Preço de classe executiva dispara, e empresas optam pela econômica. Ou não viajam

Voo de ida e volta em classe executiva em rotas mais longas, entre Nova York e Sydney, por exemplo, pode custar mais de R$ 100 mil, o dobro de antes da pandemia

Classe executiva da Singapore Airlines em um Boeing 737 Max 8: conforto menos acessível em diferentes companhias conforme os preços disparam
Por Angus Whitley e Danny Lee
18 de Setembro, 2022 | 07:37 PM

Bloomberg — Voar na classe executiva sempre esteve além das possibilidades da maior parte das pessoas. Agora, nem as empresas, tradicionalmente habituadas a bancar esse conforto a profissionais C-Level, podem pagar tarifas que dispararam à medida que o mundo tenta se reconectar após a covid-19.

Um voo de ida e volta em classe executiva nas rotas mais longas, entre Nova York e Sydney, por exemplo, pode custar mais de US$ 20.000 - ou R$ 105.000 ao câmbio da última sexta-feira (16) -, aproximadamente o dobro do preço dos dias pré-pandemia.

“A demanda está claramente superando a oferta”, disse Nick Vournakis, vice-presidente executivo da empresa de gerenciamento de viagens corporativas CWT. “Em algum momento, as empresas vão dizer ‘chega’.”

Com as restrições da covid cada vez menores em todo o mundo, companhias aéreas lutam para reativar suas frotas e trazer de volta funcionários com rapidez suficiente para lidar com o crescente apetite por viagens aéreas. Isso somado à capacidade e à disponibilidade de assentos limitadas, e os custos mais altos de combustível por causa do petróleo, o resultado são tarifas mais caras.

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De acordo com a CWT e a Global Business Travel Association, as tarifas aéreas da classe executiva devem aumentar 45% em 2022 e outros 6,2% no próximo ano.

As passagens de classe executiva para voos que saem dos Estados Unidos aumentaram 52% entre janeiro e agosto, por exemplo, um crescimento mais acentuado do que na classe econômica e na classe econômica premium, disse a empresa de viagens TripActions.

Com as empresas mais criteriosas aos aumentos de custos, as viagens corporativas estão de volta a um terreno instável, ainda não se recuperando totalmente de bloqueios relacionados ao vírus.

Isso é uma má notícia para as companhias aéreas. Antes da pandemia, os viajantes de negócios representavam 75% dos ganhos de uma companhia aérea, mas apenas 12% dos passageiros, segundo a empresa de software de viagens Trondent Development Corp.

“Estamos vendo uma hiperconsciência [das companhias] em relação aos gastos”, disse Marcus Eklund, diretor administrativo global da empresa de gerenciamento de viagens corporativas FCM.

Tem que ser econômica

Verificando tarifas para levar colegas para uma reunião de equipe em Bangkok, na Tailândia, o consultor de gestão Dhruv Sharma, que trabalha em Sydney, na Austrália, descobriu que seu orçamento não poderia se estender para a classe executiva, a escolha usual. “Tem que ser a classe econômica”, disse ele.

Sharma está tentando amenizar o golpe para aqueles que vão para a Tailândia oferecendo folga quando voltarem para a Austrália. Mesmo assim, ele espera que 20% dos colegas desistam porque não vão querer voar de forma mais barata.

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Bill Gates, o bilionário cofundador da Microsoft, previu no final de 2020 que mais de 50% das viagens de negócios desapareceriam após a pandemia do coronavírus. O CEO da Qantas Airways, Alan Joyce, colocou o possível declínio próximo de 15%.

Seja qual for o número final, os viajantes foram amplamente desencorajados de viajar a negócios porque o Zoom, o Teams, o Meet e o Webex mostraram o que pode ser alcançado sem a necessidade de as pessoas entrarem em um avião - e gastarem milhares de dólares. O recente aumento nas tarifas está colocando os benefícios das videochamadas em uma posição de destaque novamente.

A empresa de consultoria Refine and Focus, com sede em Boston, que trabalha em projetos em todo o mundo, estava cautelosa em pagar por viagens desnecessárias mesmo antes da pandemia. O aumento das tarifas aéreas e um pico inflacionário nas despesas praticamente selaram essa decisão.

“Quase paramos de viajar”, disse Purnima Thakre, codiretor da empresa. “Para qualquer projeto, prefiro pagar às pessoas melhor do que gastar esse dinheiro em passagens aéreas.”

As tarifas sofrem oscilações acentuadas e algumas rotas têm preços mais extravagantes do que outras. A Delta Air Lines e a British Airways estão cobrando mais de US$ 10.000 (mais de RS 52.500) para voos de ida e volta de Londres a Nova York na classe executiva no próximo mês, de acordo com o portal de viagens Kayak.

Os voos de ida e volta de classe executiva na rota Londres-Sydney com a Singapore Airlines custam cerca de US$ 12.000 (R$ 63.000). Mais perto do topo, a Qantas e a United Airlines cobram mais de US$ 22.000 (mais de R$ 115.500) por assentos de ida e volta premium na rota Nova York-Sydney.

A mudança coincide com o aumento da inflação e os temores de uma recessão.

Qualquer recuperação dos gastos com viagens corporativas em relação ao patamar pré-pandemia de US$ 1,4 trilhão não ocorrerá até 2026, de acordo com a Global Business Travel Association. Isso é até dois anos depois do que a associação esperava anteriormente.

Mais do que nunca, empresas estão escolhendo voos com base no preço, em vez de programas de fidelidade de companhias aéreas, a fim de maximizar os orçamentos de viagem, disse Martin Ferguson, chefe de relações públicas da American Express Global Business Travel.

A Southwest Airlines sinalizou na semana passada uma recuperação lenta nas viagens de negócios, com a receita do segmento caindo 26% em julho e 32% em agosto em comparação com os mesmos meses de 2019.

O CEO da American Airlines, Robert Isom, disse neste mês que grandes clientes corporativos, como bancos de investimento, estão com o equivalente a cerca de 75% da demanda que apresentavam antes da pandemia, um patamar que se coloca atrás da recuperação de empresas menores.

A preocupação com as tarifas está sendo mascarada até certo ponto pela falta de aviões no ar, pois isso faz com que a demanda pareça forte o suficiente para manter os preços altos. Globalmente, a capacidade internacional ainda está 25% abaixo dos níveis de 2019, segundo o provedor de dados de viagens OAG.

Turistas de lazer também estão adquirindo com desconto alguns dos assentos confortáveis que estão vagos por causa da redução do número de passageiros de negócios. Com economias acumuladas na pandemia, bem como contas com muitas milhas aéreas, esses turistas surgiram como um novo público-alvo para os assentos premium na parte da frente dos aviões.

Mas isso ainda deixa uma lacuna.

Risco para companhias aéreas

“O risco que as companhias aéreas correm é que, quanto mais tempo levam para atrair passageiros de negócios de volta para os voos, mais os comportamentos mudam”, disse Virginia Fitzpatrick, diretora da Ásia-Pacífico com sede em Sydney na consultoria Partnership Travel Consulting. “As companhias precisam recuperá-los porque as viagens corporativas alimentam a lucratividade.”

A Lendlease, desenvolvedora com sede em Sydney cujos projetos incluem o Memorial & Museum do 11 de Setembro em Nova York e as Petronas Twin Towers da Malásia, disse que o custo do voo está fazendo a empresa repensar as viagens de negócios e aplicar as lições aprendidas na pandemia.

“Nosso pessoal está se tornando mais inteligente sobre como viajar - e isso inclui ficar mais tempo para aproveitar ao máximo uma viagem”, disse Frank Krile, diretor de risco da Lendlease. “Eles também estão mais conscientes do que pode ser feito online versus o que é melhor feito pessoalmente.”

Embora a Lendlease tenha reservado 60% mais voos nos seis meses até agosto em comparação com o ano anterior, o número de viagens permanece bem abaixo dos níveis pré-pandemia, disse Krile.

Em Sydney, o consultor Sharma está lutando para ver como reunirá sua equipe enquanto as passagens aéreas estiverem inacessíveis.

“Temos a oportunidade de fazer as pessoas voarem, mas este é um desafio sem precedentes”, disse ele. “É meio frustrante.”

- Com assistência de Mary Schlangenstein.

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