Bloomberg — O cobre, essencial para a indústria como um todo, viu seu preço cair quase um terço desde março, com a venda massiva por parte de investidores, seguindo o temor de uma recessão global que reduziria a demanda pelo metal, visto como um símbolo de desenvolvimento e progresso.
Vários dos mais importantes mineradores e metalúrgicos alertam que, em apenas alguns anos, haverá uma enorme escassez de cobre em todo o mundo, o que pode desacelerar o crescimento mundial, alimentar a inflação aumentando custos de produção e distanciando ainda mais as metas ambientais.
“Vamos olhar para 2022 e pensar ‘opa’”, disse o chefe de estratégia de ativos reais do Wells Fargo (WFC), John LaForge. “No mercado, só se percebem as preocupações mais imediatas. No entanto, se realmente pensarmos no futuro, percebemos que o mundo, sem dúvida, mudará. Ele será eletrificado e exigirá muito cobre.”
Os estoques contabilizados em bolsa estão próximos do menor nível histórico, e a recente volatilidade dos preços significa que o desenvolvimento de novas minas – o que deve começar a se esgotar já em 2024 – pode se tornar mais limitado antes do esperado.
Recentemente, a mineradora Newmont (NEM) abandonou os planos para um projeto de ouro e cobre de US$ 2 bilhões no Peru. A maior fornecedora de cobre listada em bolsa do mundo, a Freeport-McMoRan (FCX) alertou que os preços agora “não são suficientes” para apoiar novos investimentos.
Especialistas em commodities vêm alertando sobre uma potencial crise de cobre há meses – ou anos. E a última desaceleração do mercado pode agravar os problemas de abastecimento no futuro, oferecendo uma falsa sensação de segurança, sufocando o fluxo de caixa e congelando investimentos.
Leva pelo menos 10 anos para desenvolver uma nova mina e colocá-la em funcionamento, o que significa que as decisões tomadas pelos produtores hoje ajudarão a determinar o que acontecerá por pelo menos uma década adiante.
“Um investimento significativo em cobre requer um bom preço, ou pelo menos uma boa percepção de preço de cobre a longo prazo”, disse o presidente-executivo do Rio Tinto Group (RIO), Jakob Stausholm, em entrevista em Nova York.
Por que o cobre é tão importante?
O cobre é essencial para a vida moderna. Há cerca de 30 quilos do metal presente em um carro médio, e mais de 180 quilos em uma casa comum, de uma família.
O metal, considerado referência na condução de eletricidade, também é fundamental para um mundo mais verde. Embora grande parte da atenção se concentre no lítio, um componente-chave para baterias atualmente, a transição energética será impulsionada por uma variedade de matérias-primas, incluindo níquel, cobalto e aço.
Quando se trata de cobre, milhões de fiações serão cruciais para fortalecer as redes elétricas do mundo e toneladas serão necessárias para construir parques eólicos e solares. De acordo com a Copper Alliance, os veículos elétricos usam mais do que o dobro de cobre que os carros movidos a gasolina.
Qual será o tamanho da escasez?
À medida que o mundo caminha para se tornar mais elétrico, as metas para reduzir as emissões de gases de efeito estufa dobrarão a demanda pelo metal para 50 milhões de toneladas métricas anualmente até 2035, de acordo com um estudo financiado pela S&P Global.
Embora essa previsão seja em grande parte hipotética, uma vez que o cobre não pode ser usado se não estiver disponível, outras análises também apontam para o potencial aumento. A BloombergNEF estima que a demanda aumentará mais de 50% entre 2022 e 2040.
Enquanto isso, o crescimento da oferta de mineração atingirá o pico por volta de 2024, com a escassez de novos projetos em andamento e à medida que as fontes existentes se esgotam. Isso configura um cenário em que o mundo poderá ver um déficit recorde de até 10 milhões de toneladas até 2035, de acordo com a pesquisa.
O Goldman Sachs (GS) estima que as mineradoras precisam gastar cerca de US$ 150 bilhões na próxima década para preencher um déficit de 8 milhões de toneladas, de acordo com um relatório divulgado este mês.
A BloombergNEF, por sua vez, prevê que até 2040 a lacuna de produção pode chegar a 14 milhões de toneladas, que teriam que ser cobertas pela reciclagem do metal.
Para colocar em perspectiva o quão grande seria essa escassez, considere que em 2021 o déficit global atingiu 441.000 toneladas, o equivalente a menos de 2% da demanda pelo metal refinado, segundo o International Copper Study Group. Isso foi o suficiente para os preços saltarem 25% no ano passado.
As projeções atuais da S&P Global no pior cenário mostram que o déficit de 2035 será equivalente a cerca de 20% do consumo.
O que isso significa para os preços? “Vai ficar extremo”, disse Mike Jones, que passou mais de três décadas na indústria de metais e agora é o CEO da Los Andes Copper, uma empresa de exploração e desenvolvimento de minérios.
Para onde vão os preços?
O Goldman Sachs prevê que o preço de referência na London Metal Exchange (LME) quase dobrará para uma média anual de US$ 15.000 por tonelada em 2025. Na última quarta-feira (21), o cobre era negociado a US$ 7.690 a tonelada na London Metal Exchange.
“Todos os sinais de oferta apontam para um caminho bastante difícil à frente se os produtores não começarem a construir minas”, disse Piotr Kulas, analista sênior de metais básicos da empresa de pesquisa CRU Group.
É claro que todas essas previsões de uma demanda ainda mais acelerada são baseadas na ideia de que os governos continuarão avançando com suas metas de redução de emissões, extremamente necessárias para combater as mudanças climáticas. Mas o cenário político pode mudar, e isso significaria um caminho muito diferente para o uso dos metais (e do planeta).
Há também um ditado comum nos mercados de commodities que pode entrar em jogo: preços altos são a cura para preços altos. Embora o cobre tenha caído desde o recorde de março, ainda está sendo negociado 15% acima de sua média de 10 anos.
Se os preços continuarem a subir, isso acabará levando as indústrias de energia limpa a encontrarem maneiras de reduzir o consumo do metal ou até mesmo, a procurarem alternativas, de acordo com Ken Hoffman, co-diretor do grupo de pesquisa de materiais para baterias de veículos elétricos da McKinsey & Co.
Uma oferta vinda da reciclagem pode ajudar a preencher as lacunas de produção de mineração, principalmente à medida que os preços sobem, o que “levará mais metais reciclados a chegar ao mercado”, disse Sung Choi, analista da BloombergNEF.
A S&P Global aponta para o fato de que, à medida que mais cobre é usado na transição energética, mais “oportunidades de reciclagem” também se abrem, como quando os veículos elétricos são sucateados. A produção reciclada representará cerca de 22% do mercado total de cobre refinado até 2035, acima dos 16% em 2021, estima a S&P Global.
O atual mal-estar econômico global também ressalta o motivo pelo qual o economista-chefe da BHP Group, a maior mineradora do mundo, disse que o cobre tem um caminho “irregular” pela frente devido a preocupações com a demanda.
O Citigroup (C) vê o cobre caindo nos próximos meses devido a uma recessão, principalmente impulsionada pela Europa. O banco estima o metal negociado a US$ 6.600 no primeiro trimestre de 2023. E as perspectivas de demanda da China, a maior consumidora de metais do mundo, também são um fator determinante.
Se o setor imobiliário da China se contrair significativamente, “isso significa estruturalmente menos demanda por cobre”, disse Timna Tanners, analista da Wolfe Research. “Para mim, isso é apenas uma grande troca” para as previsões de consumo com base nas metas de redução de emissões, disse.
Mas mesmo uma recessão significará apenas um “atraso” para a demanda e não “prejudicará significativamente” as projeções de consumo para 2040, de acordo com uma apresentação da BloombergNEF em 31 de agosto.
Isso porque grande parte da demanda futura está sendo “legislada” por meio do foco dos governos em metas verdes, tornando o cobre menos dependente da economia global do que costumava ser, diz o relatório.
Além disso, há pouca margem de manobra no lado da oferta. O mercado físico de cobre já está tão apertado que, apesar da queda nos preços futuros, os prêmios pagos pela entrega imediata do metal vêm subindo.
Matéria-prima: o que está acontecendo?
Para entender o que está acontendo com o fornecimento da matéria-prima, basta dar uma olhada no que está acontecendo no Chile, a lendária nação mineira que há muito é a maior fornecedora mundial do metal. Por lá, as receitas de exportação de cobre estão caindo devido a problemas de produção.
Em minas mais maduras, a qualidade do minério está se deteriorando, o que significa que restos de produção ou mais rochas devem ser processadas para produzir a mesma quantidade.
No Peru e no Chile, que juntos respondem por mais de um terço da produção global, alguns investimentos em mineração estagnaram, em parte devido à incerteza regulatória, já que os políticos buscam uma parcela maior dos lucros para lidar com as desigualdades econômicas.
A inflação disparada também contribuiu para elevar o custo de produção. Isso significa que o preço médio de incentivo, ou o valor necessário para tornar a mineração atraente, agora é cerca de 30% maior do que era em 2018, cerca de US$ 9.000 a tonelada, segundo o Goldman Sachs.
Globalmente, os suprimentos já estão tão escassos que os produtores estão tentando espremer pequenas pepitas de sucatas. Nos EUA, as empresas enfrentam obstáculos na concessão de licenças. Enquanto no Congo, a infraestrutura fraca está limitando o potencial de crescimento dos principais depósitos.
E então há essa grande contradição quando se trata de cobre: o metal é essencial para um mundo mais verde, mas tirá-lo do chão pode ser um processo bastante prejudicial. Em um momento em que todos, de comunidades locais a gerentes de cadeias de suprimentos globais, estão intensificando o escrutínio de questões ambientais e sociais, obter aprovações para novos projetos está se tornando cada vez mais difícil.
A natureza cíclica das indústrias de commodities também significa que os produtores enfrentam pressão para manter seus balanços fortes e recompensar os investidores em vez de apostar agressivamente no crescimento.
“O incentivo para usar fluxos de caixa para retorno de capital em vez de investir em novas minas é um fator chave que leva à escassez de matérias-primas que o mundo precisa para descarbonizar”, disseram analistas do Jefferies Group LLC em comunicado.
Mesmo que os produtores mudem de marcha e comecem a despejar dinheiro em novos projetos, o prazo mais longo para entrega das minas significa que as perspectivas de fornecimento estão praticamente bloqueadas para a próxima década.
“A situação de curto prazo está contribuindo para uma perspectiva de longo prazo mais forte porque está tendo um impacto no desenvolvimento da oferta”, disse Richard Adkerson, executivo-chefe da Freeport-McMoRan, em entrevista.
E enquanto isso, “o mundo está se tornando mais eletrificado em todos os lugares que você olha”, disse ele, inevitavelmente trazendo “uma nova era para a demanda”.
-- Com a colaboração de Joe Deaux.
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