‘O teto é retrátil e não é dogma’, diz Guedes a uma plateia de investidores

Ministro diz que objetivo é não crescer o tamanho do governo e defende medidas como redução temporária de impostos

Paulo Guedes durante o evento Expert, ao lado de Rafael Furlanetti (à esq.), diretor institucional, Júlia Leite, analista de política, e Caio Megale, economista-chefe, os três da XP
03 de Agosto, 2022 | 08:46 PM

Bloomberg Línea — Não foi diante de empresários que clamam por redução de impostos ou mais investimentos; nem diante de sindicatos ou políticos do Centrão que defendem gastos voltados para a população de baixa renda às vésperas das eleições. O ministro da Economia, Paulo Guedes, disse nesta tarde de quarta-feira (3) que “o teto de gastos é retrátil” a uma plateia de investidores do mercado financeiro.

“O teto é para não deixar crescer o governo”, mas a âncora fiscal “não é um dogma”, disse o ministro em um dos paineis da tarde da Expert, o evento anual promovido pela XP Investimentos, realizado de forma presencial pela primeira vez depois de três anos por causa da pandemia.

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As declarações do ministro se deram para explicar as políticas adotadas pelo governo nos últimos meses e durante o combate à pandemia, quando houve expansão dos gastos públicos.

Segundo dados do Portal Siga Brasil, do Senado, o governo federal gastou R$ 411 bilhões em ações diretamente ligadas ao combate à pandemia em 2020. Em seu discurso, Guedes citou o auxílio emergencial, que pagou R$ 600 por cinco meses a mais de 60 milhões de famílias durante os meses da pandemia. Em 2020, ele custou R$ 213 bilhões, segundo o Senado. O auxílio emergencial proposto pelo governo era de R$ 200. Foi aumentado para R$ 600 por iniciativa da oposição no Congresso.

“O programa está dentro de todos os cânones da responsabilidade fiscal. ‘Vocês violaram o teto?’ [nos perguntam] Sim. O teto é para não deixar crescer o governo, porque somos liberais, queremos reduzir o governo. Mas não está fazendo crescer o governo, e, mais do que isso, está dentro das receitas extraordinárias não orçadas”, disse Guedes. “Vamos pegar a parte dos dividendos [das estatais] e vamos transferir para os mais pobres. O superávit do governo será mantido.”

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Agora, não é um dogma. Não vamos morrer por um princípio de austeridade. Vamos respeitar o princípio, por um momento”, disse.

De acordo com relatório da Instituição Fiscal Independente (IFI), do Senado, as principais mudanças no teto de gastos foram as emendas constitucionais 113 e 114. A primeira passou a usar o IPCA acumulado em 12 meses até dezembro, em vez de julho, para calcular a expansão do teto do ano seguinte. A segunda incluiu o pagamento de precatórios no teto.

Isso, segundo a IFI, abriu um “espaço fiscal” de R$ 113 bilhões, que “foi preenchido com mais despesas, a exemplo do Auxílio Brasil e das emendas de relator-geral, e deixou pouca margem para novas ampliações”.

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Só a emenda do “estado de emergência”, que aumentou ao auxílio de R$ 400 para R$ 600, acarretará um impacto fiscal de R$ 41 bilhões até o fim deste ano. A redução dos tributos Cide, PIS e Cofins sobre a gasolina e o diesel causará impacto de R$ 15,4 bilhões, segundo a IFI.

Guedes disse, no entanto, que o que o governo estava fazendo era “aproveitar” o “excesso de arrecadação” - que excedeu as expectativas para julho em 9%, segundo ele - para tocar as “reformas invisíveis”, como a redução do IPI e as reduções do ICMS aprovadas pelo Congresso Nacional. “Somos um governo liberal democrata: quando aumenta a arrecadação, reduzimos as alíquotas”, declarou.

Alguns economistas e especialistas em contas públicas criticam a redução de impostos justamente pelo seu caráter temporário às vésperas das eleições, o que afeta a gestão das finanças públicas e o combate do Banco Central à inflação de forma consistente.

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Sobre os precatórios, disse que “não é calote”: “pela primeira vez, estamos dando previsibilidade ao gasto administrativo”. Segundo ele, os precatórios foram um “capeta que pulou na frente de todo mundo”, que era, em 2021, de R$ 90 bilhões. “O que fizemos? Bota dentro do teto”, continuou o ministro.

A inclusão dos precatórios no teto significou que apenas uma parte do valor devido seria pago no exercício fiscal seguinte, como mandava a Constituição antes da emenda. O resto vai sendo adiado para os exercícios seguinte, até 2026. Se a regra for mantida até lá, o governo que assumir em 2027 vai ter de arcar com uma dívida de R$ 262 bilhões, ainda segundo a IFI.

Guedes fez ainda menção ao “Orçamento de Guerra”, emenda à Constituição Federal aprovada em 2021 para permitir ao governo fazer gastos fora do teto em medidas de combate à pandemia.

Segundo o ministro, foi “um legado” deixado por sua equipe para os próximos governos. “Toda vez que tiver uma guerra, uma pandemia, o teto é retrátil”, disse. “Se tiver outra guerra, outra pandemia, outra desculpa, bom, está na Constituição brasileira o protocolo de guerra. Se tiver guerra, você aperta o botão.”

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Pedro Canário

Repórter de Política da Bloomberg Línea no Brasil. Jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero em 2009, tem ampla experiência com temas ligados a Direito e Justiça. Foi repórter, editor, correspondente em Brasília e chefe de redação do site Consultor Jurídico (ConJur) e repórter de Supremo Tribunal Federal do site O Antagonista.