São Paulo — O mercado de meios de pagamento e de maquininhas de cartão é um dos mais concorridos da economia brasileira. Há incumbentes com bancos grandes por trás, como Cielo (CIEL3), Rede e GetNet; fintechs com grandes investidores e negociadas em Nova York, como Stone (STNE) e PagSeguro (PAGS). E startups que buscam abocanhar uma fatia de um mercado de R$ 3 trilhões (volume de pagamentos transacionados em todas as modalidades de cartões nos 12 meses até junho de 2022).
Nesse mercado em que cada décimo de ponto percentual de market share vale bilhões, uma mudança de posição no ranking das maiores está prestes a acontecer. O PagSeguro ameaça superar a Stone no quarto lugar, diante da previsão de maiores investimentos em marketing neste terceiro trimestre e do lançamento de um novo produto, um cartão com garantia de CDB, enquanto o concorrente lida com o rearranjo de sua estrutura depois de registrar perdas bilionárias com crédito em meses anteriores.
No segundo trimestre, a diferença de participação de mercado entre as duas era de 0,20 ponto percentual (10,9% x 10,7%). A líder é a Cielo (CIEL3) com cerca de 26%, seguida por Rede (21,4%) e GetNet (13,9%), segundo dados da Abecs (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços).
“Já somos o segundo maior banco digital do Brasil, atrás do Nubank. Não somos só maquininha, mas uma empresa de tecnologia, uma plataforma aberta que permite ao nosso cliente usar softwares de terceiros na gestão de seu negócio”, disse Eric Oliveira, diretor de Relações com Investidores do PagSeguro, à Bloomberg Línea.
“Como nossa proposta de valor combina adquirência com banco digital, continuamos a ganhar mercado”. A companhia possui quase 25 milhões de clientes, dos quais 15 milhões ativos.
O executivo disse que ganhos de eficiência operacional, mix de produtos e serviços, além de investimentos em atualização tecnológica, vão contribuir para a consolidação da companhia no mercado.
“Um exemplo: a Stone tem 10,9% de market share e 14 mil funcionários. Nós temos uma fatia de 10,7%, processamos a mesma quantia de pagamentos que a Stone e temos 7 mil funcionários, igual ao Nubank. É um trabalho duro fazer mais com menos”, comparou Oliveira.
O executivo comparou o mercado de pagamentos instantâneos à batalha entre Davi e Golias, com players de menor porte enfrentando grandes conglomerados financeiros, mas disse que a disrupção tecnológica pode fazer a diferença e favorecer os menores nesse segmento.
Na sua avaliação, os investimentos em tecnologia geram eficiência. “Se você tem uma solução completa, simples, digital, segura e acessível, você tem uma proposta de valor e uma compreensão das necessidades do cliente. Eficiência é o nome do jogo”, afirmou Oliveira.
A empresa está em processo também de recuperar a confiança de investidores, depois de ter sido impactada pela onda vendedora de ações de crescimento (growth stocks) - ela é listada na Bolsa de Nova York. As ações subiram cerca de 60% em três meses, mas ainda acumulam queda aproximada de 40% em 2022.
Guidance
Para o terceiro trimestre, o PagBank PagSeguro forneceu um guidance de um lucro em linha com os R$ 403 milhões no segundo trimestre.
“Esperamos fazer esses R$ 400 milhões ou R$ 410 milhões, que estará entre um dos melhores resultados para o terceiro trimestre, a despeito dos juros que aumentaram sete vezes. Isso mostra a eficiência da companhia não só em aumentar preços mas também em despesas de pessoal e de marketing”, disse Oliveira.
Entre julho e setembro, ele indicou que as despesas com publicidade devem aumentar com os planos de aumento de portfólio.
“No terceiro trimestre, vamos ter duas coisas que vão impactar a dinâmica da lucratividade: a primeira é a taxa de juros média no terceiro trimestre, que vai ser maior em 110 pontos base em relação ao segundo trimestre. Isso vai encarecer o custo financeiro.”
“Nós também tomamos uma decisão estratégica: vamos lançar um produto novo, um cartão de crédito com garantia de CBDs. Vamos gastar mais com marketing”, explicou.
Funding mais barato
O diretor de Relações com Investidores destacou que o PagBank PagSeguro é um dos poucos bancos digitais do país que possui licença bancária para operar.
A vantagem competitiva decorrente desse status é a redução do custo de captação de recursos, algo que se tornou fundamental com o intenso aumento das taxas de juros de mercado, que passou de 2% ao ano em março de 2021 para os atuais 13,75%, com chance de subir ainda mais.
“Alcançamos R$ 15,5 bilhões em depósitos, que têm um custo de captação mais barato do que outros instrumentos financeiros para financiar o capital de giro de uma companhia, como debêntures, securitização, FIDCs [fundos de investimentos em direitos creditórios] e outros instrumentos”.
“Usamos parte desses R$ 15,5 bilhões para financiar tanto a operação de adquirência, de pré-pagamento que fazemos, quanto a concessão creditícia, sem nos alavancarmos igual aos bancos, apesar de termos a licença bancária. Essa é uma das alternativas que usamos”, disse o diretor.
“Somos a quinta companhia, estamos quase empatando com a Stone. O que temos visto agora, infelizmente, é uma série de startups realizando demissões em massa. Mas temos crescido de maneira gradual, sem pressa, de maneira sustentável.”
“Somos uma das poucas fintechs da América Latina que é lucrativa. Saímos de 300 funcionários em 2015 para 7.000 ao fim de 2021. Nunca fizemos nenhum processo de demissão em massa”, afirmou Oliveira.
Reajustes
Em abril e julho, o setor de maquininhas de cartão em geral reajustou os valores cobrados por seus serviços. A precificação contribuiu para que os analistas de mercado projetassem melhores resultados financeiros nos próximos trimestres, o que acabou se confirmando.
“Nós tivemos a reprecificação mais bem-sucedida do mercado”, avaliou Oliveira, justicando que, apesar da alta, o churn (taxa de cancelamento) da companhia continuou estável.
O PagBank PagSeguro reportou um lucro líquido de R$ 775 milhões e uma receita de R$ 7,3 bilhões no primeiro semestre deste ano. No segundo trimestre, o lucro somou R$ 403 milhões, quase R$ 30 milhões acima do ponto médio do guidance (projeção oficial) para o período.
O diretor do PagBank PagSeguro considerou que a precificação não foi o único impulsionador para esses resultados recordes.
“No segundo trimestre ficou muito claro que não é somente preço que mexe o jogo. O que observamos nos últimos anos é que cada vez mais qualquer perfil de comerciante tem acesso à aceitação de meios de pagamento, principalmente cartões, e nós fomos a companhia que promoveu a inclusão massiva dessa aceitação de pagamento no país”, afirmou o diretor do PagSeguro.
Ele apontou que o market share da companhia saiu de 9,9% no quarto trimestre de 2021 para 10,7% no segundo trimestre passado.
“Ninguém gosta de pagar caro. Ninguém gosta de aumento de preço, mas fizemos uma reprecificação efetiva em toda a base, de maneira a compensar essa elevação de sete vezes a taxa de juros, que ela saiu de 2% para 13,75% no período de 12 a 15 meses”, disse o executivo, lembrando que os reajustes começaram no fim do ano passado e se estenderam até o início do terceiro trimestre.
Sobre a queda na base de comerciantes ativos, o executivo disse que isso se deve à contabilização dos clientes da MoIP, uma empresa de pagamentos voltada para clientes de marketplaces que foi adquirida em 2020, e à maior seletividade da empresa.
“Podemos neste momento ser um pouco mais seletivos, priorizar clientes alinhados à nossa estratégia . Não temos focado muito em clientes com baixa rentabilidade. Quando excluo os comerciantes da MoIP e nanoclientes [aqueles com processamento mensal de pagamentos abaixo de R$ 1.000], nossa base de comerciantes cresceu 11% e não caiu”, contou.
Expansão com banco digital
Oliveira disse que os planos de crescimento têm como estratégia a combinação de serviços das maquininhas de cartões com outras funcionalidades de um banco digital, além da maior demanda por essa tecnologia de pagamento.
“Vimos também que, após a pandemia, houve uma massificação e uma digitalização dos pagamentos, canibalizando em muito as transações principalmente em dinheiro e também as transferências eletrônicas”, observou o diretor do PagBank PagSeguro.
Ele chamou atenção também para outro ponto. “Criamos uma estrutura que chamamos de polos ou hubs para atender também o pequeno e médio empreendedor que não entra pelo canal online. Temos vendedores externos que vão atrás da captura desse cliente.”
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