Se você acha os carros elétricos muito caros, veja de quem é a culpa

Empresas que gastam muito com pesquisa e desenvolvimento e negligenciam a produção estão frustrando a demanda dos consumidores

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Bloomberg Opinion — Quanto realmente custa montar um carro elétrico? Como as novas montadoras gastam bilhões de dólares e despejam centenas de milhões a mais em pesquisa e desenvolvimento, a resposta aparentemente é “muito”. E todo esse dinheiro não aproximou o mundo da adoção em massa.

Os carros elétricos utilizam menos peças que carros comuns, que normalmente são obtidas de outras empresas. As fabricantes não constroem necessariamente o carro, optando muitas vezes por adquirir um software pronto e expandi-lo. Então, qual valor agregado a empresa que acaba colocando sua marca no produto realmente contribui? Como a Li Auto, a Rivian Automotive, a Nio, a XPeng e seus pares gastam bilhões de dólares, mesmo quando a maioria delas tem prejuízo líquido?

Os gastos com pesquisa e desenvolvimento continuam aumentando, e ainda assim há relativamente poucos veículos por aí. Para a chinesa Nio, a despesa aumentou 143% no segundo trimestre em comparação com um ano atrás. Os aumentos, segundo a empresa, vieram de custos com pessoal e com “projetos e desenvolvimentos adicionais” de novas tecnologias. Durante esse período, passou de gastar US$ 6.250 de P&D por veículo vendido para US$ 12.964. Enquanto isso, o prejuízo líquido chegou a US$ 404,5 milhões, ante US$ 91 milhões.

A XPeng, impulsionou a P&D em 47% para contratação e remuneração de funcionários. A Li Auto disse em um prospecto de junho que estava arrecadando mais dinheiro nos Estados Unidos para tecnologias de veículos da próxima geração, cabines inteligentes e condução autônoma, juntamente com o desenvolvimento de futuros modelos de carros. Seus últimos ganhos trimestrais mostraram um aumento de 134% nas despesas, enquanto entregou apenas 28.687 carros no trimestre encerrado em junho. Isso representa mais de US$ 8 mil de P&D por carro.

Para a Rivian, que está ainda mais longe de chegar à fabricação em larga escala, os gastos são tão altos e a produção é tão baixa que a economia por carro quase não faz sentido.

Há pouca divulgação sobre os estágios de desenvolvimento ou as características que estão custando tanto, ou sobre o porquê de tantos especialistas em P&D serem contratados. Ao contrário, das empresas farmacêuticas, por exemplo, que divulgam apresentações detalhadas sobre seus pipelines de medicamentos, fases de desenvolvimento e testes clínicos, as montadoras de veículos elétricos dissimulam a narrativa da futura produção em massa de seus veículos, com apenas milhares de unidades e sem qualquer nenhum sinal de que o que fazem é melhor. O que seria um veículo elétrico bom ou competitivo neste momento? Se ele rende 200 quilômetros ou um pouco mais, isso não muda o fato de que muitos desses modelos ainda custam perto da renda média anual doméstica americana de cerca de US$ 67 mil.

Os investidores gostam de justificar este comportamento, observando que “todas as startups perdem dinheiro”. Claro, mas essas são empresas em seus primeiros anos de vida. Estas empresas já exploraram os mercados de dívida pública e de ações, subsídios e incentivos – já passaram do momento de se apoiar nesta lógica. Seu futuro depende da economia unitária e de quanto custa seu crescimento.

Compare isso com as montadoras de veículos elétricos como a Tesla (TSLA) e a BYD, da Berkshire Hathaway (BRK/A), que aumentaram a produção agressivamente em seus mercados nos últimos anos, focaram nas baterias certas e aumentaram significativamente seus volumes. Para cada dólar ou yuan de capital que gastam, há produtos que justificam – carros e baterias melhores. A empresa de Elon Musk reduziu o tempo de espera de seus vários modelos na China.

O problema não é só o gasto. As pessoas querem comprar carros elétricos, mas os tempos de espera nos EUA e na Europa podem ser de 15 meses ou mais. Elas não querem – nem podem – esperar até que as montadoras descubram como administrar bem seus negócios ou como investir eficientemente na produção. Em vez de esbanjar dinheiro com marketing ou com tecnologias não estabelecidas, elas deveriam estar consolidando o preço de compra dos carros em vez de dizer aos compradores ansiosos que tiveram que aumentá-los. Neste ponto, as perspectivas de equilíbrio nas contas continuam distantes para as montadoras.

Os níveis atuais de gastos com pesquisa e desenvolvimento relativos às unidades produzidas pelas montadoras mostram que estas empresas não estavam realmente prontas para abrirem o capital – principalmente as que se precipitaram para entrar no mercado através de empresas de aquisição de propósito específico, ou SPACs. É possível que elas simplesmente não tenham certeza de que seus gastos produzirão resultados, ou que possam fabricar carros comercialmente viáveis em massa. De qualquer forma, investidores e consumidores não deveriam financiar esses veículos futuristas quando não há carros elétricos suficientes.

Com os receios de uma recessão iminente, a lucratividade atingiu o ápice de sua importância para os investidores. Empresas como a Tesla e a BYD têm um caminho a seguir. O caminho das outras montadoras não é tão claro.

Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.

Anjani Trivedi é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre empresas industriais na Ásia. Anteriormente, escrevia para o Wall Street Journal.

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