Furacão Ian causa perdas bilionárias e evidencia riscos do clima na Flórida

Prejuízos podem chegar à casa de US$ 100 bilhões, segundo estimativas, em um dos estados que mais atraem americanos em busca do calor e de impostos mais baixos

Estragos causados pelo furacão Ian em Fort Myers, na Flórida, na última quinta-feira, dia 29 (Eva Marie Uzcategui/Bloomberg)
Por Claire Ballentine - Prashant Gopal
30 de Setembro, 2022 | 01:49 PM

Bloomberg — Para os moradores da Flórida, o furacão Ian está servindo como um lembrete dos riscos de viver em um estado onde o sol e os impostos baixos atraíram um fluxo de americanos nos últimos anos.

Milhares de pessoas, de profissionais de Wall Street a pessoas comuns, se mudaram na pandemia para o estado ensolarado, atraídas pelo custo de vida e pelo clima quente durante todo o ano. Agora, eles encontraram o que pode ser um dos furacões mais caros e poderosos da história dos EUA.

A tempestade causou extensas inundações, principalmente na costa do Golfo da Flórida, e deixou milhões de casas e empresas sem energia. Com casas e infraestrutura em ruínas, as estimativas sobre os danos chegam a US$ 100 bilhões.

Para muitos dos recém-chegados, é o primeiro grande desastre natural em um estado particularmente propenso a riscos climáticos, mas que ainda atrai multidões de pessoas e empresas.

PUBLICIDADE

Andrew Ford, que se mudou para o Porto Norte do Condado de Sarasota em Nashville, no estado do Tennessee, em julho, está esperando para ver se sua nova casa será habitável após a tempestade. Ele colocou persianas e sacos de areia nas portas antes de fugir na noite de segunda-feira (26), mas não tem certeza de quanto isso ajudará.

“Agora é uma droga; é horrível”, disse o jogador de 34 anos, que trabalha no centro de treinamento do Atlanta Braves, um dos times de beisebol mais populares do país, na região. “Nesse ritmo, não sei quando voltarei.”

A Flórida, há muito conhecida como um paraíso para aposentados e para quem tenta evitar invernos rigorosos, estava no centro de um boom de pandemia, já que o trabalho remoto e os preços altíssimos das casas levaram os moradores de Nova York, São Francisco e Los Angeles a buscar locais mais baratos.

A área abrigou alguns dos maiores ganhos no mercado imobiliário do país: os preços das casas aumentaram 67% na área de Tampa e 63% em Miami desde março de 2020, de acordo com os índices S&P CoreLogic Case-Shiller. Isso se compara a um aumento de 41% nacionalmente.

O estado também vem tentando se estabelecer como um centro financeiro, com alguns o chamando de Wall Street do Sul.

Poderosos players de Wall Street, do fundo hedge Citadel de Ken Griffin à Apollo Global Management se estabeleceram em Miami, enquanto West Palm Beach atraiu o Goldman Sachs e a Point72 Asset Management.

Cathie Wood, da Ark Investment Management, mudou sua empresa para São Petersburgo, onde houve evacuações em áreas próximas antes da chegada do furacão Ian. A Ark se recusou a comentar.

PUBLICIDADE

Os riscos climáticos da Flórida significam que o fluxo de recém-chegados de estados mais caros descobrirá que a Flórida não é somente uma pechincha em termos de custo de vida, disse Jesse Keenan, professor associado de imóveis sustentáveis da Universidade de Tulane, em Nova Orleans.

Os impostos sobre vendas e propriedades terão que subir para pagar a infraestrutura necessária para o crescimento em grande parte irrestrito que os governos da Flórida permitiram, juntamente com os custos de reconstrução, disse ele.

As perdas originalmente estimadas causadas pelos ventos fortes e pela tempestade do Ian ficavam entre US$ 28 bilhões e US$ 47 bilhões, o que a tornaria a tempestade mais cara (em termos de prejuízos) da Flórida desde o furacão Andrew, há três décadas, de acordo com a CoreLogic Inc.

Há outras estimativas que apontam para a casa de US$ 100 bilhões, como mencionado.

“Se você se mudou para a Flórida em busca de moradia barata e sol, haverá um choque”, disse Keenan. “Entre o seguro de propriedade e os impostos locais, você pagará por esses custos de uma forma ou de outra.”

Riscos climáticos nos próximos anos

Cerca de 2,4 milhões de propriedades na Flórida - mais de um terço do total do estado - enfrentam uma chance superior a 26% de serem severamente afetadas por inundações dentro de 30 anos, de acordo com o Risk Factor, uma ferramenta de relatório de dados da First Street Foundation, sem fins lucrativos.

Mas os danos causados pelas inundações geralmente não são cobertos pelas apólices de seguro residencial, o que pode deixar muitas pessoas com novos encargos financeiros.

O mercado de seguros de propriedade do estado já estava oscilando, disse Keenan, e a tempestade pode derrubá-lo. Alguns empreendimentos podem não ser seguráveis porque serão considerados muito arriscados, enquanto muitos milhares de proprietários não poderão obter seguro, disse ele.

O mercado imobiliário da Flórida “não precificou o risco de furacões, de mudanças climáticas e o peso de seu próprio crescimento”, disse Keenan. “Cresceu muito mais rápido do que a infraestrutura pode acompanhar.”

Hoje em dia, é difícil encontrar um lugar nos Estados Unidos que esteja livre de riscos, para ser mais preciso. As mudanças climáticas estão contribuindo para eventos mais severos em todo o país, desde incêndios florestais na Califórnia até calor extremo no Texas e tornados no Centro-Oeste. A Flórida é apenas o lugar mais recente para ser atingido.

Veja mais em Bloomberg.com

Leia também

Vazamento de gás no Nord Stream pode ser desastre climático sem precedentes

Desastres climáticos na América Latina ameaçam segurança alimentar global