Bloomberg — O Fundo Monetário Internacional (FMI) pediu que o governo britânico reconsiderasse os enormes cortes de impostos anunciados na semana passada, enquanto a agência de classificação de crédito Moody’s Investors Service disse que o plano poderia causar danos permanentes às finanças públicas.
O FMI disse que o estímulo fiscal é inadequado, considerando as pressões inflacionárias na economia britânica, e que o pacote corre o risco de dificultar a vida do Banco da Inglaterra. A inflação ao consumidor chegou a 9,9% em agosto na taxa anual, próxima aos patamares mais altos em quatro décadas.
A Moody’s previu que os cortes de impostos reduzirão o crescimento econômico – contrariando a visão do ministro das Finanças, Kwasi Kwarteng – ao levar ao aumento as taxas de juros.
As advertências ocorreram em meio a movimentos dramáticos nos preços dos ativos no Reino Unido na esteira do mini-orçamento do governo.
A libra atingiu um recorde de baixa em relação ao dólar na segunda-feira (26) depois que Kwarteng ignorou críticas sobre sua visão econômica e disse que haverá mais cortes de impostos. Os custos de empréstimo saltaram em todo o sistema financeiro do Reino Unido desde seu anúncio na sexta-feira (23), e os bancos começaram a rescindir acordos de hipotecas, provocando um colapso nas vendas de imóveis.
Os traders se prepararam para um novo aperto do Banco da Inglaterra em resposta ao plano de estímulo fiscal, apostando em um aumento de ponto percentual na taxa básica do banco central, que deve atingir 6,25% em 2023, o nível mais alto desde 1999.
“Devido às elevadas pressões inflacionárias em muitos países, incluindo o Reino Unido, não recomendamos pacotes fiscais grandes e não direcionados no momento, pois é importante que a política fiscal não trabalhe com objetivos cruzados com a política monetária”, disse um porta-voz do FMI na terça-feira (27). “Além disso, a natureza das medidas do Reino Unido provavelmente aumentará a desigualdade.”
O FMI também disse que Kwarteng deveria usar um plano programado para novembro para “reavaliar as medidas fiscais, principalmente aquelas que beneficiam os que auferem rendimentos altos”.
A Moody’s afirmou que grandes cortes de impostos não financiados - ou seja, sem que haja recursos para cobrir o rombo - são “negativos para o crédito”, elevando a perspectiva de que a classificação do Reino Unido seja rebaixada.
A libra caiu 0,6%, chegando a US$ 1,0672 na manhã de quarta-feira (28) em Londres, após atingir um recorde de US$ 1,0350 no início da semana. O rendimento dos Gilts (títulos públicos do Reino Unido) de 30 anos subiu para o nível mais alto desde 1998, antes de uma venda da dívida do governo britânico.
David Frost, que negociou o Brexit, rejeitou as críticas do FMI, dizendo em comentários ao Daily Telegraph que o pensamento “convencional” do Fundo foi responsável por anos de fraco desempenho econômico.
Em um sinal de uma política divisora, mesmo entre os deputados conservadores, o ex-secretário da Irlanda do Norte Julian Smith respondeu com um grito de desespero a esse pensamento.
A crítica foi feita horas depois que o bilionário investidor Ray Dalio disse no Twitter que o governo britânico está “operando como o governo de um país emergente”.
Na segunda-feira (26), o presidente do Federal Reserve Bank of Atlanta, Raphael Bostic, disse que “a proposta realmente aumentou a incerteza e fez com que as pessoas questionassem a trajetória da economia”.
Martin Muhleisen, ex-diretor do departamento de estratégia, política e revisão do FMI, disse que “é raro que o fundo comente as políticas econômicas dos grandes membros fora do contexto de suas consultas anuais do Artigo IV”, referindo-se às avaliações anuais do fundo sobre seus países.
“O fundo ficou relativamente em silêncio no período que antecedeu o aumento da inflação nas economias avançadas, mas é adequado ressaltar que a disciplina fiscal terá que desempenhar um papel na sua redução novamente”, disse ele.
O FMI e o Reino Unido têm uma história complicada. O país garantiu um empréstimo de cerca de US$ 4 bilhões do órgão financiador nos anos 70 em meio a uma libra em queda e uma inflação crescente; mais recentemente, ambos entraram em desacordo com a austeridade orçamental imposta após a recessão de 2009 e depois com a separação do país da União Europeia.
Até o momento, Kwarteng está cumprindo suas propostas.
Ele disse em reunião dos principais financiadores que estava confiante de que sua abordagem “funcionaria”, de acordo com uma ata do Tesouro. “Estamos comprometidos com a disciplina fiscal”, disse ele.
Quando o plano for lançado em novembro, o aumento das taxas de juros será quase garantido. O economista-chefe do Banco da Inglaterra, Huw Pill, disse na terça-feira (27) que o anúncio e a reação do mercado a ele exigem uma resposta “significativa” da política monetária.
- Com a colaboração de Libby Cherry.
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