Bloomberg Opinion — Os cientistas espaciais esperaram quase quatro décadas para enviar uma espaçonave financiada pelos contribuintes para a entrada na atmosfera de Vênus. Na semana passada, a Rocket Lab , empresa privada de lançamento de aeronaves, anunciou que a espera está chegando ao fim. Mas em vez de depender de uma agência espacial governamental para pagar pelo projeto, a Rocket Lab financiará a própria missão, a ser lançada em maio de 2023. Se bem-sucedida, será a primeira nave espacial privada a visitar outro planeta.
E não será a última. Graças ao surgimento de foguetes e satélites privados e de baixo custo, a ciência espacial está prestes a sofrer uma revolução muito bem-vinda. Os cientistas não precisarão mais depender apenas dos contribuintes e da generosidade do governo para explorar o sistema solar. Em vez disso, as instituições privadas e financiadores terão um papel cada vez mais crucial no financiamento da exploração e da ciência básica além da Terra, O conhecimento humano se expandirá como resultado desta mudança, e, em última instância, o mesmo acontecerá com os lucros.
Historicamente, a ciência era um esforço privado daqueles que tinham o tempo livre, o dinheiro e a motivação para fazê-lo. O trabalho pioneiro de Benjamin Franklin com eletricidade era um hobby, assim como as máquinas voadoras construídas na oficina de bicicletas dos irmãos Wright. Se um indivíduo precisasse de fundos, o apoio institucional de universidades, sociedades científicas e museus poderia ajudar – o Smithsonian financiou Robert Goddard quando ele ficou sem dinheiro por construir os primeiros foguetes movidos a líquido no início do século XX.
A Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria mudaram a equação para o financiamento. Para garantir que a inovação continuasse sendo um motor para a economia dos Estados Unidos, e por motivos de segurança nacional, o Congresso americano centralizou o financiamento científico em instituições como a National Science Foundation.
O financiamento e a pesquisa aeroespacial ficaram concentrados nos programas militares e civis, como a Nasa. Alguns desses programas, como as aterrissagens na lua, tinham uma aplicação óbvia (vencer os soviéticos). Mas outros programas de pesquisa se inclinavam mais à ciência pura. Por exemplo, em 14 de dezembro de 1962, a nave espacial Mariner 2 da Nasa realizou a primeira missão bem-sucedida em outro planeta quando voou por Vênus. Nos 50 anos seguintes, a Nasa e o Congresso americano financiaram dezenas de robôs exploradores, incluindo os voos experimentais pioneiros por cada planeta no sistema solar.
No entanto, mesmo com todo o mérito científico dessas missões, geralmente o tempo entre sua concepção e seu lançamento é de décadas. Em grande parte, o problema é o financiamento – apenas algumas missões são selecionadas entre dezenas que são propostas à Nasa.
Felizmente, a inovação está começando a tirar a exploração espacial das garras do governo. Nas últimas duas décadas, entidades privadas e públicas desenvolveram uma nova classe de satélites pequenos e econômicos, conhecidos como SmallSats e CubeSats. Essas espaçonaves miniaturizadas são construídas com dimensões padronizadas, algumas pequenas como um cubo mágico, e normalmente pesam apenas alguns quilos. Ao contrário dos satélites encomendados que dominaram a corrida espacial e podem custar centenas de milhões de dólares ou mais, os CubeSats normalmente utilizam componentes prontos e podem custar muito menos de US$ 1 milhão. Embora essas espaçonaves certamente não sejam tão capazes quanto seus equivalentes maiores e personalizados, o custo mais baixo significa que podem ser desenvolvidos e lançados mais rapidamente e com menos despesas.
Da mesma forma, empresas como a Rocket Lab e a SpaceX criaram um mercado privado de lançamento de foguetes que reduziu substancialmente o custo de chegar ao espaço. Por exemplo, o custo de lançar um quilo no ônibus espacial da Nasa aposentado em 2011 foi de aproximadamente US$ 30 mil. Hoje, um Falcon 9 da SpaceX pode lançar um quilo por cerca de US$1,5 mil. Enquanto isso, o número de foguetes lançados todos os anos dobrou na última década, oferecendo oportunidades para satélites menores que jamais entrariam em órbita há dez anos.
Essa queda nos custos inspirou os cientistas espaciais, agências espaciais e empreendedores a repensarem as possibilidades da ciência. Em junho, a Rocket Lab lançou o Capstone, um CubeSat da Nasa do tamanho de um forno de micro-ondas que está tomando uma rota espacial incomum para orbitar a lua (ele chegará em novembro). Toda a missão custou menos de US$ 30 milhões, um terço dos quais foi para o Rocket Lab para o lançamento e inserção orbital de sua espaçonave. Peter Beck, presidente e CEO da Rocket Lab, disse recentemente em conferência que vê o projeto como uma demonstração de que, por “dezenas de milhões de dólares” alguém pode “visitar um asteroide, a lua ou até outro planeta”.
Beck observa que essa possibilidade nunca ocorreu antes. Agora que é possível, empresas privadas, pessoas físicas e universidades podem contemplar a exploração do espaço sem pedir dinheiro ao governo. Beck, aliás, é um boom exemplo disso. Há muito, ele fala publicamente sobre seu fascínio por Vênus. Para matar sua curiosidade, a Rocket Lab está colaborando com uma equipe do Instituto de Tecnologia de Massachusetts em sua missão para Vênus. Como planejado, a missão será lançada na mesma plataforma de foguete responsável pelo Capstone e carregará uma pequena sonda com uma carga útil científica de aproximadamente um quilo. É um mecenato científico, e é apenas o começo.
O preço dos lançamentos ao espaço continuará em queda nos próximos anos, e os cientistas já estão pensando seriamente sobre como aproveitar a economia. Empresas privadas interessadas em comercializar seus foguetes ou explorar asteroides e planetas para possível mineração e extração de recursos no futuro podem se unir a eles em missões de baixo custo e alto risco. Fundações e universidades que financiam a ciência podem começar a imaginar subsídios que banquem a exploração do espaço. E indivíduos mais abastados com interesse em financiar algo mais exclusivo terão uma forma nova e prestigiosa de financiar a ciência.
É uma espécie de revolução científica, que expandirá não só o conhecimento humano, mas também a ambição humana.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Adam Minter é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre Ásia, tecnologia e meio ambiente. É autor de “Secondhand: Travels in the New Global Garage Sale”.
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