saíram do crediário para o SPC” durante governos anteriores. Também prometeu criar cinco milhões de empregos em dois anos.

Luiz Felipe Dávila (Novo) voltou a defender a tese do Estado mínimo e a privatização de estatais. “Entre 2020 e 2021, as estatais federais consumiram R$ 160 bilhões, dinheiro que tinha que estar na saúde.”

Mas parte da atenção recaiu sobre o então desconhecido candidato Padre Kelmon (PTB) e sua postura de interromper respostas de outros candidatos, em especial de Lula.

Em uma ocasião, Lula respondeu os ataques de Kelmon e disse que ele estava “fantasiado de padre” e seria um “candidato laranja” (agindo em interesse de terceiros). Kelmon esteve no debate por ter sido candidato a vice de Roberto Jefferson (PTB), que foi declarado inelegível. Pela legislação eleitoral, candidatos de partidos com cinco deputados na Câmara têm direito de participar dos debates, o que é o caso do PTB.

Kelmon se apresenta como padre da igreja católica ortodoxa e se chamou de “sacerdote” no debate. Mas a igreja ortodoxa no Brasil publicou um comunicado negando que Kelson faça parte de seus quadros.

William Bonner, moderador do debate, repreendeu a postura do suposto “padre”. Disse que ele assinou documento concordando com as regras do debate, mas seguia desrespeitando o combinado e interrompendo as faltas dos outros candidatos, especialmente de Lula e Soraya Thronicke.

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