Mulheres, baixa renda e evangélicos: os eleitores no alvo de Bolsonaro e Lula

Presidente tenta recuperar parte dos votos que teve nos dois primeiros estratos em 2018, enquanto ex-presidente busca avançar em grupo dominado pelo rival

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Bloomberg Línea — O presidente Jair Bolsonaro (PL) e o ex-presidente Lula (PT) entram no último mês antes do primeiro turno diante de duas missões: para o atual comandante do país, crescer nas intenções de voto a ponto de entrar em condições de igualdade para um esperado segundo turno; para o petista, ampliar a vantagem que carrega nas pesquisas a ponto de conseguir vencer a disputa no dia 2 de outubro.

Ambos têm tarefas complicadas, mas o desafio para chegar lá são em certa medida diferentes. E as consequências também.

Enquanto Bolsonaro precisa reconquistar parte dos eleitores que perdeu de 2018 para cá e melhorar seu desempenho entre as mulheres, Lula precisa conquistar os eleitores evangélicos e convencer os mais ricos de suas propostas para a economia - ou de que pode ser uma alternativa moderada melhor para o país do que o adversário, inclusive no campo da corrupção.

Lula já foi presidente duas vezes e elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff, também do PT, duas vezes. Na campanha deste ano, usa os números da economia e dos avanços sociais de seus governos para mostrar que é a melhor opção para derrotar o atual presidente.

Votos dos evangélicos

Um de seus desafios é crescer entre parte do público cativo de Bolsonaro. O petista vence em quase todos os segmentos recortados pelas pesquisas eleitorais. Mas perde entre os evangélicos.

De acordo com a última pesquisa Datafolha, divulgada em 18 de agosto, Lula está 15 pontos à frente de Bolsonaro no quadro geral. Entre os que se declaram evangélicos, no entanto, perde por 48% a 32% para o atual presidente. A pesquisa foi feita de maneira presencial e ouviu 5.744 pessoas.

Nas pesquisas feitas por telefone e divulgadas na semana passada, o quadro é parecido. Na da Quaest, divulgada em 17 de agosto, Lula tem 25% dos votos dos evangélicos, enquanto Bolsonaro tem 46%. É a maior vantagem do presidente nessa pesquisa, que ouviu duas mil pessoas por telefone.

A campanha petista reconhece a dificuldade de falar com o público evangélico. Na primeira peça para a TV, divulgada no sábado (27), Lula fez um aceno discreto a esses eleitores: “Peço a Deus que ilumine esta nação e nos ajude a reconstruir o Brasil”, disse, já no início do discurso.

Em pronunciamentos, Lula tem procurado mostrar que sua defesa do Estado laico significa também respeito aos cristãos. Em reunião no Rio de Janeiro, disse: “Não sou daqueles que misturam política. Mas nós precisamos esclarecer algumas coisas. As pessoas não sabem que quem criou a lei da liberdade religiosa foi o meu governo, em 2003. O Dia Nacional da Marcha para Jesus, em 2009, o Dia Nacional do Evangélico, em 2010, ainda no meu governo. E o Dia Nacional da Proclamação do Evangelho foi no governo da Dilma Rousseff, em 2013″, conforme a Folha de S.Paulo.

O ex-presidente não quer que seus assessores confessem a intenção de vencer no primeiro turno, segundo um de seus articuladores. O objetivo é evitar transformar a ida para um eventual segundo turno com ampla vantagem em revés simbólico, o que poderia desmobilizar a militância e contaminar os eleitores. Para vencer as eleições, o candidato precisa de 50% dos votos válidos mais um.

Mas a campanha faz contas. Os que não votam nem em Lula nem em Bolsonaro são 26% ou 27%. O objetivo dos petistas é conquistar uma fração do público evangélico. A conta é a seguinte: se conseguir três ou quatro pontos percentuais, Lula conseguiria sair vencedor já no primeiro turno. A chave para isso estaria nos evangélicos, de acordo com integrantes da campanha petista.

Voto de quem elegeu Bolsonaro

Já Bolsonaro depende do sucesso de sua estratégia para continuar presidente. E ele não está em posição de poder cometer erros: desde o pleito de 1989, o candidato que acabou vitorioso e eleito presidente da República nunca chegou à data da eleição atrás nas pesquisas eleitorais.

Nem mesmo Dilma Rousseff (PT), reeleita por margem apertada no segundo turno de 2014, chegou a figurar em segundo lugar nas pesquisas - embora ela tenha chegado a empatar tecnicamente com Marina Silva (Rede) no fim de agosto daquele ano. Marina terminou a eleição em terceiro lugar.

O foco do atual presidente tem sido recuperar uma parte de seus eleitores de 2018, além de melhorar o seu desempenho em duas frentes: no voto feminino e dos mais pobres.

A primeira parte parece que vem dando certo: segundo a última pesquisa do Datafolha, 63% dos que votaram em Bolsonaro no segundo turno de 2018 disseram que vão votar nele neste ano. Na pesquisa anterior, a cifra era 56%. No mesmo período, a preferência por Lula no grupo de eleitores de Bolsonaro em 2018 recuou de 21% para 19%.

Voto da base da pirâmide

Para conquistar os mais pobres, a estratégia parece ainda não ter surtido efeito - não na magnitude esperada - apesar da liberação de dezenas de bilhões de reais. O governo apostou na aprovação de uma emenda constitucional que permitiu aumentar os gastos orçamentários no ano eleitoral, sem se submeter ao teto. Usou a brecha para aumentar o valor do Auxílio Brasil, versão bolsonarista do Bolsa Família, de R$ 400 para R$ 600.

O novo valor começou a ser pago em 8 de agosto, mas até aqui não parece não interferido no desempenho de Bolsonaro nas pesquisas nesse estrato. Lula continua à frente entre os que ganham dois salários mínimos, por 55% a 23%, conforme o último Datafolha. Esse estrato da população representa cerca de metade da população que vota, segundo a amostra do Datafolha - em outros institutos, essa fatia estimada do eleitorado é menor.

Há quatro anos, a desvantagem de Bolsonaro para o candidato do PT às vésperas do primeiro turno nesse estrato era muito menor, de 22% para 28% de Fernando Haddad, segundo o Datafolha.

Entre os que recebem o dinheiro ou moram com alguém que recebe o Auxílio Brasil, a preferência dos eleitores por Lula também é muito ampla: ele vence por 56% a 28%.

Não por acaso, a primeira peça de campanha de Bolsonaro para a TV focou no pagamento do auxílio como um dos pontos fortes do seu governo para os mais pobres.

Voto feminino

Um desafio ainda maior para o atual presidente é em relação às mulheres. Bolsonaro está 18 pontos atrás de Lula no segmento (47% a 29%), ainda segundo a última pesquisa do Datafolha. Esse estrato da população representa 52% da amostra da pesquisa, em linha com o que foi em 2018.

Há quatro anos, às vésperas do primeiro turno, Bolsonaro liderava em intenção de votos sobre Fernando Haddad também entre as mulheres, com vantagem de 30% a 21%, segundo o Datafolha.

E o presidente também é mais mal avaliado entre elas do que entre os homens. De acordo com a pesquisa da Quaest, 43% das mulheres acham o governo ruim ou péssimo - embora tenha sido de 48% na pesquisa anterior, de duas semanas antes. Entre os homens, essa cifra é 38%.

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