Startup de genética fundada por professora da USP atrai Armínio Fraga

Ex-presidente do Banco Central e Eduardo Mufarej, ex-CEO da Tarpon e idealizador do RenovaBR, estão colocando R$ 10 milhões na gen-t

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Bloomberg Línea — Lygia da Veiga Pereira é pesquisadora e PhD em genética. Ela é professora da Universidade de São Paulo (USP) há 26 anos e lidera um laboratório com projetos de genética humana. Sua nova startup, a gen-t, um banco genético, é o seu primeiro passo na iniciativa privada, mas já ganhou endosso do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e de Eduardo Mufarej, ex-CEO da Tarpon e idealizador do RenovaBR (escola de formação política), com investimento de R$ 10 milhões (US$ 2 milhões).

Daniel Gold, investidor americano da QVT Financial LP especializado em biotecnologia, e a farmatech norte-americana Roivant Sciences também participaram da pré-Seed.

Tudo começou quando, em 2017, revistas científicas passaram a publicar mais conteúdo sobre a falta de diversidade nos estudos de genética humana no mundo, segundo Pereira.

“A comunidade científica se deu conta de que 80% do que estávamos fazendo só dizia respeito a populações brancas. Isso era um grande problema”, disse.

Nos estudos de genética, a professora explica que a ideia é desenvolver a medicina de precisão, ou seja, usar informações do genoma para administrar melhor a saúde, as tendências e identificar predisposições a doenças, além de prever quais são os medicamentos que oferecem melhores respostas.

A indústria farmacêutica é grande consumidora desses tipos de dados para estudar a biologia humana e desenvolver novos medicamentos e tratamentos. Segundo Pereira, se populações são excluídas dessas bases de dados, a descoberta dos genomas não é completa.

Na USP, ela se envolveu em iniciativas para um projeto de genomas de brasileiros em 2019, chamado de DNA do Brasil. “Nossa população tem essa característica muito única da miscigenação de povos ancestrais”, explicou.

Na época, o Ministério da Saúde começou a bancar o projeto por meio do programa nacional de saúde de precisão, o Genomas Brasil, para fomentar terapias mais avançadas.

Participando em simpósios da área, a professora conheceu, em Londres, modelos do mesmo projeto para criação de plataformas de dados, mas dentro da iniciativa privada. E que usavam o sistema de saúde público do Reino Unido para captação dos dados.

Foi assim que ela decidiu criar uma plataforma de dados genéticos e de saúde, separada do projeto da USP, para acompanhar brasileiros.

Agora, sua nova empresa, chamada de gen-t, quer convidar pessoas que são atendidas pelos serviços de saúde privados do Brasil para compartilhar os dados com a plataforma.

“Queremos criar um banco de material biológico para ser sequenciado e, a partir desses dados, ajudar a indústria a responder as perguntas que têm para aceleração de desenvolvimento de novos fármacos, usando os dados de diversidade da nossa população.”

A gen-t procura parcerias com hospitais e clínicas de serviços de saúde para acompanhar o que acontece com a saúde do indivíduo que compartilha o dado. No momento, a empresa fechou um contrato com a healthtech Dr. Consulta, que fornece consultas privadas a preços mais acessíveis.

“Não é que ao estudar a população brasileira faremos achados que só funcionam para nossa população. Podemos encontrar variantes nos genomas da população brasileira que ainda não foram descritos em outras populações”, explica.

A plataforma da gen-t está em construção e pretende chegar a 200 mil brasileiros recrutados - que aceitam compartilhar os dados - em cinco anos. Segundo Pereira, assim como há pessoas que optaram por participar dos testes das vacinas de Covid-19, ela aposta que os brasileiros terão altruísmo para compartilhar seu dados para melhorar a saúde da população.

“Se quisermos trazer a saúde de precisão para nossa população, precisamos conhecer os nossos genomas. E, ao mesmo tempo, vamos acompanhar a saúde dessa pessoa. Fazemos uma série de exames de sangue e questionários sobre a saúde da pessoa, cruzamos os resultados desses exames para desenvolver informações sobre os riscos e, no médio prazo, vamos começar a analisar o DNA dessas pessoas”, disse Pereira em entrevista à Bloomberg Línea.

A professora passará a atuar na USP em tempo parcial para assumir como CEO da startup e disse que o projeto DNA do Brasil não será encerrado. Hoje, a g-ent tem uma equipe clínica de cerca de 12 pessoas e até maio do próximo ano planeja ter materiais genéticos de 15 mil pessoas no banco de dados, além de pelo menos dois contratos fechados com a indústria.

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