IPCA-15 cai 0,73% em agosto, maior deflação mensal em mais de 20 anos

Prévia da inflação do mês teve resultado negativo influenciado pela queda nos preços de combustíveis e energia

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Bloomberg Línea — Sob o efeito dos cortes de impostos e da redução de preços de combustíveis e energia elétrica, a prévia da inflação de agosto registrou queda acentuada, indicando um alívio nos preços para o consumidor brasileiro. De acordo com o IBGE, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15) teve retração de -0,73% em agosto, o maior recuo mensal desde o início da série histórica no ano 2000. É a primeira vez que o índice registra deflação mensal desde maio de 2020.

Com o resultado, o IPCA-15 acumulado em 12 meses caiu para 9,60% em agosto, ante 11,39% em julho. É o terceiro mês consecutivo de desaceleração, indicando que o pico da escalada de preços pode ter ficado para trás. Também é a primeira vez que o IPCA-15 em 12 meses fica abaixo de dois dígitos desde agosto de 2021, quando estava em 9,3%.

O resultado ficou acima da previsão de analistas do mercado financeiro, que estimavam um IPCA-15 de -0,82% no mês, de acordo com pesquisa da Bloomberg.

Segundo Daniel Karp, economista da Santander Brasil, esperava-se uma queda mais acentuada da energia elétrica o que fez com que os preços administrados tivessem um resultado acima do previso. Além disso, segundo ele, a maior parte das surpresas veio de itens com preços voláteis, como alimentos in natura (dentro do grupo de alimentação) e de perfumes (no segmento de bens industriais), o que fez o IPCA-15 de agosto ficar acima do consenso do mercado.

“Embora o IPCA-15 tenha surpreendido para cima, acreditamos que a leitura confirma nossa visão de que o pior da inflação já ficou para trás”, escreveu Karp em relatório a clientes. “As melhorias marginais se concentraram na inflação cheia (impulsionada pelas medidas de redução de impostos), mas também temos visto alguns pequenos alívios em medidas qualitativas, que começam a tornar as perspectivas para a inflação um pouco menos sombrias.”

O que caiu e o que subiu

A deflação foi influenciada principalmente pela queda da gasolina, que teve retração de -16,80% no mês, de acordo com o IBGE, que levou a uma forte queda do grupo de transportes (-5,24%). Além da gasolina, outros combustíveis também tiveram redução de preço, como etanol (-10,78%), GNV (-5,4%) e óleo diesel (-0,56%).

O alívio nos preços não foi sentido apenas nos combustíveis, mas também em outros itens como passagens aéreas (-12,22%), energia elétrica (-3,29%) e comunicação (-0,3%). A telefonia móvel teve queda de -1,04% e a fixa, de -2,29%. Essas categorias (energia elétrica e comunicação) também foram influenciadas pelo corte de impostos promovido pelo governo e reduções de tarifas de energia autorizadas pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica).

Por outro lado, o grupo de alimentação teve alta de preços (1,12%), puxando o índice geral para cima. O maior vilão desse grupo é o leite longa vida, que acumula alta de 79,79% em 2022, além de frutas (alta de 2,99% no mês), queijo (4,18%) e frango em pedaços (3,08%).

Outro grupo que registrou alta de preços foi o de saúde e cuidados pessoais (0,81% no mês), puxado pelo reajuste nos planos de saúde, que subiram 1,22% em agosto após a ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) autorizar um aumento no fim de maio.

Além de saúde, o grupo de educação também teve aumento de preços (0,61%), em razão dos reajustes nos custos de creches e escolas de ensino fundamental e instituições de ensino superior, segundo o IBGE.

Primeira deflação desde 2020

É a primeira vez que o Brasil registra deflação desde maio de 2020, no início da pandemia de covid-19, quando o comércio estava fechado e a maioria das pessoas permaneceu em casa, evitando consumir, o que fez os preços desabarem. Naquele mês, a redução foi de 0,59%.

A redução nos preços foi influenciada pelas medidas aprovadas no Congresso, com apoio do governo, para limitar em 17% a 18% a alíquota do ICMS sobre produtos e serviços essenciais, incluindo combustíveis, energia elétrica, transporte público e telecomunicações. Além disso, o governo zerou a alíquota de impostos federais (PIS/Cofins e Cide) sobre a gasolina até o fim do ano.

No último mês, a Petrobras também anunciou cortes nos preços da gasolina e do diesel, acompanhando a redução dos preços internacionais do petróleo que tiveram queda em relação aos meses anteriores.

Alívio pontual

Economistas do mercado financeiro acreditam que o alívio nos preços deve ser pontual, influenciado pela queda nos preços de combustíveis e energia, que foi muito concentrada em julho e agosto.

Alberto Ramos, diretor de pesquisas para a América Latina do banco Goldman Sachs, afirma que as pressões inflacionárias continuam a afetar segmentos importantes, especialmente os serviços e produtos não-comercializáveis. Ele ressalta também que as medidas de estímulo fiscal, adotadas pelo governo para incentivar o consumo e a economia, podem fazer com que os preços continuem pressionados nos próximos meses.

“Apesar do resultado negativo, o IPCA-15 de agosto não traz alívio à frente para a inflação dada a pressão inflacionária alta e disseminada entre os serviços e o resultado acima do esperado no grupo de preços determinados livremente”, escreveu Ramos em relatório enviado a clientes.

Um ponto que pode ajudar a controlar a inflação é o temor de uma desaceleração da economia mundial, o que tem ajudado a reduzir os preços de commodities em relação às cotações no primeiro semestre.

O economista David Beker, do Bank of America Merrill Lynch no Brasil, diz que espera uma desaceleração dos preços de alimentos e bebidas nos próximos meses, em razão da queda das commodities no último mês, bem como uma redução dos preços de serviços, à medida que o alívio em outros itens (como gasolina e energia elétrica) reduz o custo das empresas do setor.

“Nossas projeções preliminares de curto prazo para o IPCA são de -0,25% mês a mês em agosto e 0,30% mês a mês em setembro. Apesar dessa surpresa de alta, esperamos agora que os efeitos deflacionários em curso levem o IPCA para 6,5% no final do ano, de 7,2% anteriormente”, escreveu Beker em relatório a clientes.

Analistas, porém, apontam que, apesar do alívio, um risco continua a ser o desenrolar da guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que pode ter efeito sobre as cotações de energia no mercado internacional.

“As dúvidas permanecem acerca dos impactos altistas nos preços de combustíveis que o conflito entre Rússia e Ucrânia pode provocar, especialmente no início do inverno no Hemisfério Norte, e a interrupção do suprimento de gás russo para a União Europeia”, escreveram Juliana Ferreira e Rafael Costa, em relatório divulgado antes do resultado do IPCA-15.

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