Quem ganha com a falência da Itapemirim? E o que acontece com os credores

Saída definitiva de cena por decisão do TJ-SP tem impacto sobre mercado doméstico de aviação. Ativos remanescentes devem ser vendidos para o pagamento de dívidas

ITA deixou de voar no fim de 2021, deixando na mão cerca de 45 mil passageiros que estavam com viagem marcada
23 de Setembro, 2022 | 08:58 AM

São Paulo — A falência do Grupo Itapemirim, decretada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo na quarta-feira (21), pode resultar em um ambiente de menor competição na aviação comercial brasileira, segundo analistas do setor de transportes. O grupo capixaba, que atuava nos setores de transporte rodoviário e aéreo, estava em recuperação judicial desde 2016 devido a dívidas da ordem de R$ 2,5 bilhões.

Para os analistas Victor Mizusaki (Bradesco BBA) e Wellington Loureço (Ágora Investimentos), a notícia da falência da Itapemirim é positiva para as duas companhias aéreas brasileiras, a Azul (AZUL4) e a Gol (GOLL4). A Latam, outro dos principais players no mercado doméstico, também se beneficia.

“Notícias positivas para Azul (Compra, preço-alvo de R$ 30,00) e Gol (Neutra, preço-alvo de R$ 12,00), pois isso elimina a possibilidade de a companhia aérea ITA Airlines retomar as operações”, comentaram os analistas, em nota enviada aos clientes, mantendo suas recomendações.

Até abril deste ano, havia alguma expectativa de um possível retorno da ITA ao mercado, mas as supostas tentativas anunciadas de busca de um novo dono e de uma injeção de capital fracassaram. Quando deixou de voar às vésperas do Natal e das festas de fim de ano em 2021 por falta de pagamentos, a ITA deixou na mão cerca de 45 mil passageiros com bilhetes comprados.

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Com uma frota composta de sete aeronaves da Airbus, alugadas com empresas de leasing, a ITA (Itapemirim Transportes Aéreos), que era a quarta maior companhia aérea do país, atrás da Latam, Gol e Azul, deixou de voar às vésperas do Natal no ano passado, depois de menos de seis meses de operação e de consumir R$ 42 milhões do Grupo Itapemirim, segundo informações divulgadas.

Durante esse período, a ITA transportou cerca de 360 mil passageiros, segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), com 1,4% do mercado nacional.

Na época, a companhia justificou a decisão dizendo que uma empresa terceirizada tinha decidido paralisar a prestação de serviços de apoio. A ITA tinha 440 tripulantes, sendo 138 pilotos e 302 comissários, que reclamavam do atraso no pagamento de salários e benefícios trabalhistas, segundo o SNA (Sindicato Nacional dos Aeronautas).

Fora do mercado

A saída da ITA do mercado provocou no Brasil um debate sobre os critérios para a liberação de licença para o funcionamento de novas companhias aéreas, uma vez que o Grupo Itapemirim estava em recuperação judicial quando a ITA começou a operar comercialmente no dia 1º de julho.

“O governo foi irresponsável e negligente em autorizar um grupo em recuperação judicial a voar e ingressar em um setor que depende de muito investimento e de muito capital”, criticou, na época, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, um dia após a suspensão dos voos.

A ITA engrossou a lista de companhias aéreas que deram adeus definitivamente ao mercado comercial regular nas últimas décadas: Transbrasil, Vasp, Varig e Avianca Brasil, entre outras marcas de atuação regional.

Em setembro do ano passado, a Anac informou à Bloomberg Línea que analisava três pedidos de certificação de novas companhias aéreas (Regional, Asas e Nella).

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No começo do mês passado, o CEO da Nella Airlines, Mauricio Souza, disse à Bloomberg Línea que planeja iniciar a operação de voos regulares no Brasil somente em 2023. Ele aguarda a certificação da Anac.

Pagamento de credores

Ao decretar a falência do Grupo Itapemirim, a 1ª Vara de Recuperação Judicial de São Paulo autorizou a Transportadora Turística Suzano, conhecida como Suzantur, a assumir as operações rodoviárias que compõem a massa falida, com o objetivo de preservar o funcionamento dos itinerários interestaduais e intermunicipais da marca.

Isso significa que a Suzantur vai arrendar todas as linhas, guichês, marcas e parte dos imóveis operacionais da Itapemirim durante 12 meses. Esse prazo pode ser renovado por igual período.

Segundo a administradora judicial EXM Partners, que requereu a falência do Grupo Itapemirim, três empresas fizeram propostas de arrendamento (Ricco, Suzantur e Viação Garcia).

A Justiça também indisponibilizou os bens do controlador da empresa, Sidnei Piva de Jesus, porque entendeu que a outra companhia dele, a Piva Consulting, teria cruzado os rendimentos das duas pessoas jurídicas.

O caso é acompanhado com atenção no meio jurídico especializado em direito empresarial e RJ (recuperação judicial).

O advogado Fernando Brandariz disse que, com a decisão pela falência, os credores deverão aguardar a venda dos ativos para receber seus créditos na ordem que a legislação determina. O Bradesco (BBDC4), que pediu o decreto da falência, é um dos credores do Grupo Itapemirim.

“Em primeiro lugar, são os créditos derivados da legislação trabalhista, limitados a 150 salários mínimos por credor, e aqueles decorrentes de acidentes de trabalho”, explica Brandariz sobre as prioridades para o recebimento.

Pela ordem, na sequência, deverão ser quitados os créditos tributários, independentemente da sua natureza e do tempo de constituição. “Exceto os créditos extraconcursais e as multas tributárias”, afirmou Brandariz. Por último, ficam os créditos quirografários, entre outros. “Mas eventualmente algum recurso ainda deve ser apresentado pelo grupo”, disse o advogado.

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Sérgio Ripardo

Jornalista brasileiro com mais de 29 anos de experiência, com passagem por sites de alcance nacional como Folha e R7, cobrindo indicadores econômicos, mercado financeiro e companhias abertas.