Bloomberg Línea — Com a perspectiva de que a safra de grãos de 2023 seja recorde, a fabricante brasileira de fertilizantes Galvani pretende investir mais de R$ 2,5 bilhões para aumentar sua produção, disse o presidente da empresa, Marcos Stelzer, em entrevista à Bloomberg Línea.
Entre a ampliação de unidades já instaladas e a abertura de novas minas, a previsão é que tudo esteja em operação em 2026.
De acordo com dados da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), do Ministério da Agricultura, a safra de grãos de 2022/2023, que começa a ser plantada em setembro, deve atingir 308 milhões de toneladas. O montante, se confirmado, será 14% acima da safra anterior e um recorde do setor.
O investimento que terá impacto mais imediato será na planta de Luís Eduardo Magalhães, município no norte da Bahia. A Galvani pretende investir R$ 200 milhões para dobrar a produção da unidade até 2024. Hoje, a fábrica produz 650 mil toneladas de fertilizantes fosfatados por ano. A meta é produzir 1,2 milhão de toneladas por ano a partir de 2024. Todo o valor virá de capital próprio, aportado pela família Gaivani, segundo o presidente da companhia.
Stelzer contou ainda que serão investidos R$ 2,3 bilhões na mina de fósforo de Santa Quitéria, no Ceará. Esse valor será uma combinação de capital próprio da Galvani, emissão de dívida no mercado e venda de participação - “não estamos falando de IPO, é equity”, explicou Stelzer.
O plano da Galvani é que a mina produza um milhão de toneladas de fertilizantes fosfatados por ano, para servir à região do Matopiba (que abrange o sul do Maranhão, o norte do Tocantins, o sul do Piauí e o oeste da Bahia).
Também serão produzidas 220 mil toneladas do chamado fosfato bicálcio, usado na fabricação de ração para gado. Isso, segundo Stelzer, corresponde a 50% de toda a demanda das regiões Norte e Nordeste e a 22% da demanda nacional.
O projeto de Santa Quitéria será feito em parceria com a Indústrias Nucleares Brasileiras (INB), estatal brasileira de produção e comercialização de materiais nucleares. Segundo o presidente da Galvani, a mina produz um tipo de fosfato que vem ligado ao urânio.
O contrato da Galvani com a INB estabelece que a mineradora vai separar o urânio e repassá-lo à estatal na forma concentrada (conhecida como yellow cake), que o venderá a países que podem enriquecê-lo, para comprar de volta o urânio enriquecido que será usado nas usinas de Angra 1, Angra 2 e, futuramente, Angra 3. A previsão é que a mina seja responsável pela produção de 2,3 mil toneladas de urânio por ano a partir de 2026, o que tornará o Brasil autossuficiente no material.
A mina está hoje em fase de licenciamento ambiental. Segundo Marcos Stelzer, já foram enviados os estudos de impacto ambiental e relatório de impacto ambiental - o chamado EIA-Rima -, e agora o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) precisa dar a palavra final.
De acordo com Stelzer, a Galvani é líder no fornecimento de fertilizantes para a região do Matobipa. A região produz cerca de 90 sacas de soja por hectare, o que a torna uma das líderes em produtividade do setor. Segundo o presidente da Galvani, depois que todos os projetos estiverem funcionando, a empresa vai atender 25% de toda a demanda do Matobipa.
Além disso, a Galvani também pretende começar a explorar uma mina de fósforo em Irecê, município na região central da Bahia. O investimento total na mina é de R$ 340 milhões, que virá de capital próprio da Galvani.
Plano nacional
Os investimentos da Galvani acontecem no momento em que o governo brasileiro busca reduzir a dependência do país de fertilizantes estrangeiros. Segundo o Ministério da Agricultura, 85% dos fertilizantes usados pelo agronegócio brasileiro são importados.
No caso dos fertilizantes fosfatados - área de atuação da Galvani -, insumos utilizados por culturas que representam 23% de tudo o que é exportado pelos agricultores brasileiros, a dependência é de 75%, ainda segundo o governo. E a maioria desses fertilizantes vem do Marrocos, que responde por 25% do total importado, e da Rússia, que responde por 14%.
O Plano Nacional de Fertilizantes, lançado pelo governo federal no início deste ano, pretende reduzir a dependência brasileira de importados para 45% até 2030.
Em entrevista à Bloomberg Línea, Marcos Stelzer afirmou que os investimentos da Galvani não devem resolver o cenário nacional de déficit de fertilizantes. Mas ele disse esperar atender 25% da demanda do Matopiba, segundo o executivo.
“O Brasil tem uma demanda de 16 milhões de toneladas de fertilizantes por ano, e nós vamos contribuir com quase 10%. Não é Santa Quitéria que vai resolver o problema, mas, pelo menos no Norte e no Nordeste, os agricultores vão ter que importar bem menos”, disse Stelzer.
Marcos Stelzer comemorou a solução dada pelo Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz), que reúne as secretarias de Fazenda dos estados, para a questão tributária dos fertilizantes.
Em 2021, o Confaz publicou um convênio para tentar equalizar o ICMS cobrado dos fertilizantes produzidos no Brasil e dos importados - desde 1997, por causa de outro acordo, o produto nacional paga 8,4% de ICMS, enquanto o importado é isento. O novo convênio estabelece que, até 2025, tanto os produtos nacionais quanto os importados pagarão 4% de ICMS, com equalização escalonada.
Mas Stelzer diz que o setor nacional poderia crescer mais com linhas linhas de crédito especiais para empresas do setor, nos moldes das debêntures incentivadas, cuja liberação para empresas de infraestrutura e logística está em discussão em projeto de lei no Congresso.
A Galvani fechou 2021 com receita líquida de R$ 817 milhões, com alta de 14% sobre o ano anterior, e lucro líquido de R$ 123 milhões, mais que o dobro do registrado em 2020. A empresa disse ainda que alcançou uma fatia de 23% do mercado de fertilizantes em toneladas entregues.
*Texto atualizado às 17h54 do dia 12/9 para corrigir a grafia do nome do presidente da Galvani, Marcos Stelzer, e para esclarecer que o urânio produzido na mina de Santa Quitéria já será exportado na forma concentrada. E atualizado às 14h de 13/9 para corrigir as informações sobre a unidade de Irecê: o fosfato será beneficiado já na unidade, e não transportado para Luís Eduardo Magalhães para ser escoado por Pecém, como dizia a reportagem.
Leia também:
Galvani dobra produção na Bahia em meio à crise de fertilizantes
Fábricas de fertilizantes da Petrobras atraem interesse da Yara
Importação de fertilizantes força modernização de portos e ferrovias no Brasil