Bloomberg Opinion — Depois que controlarmos a inflação, o que vem pela frente?
Ouvimos essa pergunta inúmeras vezes ao longo do último ano enquanto entrávamos em um vórtex de aumento de preços sem precedentes. Contudo, seja com uma recessão ou um “soft landing”, provavelmente sairemos desta fase e entraremos em um cenário econômico difícil com problemas sem soluções simples.
Mas pelo menos parece que estamos domando a inflação. Os investidores nos mercados de títulos esperam que a inflação fique moderada em alguns anos. Apesar dos percalços na China, as cadeias de abastecimento globais parecem estar se recuperando do choque da pandemia. O Fed está aumentando as taxas agressivamente, e os últimos vestígios do estimulo fiscal para a demanda estão diminuindo, reduzindo as economias pessoais. O crescimento do emprego está desacelerando.
O problema é que o novo normal nos levará a um outro cenário: redução da força de trabalho e baixo investimento, salários estagnados e desigualdade desenfreada que inibem a prosperidade.
A questão econômica crítica – de onde vem o crescimento? – ficará ainda mais complicada se a energia continuar cara e a China parar de crescer como mercado emergente e começar a desacelerar como mercado desenvolvido.
Ao contrário das crises de inflação – problema que o Federal Reserve e outros bancos centrais aprenderam a conter ao elevar as taxas de juros – é difícil identificar (e resolver) o cenário pós-inflação.
O envelhecimento da população está diminuindo o tamanho da força de trabalho, elevando as taxas de dependência não só em países ricos, mas também na China.
Essa dinâmica é o núcleo de muitos problemas, o que enfraquece o crescimento econômico. É também um motor central da chamada “estagnação secular”, que antes da covid-19 era considerada o principal desafio econômico do período: uma combinação de muita poupança e investimentos inexpressivos que manteve o crescimento e as taxas de juros reais baixos.
A estagnação provavelmente vai continuar. Olivier Blanchard, ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional, pontua como os trabalhadores que esperam passar mais tempo de suas longas vidas na aposentadoria gastarão menos e pouparão mais. Taxas mais baixas de fertilidade reduzirão a força de trabalho futura em relação ao conjunto de aposentados.
Seria complicado resolver esse problema mesmo se todos concordassem com suas características. Por mais que tenha tentado estimular a economia ao adquirir dívidas de longo prazo, o Fed ficou aquém de suas metas de inflação durante anos. O crescimento decepcionou por mais de uma década após a crise financeira e as taxas de juros ficaram em patamares mínimos.
Alguns economistas sugeriram que o aumento de gastos do governo poderia ajudar a aumentar a demanda. Mas esse argumento provavelmente cairá por terra, já que os grandes pacotes de estímulo de 2020 e 2021 contribuíram para um salto na inflação para níveis máximos.
Além disso, não há consenso quanto ao diagnóstico. Outros fatores relacionados também estão em jogo: a desigualdade de renda provavelmente gerou queda nos gastos e aumento na poupança; o mesmo ocorreu com a concentração empresarial. Uma percepção de risco aumentada – devido a pandemias, revoltas geopolíticas e alongamento das cadeias de abastecimento e até incerteza regulatória – também pesou sobre os investimentos. E a desglobalização, se ela de fato persistir, provavelmente empurrará aumentará mais os preços e diminuirá o crescimento econômico.
Não há consenso sobre a forma como o envelhecimento vai afetar o futuro. Alguns economistas do FMI argumentam que, assim como a bolha demográfica produzida pela geração baby boomer manteve a inflação relativamente baixa por 40 anos enquanto seus membros trabalhavam e economizavam para a aposentadoria, ela aumentará a inflação conforme eles deixem a força de trabalho e gastem suas economias.
Charles Goodhart, da London School of Economics, faz uma observação nesse sentido. Segundo ele, o período de baixa inflação desde 1980 foi uma exceção produzida pelo aumento da força de trabalho, principalmente devido à incorporação da vasta força de trabalho da China nos mercados mundiais. Essa dinâmica demográfica está agora sendo revertida – trazendo baixo crescimento e preços mais altos.
O que as autoridades podem fazer? Algo que poderia aliviar o problema seria aumentar a idade para aposentadoria. Mas a política desse processo é complicada. Um aumento mais rápido na produtividade poderia ajudar. Daron Acemoglu e Pascual Restrepo, do MIT, descobriram que sociedades que estavam envelhecendo mais rapidamente tiveram um crescimento maior, talvez devido a mais investimentos em automação.
No entanto, o aumento aferido na produtividade não tem sido nada bom. O crescimento vivenciado durante a pandemia provavelmente não vai continuar, segundo John Fernald do Federal Reserve de São Francisco. Por mais emocionantes que sejam as inovações, o progresso tecnológico parece um pouco estagnado quando comparado com um passado mais distante.
Raghuram Rajan, da Universidade de Chicago, ex-chefe do Reserve Bank da Índia, sugere uma mudança de perspectiva. Se a política monetária falhou em revigorar o crescimento e se o estímulo fiscal trouxe o aumento da inflação, talvez a solução seja reformular os planos: gastos governamentais não para aumentar a demanda, mas para construir a infraestrutura física e social que pode tirar os Estados Unidos do marasmo e colocá-lo mais perto da fronteira da produtividade. Talvez esse momento não esteja tão longe.
Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e de seus proprietários.
Eduardo Porter é colunista da Bloomberg Opinion e escreve sobre a América Latina, a política econômica dos EUA e imigração. É autor de “American Poison: How Racial Hostility Destroyed Our Promise” e “The Price of Everything: Finding Method in the Madness of What Things Cost”.
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