Bloomberg Opinion — O presidente indonésio Joko Widodo há muito vem colocando as preocupações domésticas à frente da diplomacia. Ele está prestes a sediar uma das reuniões geopolíticas mais significativas dos últimos anos. Na quinta-feira (18), ele disse à Bloomberg News que o presidente russo Vladimir Putin e o presidente chinês Xi Jinping planejam participar da cúpula do Grupo dos 20, o G20.
Para Jokowi, como é conhecido, será uma vitória – os dois líderes praticamente não viajaram desde o início de 2020, e reunir o presidente americano Joe Biden e os dois principais autocratas do mundo em Bali poderia ajudar a enfrentar as crises de segurança global, energia e clima.
Mas o trabalho árduo que antecede a cúpula de novembro está apenas começando.
A Indonésia, que receberá o G20 pela primeira vez, sem dúvida esperava melhorar seu status. Não foi bem assim que aconteceu.
A invasão da Ucrânia pela Rússia continua ameaçando a Europa e colocando em risco o fornecimento global de alimentos, e Moscou ainda está semeando a discórdia entre países emergentes. Também há as crescentes tensões entre os Estados Unidos e a China sobre Taiwan e muitos outros conflitos. O mundo está muito apreensivo.
Por enquanto, o plano global – e o da Indonésia – parece ser o de continuar as atividades e a cúpula do G20, que reúne 20 das maiores economias do mundo.
Isso é importante, considerando as diferenças entre a maioria dos governos ricos aliados que apoiam a Ucrânia e o Sul Global e as escassas oportunidades de envolvimento. Há certo simbolismo na reunião, e a Indonésia já contornou a controversa questão da presença de Putin ao convidar o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, que provavelmente comparecerá remotamente. Negociações bilaterais, como o potencial embate entre Xi e Biden, podem ser consequenciais.
Não importa o que aconteça, simplesmente “evitar o pior” é muito pouco.
Certamente não há nenhuma perspectiva real de que a guerra, a maior questão que ofusca a agenda global, seja resolvida em Bali, mesmo que muita coisa possa acontecer entre agora e novembro. É verdade que o G20 precisa passar por uma crise que ameaça dividir definitivamente seus membros entre aqueles alinhados com as sanções internacionais e os esforços para isolar a Rússia, e o resto. Mas as partes envolvidas podem fazer mais.
Começando pela Indonésia. O discurso de Jokowi nesta semana descreveu um país que atingiu “o auge da liderança global” que pode atuar como uma “ponte de paz” entre a Ucrânia e a Rússia. Ele deve seguir adiante com essas louváveis ambições diplomáticas e aproveitar muito mais os históricos laços políticos e militares com a Rússia e as conexões econômicas com a Ucrânia.
A viagem de Jokowi a Kiev e Moscou em meados de junho foi um passo importante – ele foi o primeiro líder asiático a visitar ambos desde o início do conflito –, mas será que ajudou?
A Indonésia é um importante importador de grãos e combustível. Putin, aparentemente, fez amplas promessas de garantias de segurança para o fornecimento de alimentos e fertilizantes. Por que, então, após a diplomacia de transporte em junho, Jacarta parece não ter desempenhado papel significativo na intermediação de um acordo de grãos para facilitar as exportações da Ucrânia?
Por sua vez, os EUA podem incentivar a Indonésia a agir de acordo com suas intenções e realmente manter a mediação. A Indonésia foi um dos países fundadores do Movimento dos Não Alinhados durante a Guerra Fria. Atualmente, essa posição deveria envolver advogar contra uma guerra que viola a política externa de Jacarta e apontar que Moscou fala em segurança alimentar, mas bombardeia silos de grãos. O país atacou o porto de Odessa um dia depois do acordo de grãos. Continuar a omissão é apoiar a narrativa do Kremlin.
Para ter credibilidade para fazer essas exigências, Washington deve desenvolver uma política muito mais proativa e holística em relação à Indonésia, ao Sudeste Asiático e ao mundo emergente em geral. Não basta dizer que as escolhas não serão ditadas – o que significa que os países não serão obrigados a escolher lados entre a China e os EUA. Uma visão alternativa e coerente é necessária – não apenas se opor a Pequim.
Por fim, há áreas nas quais todos os países do G20 podem e devem fazer progressos, incluindo o clima, que está na agenda global para novembro, quando a conferência das Nações Unidas se reunirá no Egito.
No ano passado, o G20 ficou aquém do esperado. A seca está prejudicando as indústrias e a agricultura pelo mundo, e o sistema global de energia está abalado. Falar de democracia é louvável, mas há poucas maneiras melhores de demonstrar o compromisso dos países ricos do que finalmente pagar para garantir que todos possam combater o aquecimento global e se adaptar a ele.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Clara Ferreira Marques é colunista da Bloomberg Opinion e membro do conselho editorial e cobre relações exteriores e clima. Trabalhou para a Reuters em Hong Kong, Singapura, Índia, Reino Unido, Itália e Rússia.
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