Os salários no setor de tecnologia, um dos que mais contratam no país

Escassez de profissionais qualificados disponíveis contribui para salários mais elevados, de big techs como Google Microsoft a empresas que prestam serviços

Segundo a PageGroup, há cerca de 4 milhões de vagas de tecnologia abertas no mundo, uma demanda muito maior do que a disponível hoje
04 de Setembro, 2022 | 07:21 AM

Bloomberg Línea — A área de tecnologia é uma das mais demandadas e com melhores salários do mercado de trabalho, tanto no Brasil quanto no mundo. Mas, além da boa remuneração, vem também o prestígio de trabalhar em grandes empresas como Google (GOOG), Meta (META), Microsoft (MSFT) e Apple (AAPL), por exemplo.

Com salários mensais de até R$ 50 mil em posições de liderança, sem contar os benefícios que ampliam os valores, as perspectivas para o setor são favoráveis pelo menos no médio prazo e isso significa que as remunerações devem continuar elevadas. É o que apontam especialistas em recrutamento consultados pela Bloomberg Línea.

Lucas Oggiam, diretor da PageGroup, afirma que globalmente há cerca de 4 milhões de vagas de tecnologia abertas, uma oferta muito maior do que a demanda disponível hoje.

“Existe uma escassez global de pessoas disponíveis para trabalhar na área que atendam às competências exigidas pelo mercado”, diz. Ele destaca que a pandemia ampliou tal discrepância, com o aumento do home office e a demanda por novos sistemas.

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Os salários podem chegar perto de R$ 50 mil para cargos C-level em tecnologia, como os de um CIO (Chief Information Officer) com ampla experiência, segundo estudo divulgado no começo do ano pela consultoria Robert Half.

“É o segmento mais aquecido da economia e, olhando para o longo prazo, com base em escolas e universidades, cada vez mais cedo crianças têm aprendido linguagens de programação, como Python e C++”, afirma Lucas Nogueira, diretor associado da Robert Half.

No nível de gerente, profissionais que atuam com segurança da informação e de dados são os que possuem salários mais elevados, segundo o levantamento: até R$ 33.550 e até R$ 32.250, respectivamente.

No mercado como um todo, as posições com maior demanda hoje recaem sobre as de desenvolvedor, engenheiro de software e analista de Business Intelligence (BI). Nesses cargos, os salários podem chegar aos R$ 20 mil, conta Nogueira, da Robert Half.

Para cargos em início de carreira, como atendimento e analista de infraestrutura, por exemplo, as remunerações estão na casa dos R$ 6 mil, completou.

Oggiam também chama a atenção para a maior demanda por arquitetos, engenheiros e analistas de dados na área.

Salários em alta

Com mais demanda que oferta de profissionais na área de tecnologia, o poder na mesa de negociação fica com o candidato.

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“Existem estudos que mostram que não vamos conseguir formar, nos próximos cinco a dez anos, profissionais no tempo necessário que o mercado exige. Com esse déficit de profissionais qualificados, o mercado se volta para o candidato”, diz Nogueira.

Lucas Nogueira, diretor associado da Robert Half.

Oggiam, da PageGroup, conta que as empresas têm contratado mais de acordo com as competências dos profissionais do que com foco em base salarial. “A empresa quer alguém que resolva o problema.”

Isso tem feito com que pessoas com experiência e nível de analista sejam pagas até como diretores, conta. “Às vezes esse profissional pode não ter um conhecimento vasto excelente, mas sabe sobre os temas específicos necessários para a empresa, o que o faz uma raridade no mercado”, completa.

Nesse contexto, o executivo destaca que as faixas de remuneração no mercado de tecnologia são muito mais amplas e flexíveis do que em outras áreas. Isso porque o foco recai sobre os conhecimentos exigidos, o que pode levar a salários bem maiores que o comum.

“São os salários que mais aumentam em termos globais e a tendência não é diminuir, dado que é um mercado bem aquecido”, afirma.

Diferentemente do mercado financeiro, em que a remuneração variável tem maior peso no total compensation (remuneração acumulada no ano), Oggiam destaca que o salário fixo no setor de tecnologia costuma ser maior. Há ainda incentivos de longo prazo, como programas de stock options em startups, por exemplo.

Com relação aos benefícios, o estudo da PageGroup destaca que os profissionais estão interessados em modelos flexíveis de trabalho. “Se não for remoto, muitos candidatos sequer ouvem a proposta.”

Um levantamento da Bloomberg Línea com base na plataforma Glassdoor, a partir de avaliações de ex-funcionários, mostra que a remuneração média mensal de um analista pode superar os R$ 6 mil. Foi considerado um cargo mais amplo de forma a alcançar o maior número de avaliações disponíveis na plataforma para cada uma das empresas.

Para um engenheiro de software, o salário médio estava na casa dos R$ 12,7 mil, enquanto gerentes no ramo podem ganhar mais de R$ 20 mil. Apenas os cargos e as instituições com ao menos dez avaliações foram utilizados no levantamento.

Para fins de contexto e comparação, o rendimento médio do trabalhador brasileiro é de R$ 2.569, segundo os dados mais recentes do IBGE.

Inverno nas startups, mas não em cargos tech

O setor de tecnologia, junto com as startups, está sob os holofotes do mercado em meio à onda de demissões. No Brasil, unicórnios como VTEX, QuintoAndar e o de logística Loggi, reduziram recentemente a base de funcionários, de forma a diminuir custos. Mas na maioria das vezes os cortes se concentram em outras áreas, como a de marketing.

Na avaliação de Nogueira, da Robert Half, o movimento faz parte de uma reacomodação do mercado, com empresas que investiram pesado durante a pandemia e agora estão dimensionando a mão-de-obra. Ele chama a atenção para a avaliação de que dificilmente haverá uma vaga de tecnologia para a qual o mercado consiga oferecer um candidato 100% dentro do perfil.

“O empregador vai ter que abrir mão de alguma competência ao contratar. O mercado se atualiza muito, então é difícil ter o que seria o perfil técnico perfeito, além de inglês fluente e ampla experiência. As empresas acabam abrindo mais o leque para esse tipo de perfil”, completa.

Ele reforça, contudo, que o profissional de tecnologia brasileiro se destaca no mercado internacional por atuar em várias frentes ao mesmo tempo, diferentemente de outros habituados a trabalhar nos Estados Unidos e na Europa, por exemplo, que atuam de forma muito segmentada.

Cortes localizados também podem ocorrer para preservar os lucros diante do custo de mão-de-obra pressionado pela inflação, segundo explicou à Bloomberg Línea o CEO de uma empresa global de TI listada na Nasdaq, a Rimini Street, que oferece soluções de suporte para software corporativo.

“[Cortes acontecem no setor de tecnologia] não porque as empresas não estão crescendo, mas por causa do impacto nos lucros: se você pagar a todos os seus funcionários de 10% a 20% mais, isso reduzirá muito seus lucros”, explicou Seth Raven em entrevista no mês passado.

Oportunidades no mercado

Além de empresas tradicionais de tecnologia, bancos e fintechs, assim como companhias na área da saúde, também podem oferecer boas oportunidades para os profissionais da área no longo prazo, destaca Nogueira, da Robert Half.

“A área da saúde é pouco explorada pelo profissional de tecnologia, mas o campo é enorme. Desde cirurgia remota a controles virtuais de consultas, gerenciamento de despesas de hospitais, softwares de diagnósticos, entre outros”, diz.

Já nos bancos, sempre há demanda pela criação e manutenção de sistemas e, cada vez mais, investimentos em cibersegurança.

Oggiam, da PageGroup, também vê crescimento na área de segurança da informação, com o Brasil liderando entre os países com maior número de ataques hackers, que já atingiram órgãos do governo e empresas listadas na Bolsa como Fleury (FLRY3), Lojas Renner (LREN3) e CVC Brasil (CVCB3).

“Contratar um profissional de tecnologia não tem sido fácil e deve continuar sendo um desafio nos próximos anos”, completa Oggiam.

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Mariana d'Ávila

Editora assistente na Bloomberg Línea. Jornalista brasileira formada pela Faculdade Cásper Líbero, especializada em investimentos e finanças pessoais e com passagem pela redação do InfoMoney.